Dinheiros públicos para tapar buracão no BES

Claro que há riscos – e muitos!

Uma es­pessa névoa con­tinua a en­volver o pro­cesso de im­plosão do BES, avo­lu­mando-se, so­bre­tudo face à so­lução en­con­trada pelo Go­verno, as dú­vidas quanto à fac­tura re­ser­vada ao erário pú­blico. Em carne viva está ainda o caso BPN.

Os que di­ziam que es­tava tudo bem são os mesmos que dizem agora que «não há riscos»

Ou­vida na As­sem­bleia da Re­pú­blica faz hoje uma se­mana, dia 7, onde foi cha­mada para ex­plicar a so­lução adop­tada para o banco, a mi­nistra das Fi­nanças con­firmou ter sido aceite pelo Go­verno a pro­posta da Banca de fi­nan­ciar o Fundo de Re­so­lução ban­cário com 635 mi­lhões de euros (a somar aos 367 mi­lhões que o Fundo já dispõe, o que perfaz 1000 mi­lhões de euros), o que sig­ni­fica que o di­nheiro ne­ces­sário da troika (logo do erário pú­blico) para en­trar na­quele Fundo para ca­pi­ta­lizar o Novo Banco será não os 4,9 mil mi­lhões de euros ini­ci­al­mente pre­vistos mas «apenas» - a ex­pressão é da ti­tular das Fi­nanças – de 3,9 mil mi­lhões de euros.

Fac­tura pe­sada

Qual exac­ta­mente o risco para o Es­tado foi o que qui­seram saber os de­pu­tados das opo­si­ções, no­me­a­da­mente do PCP. A mi­nistra e o go­ver­nador do Banco de Por­tugal, que também nesse dia foi ou­vido em co­missão par­la­mentar, in­sis­tiram em que «não há risco», pela razão de que «quem paga são os bancos».

«E se os bancos não pa­garem?», foi a per­gunta que deixou ex­pressa ao Avante! o de­pu­tado co­mu­nista Mi­guel Tiago, de­pois de a ter feito na au­dição a Carlos Costa, sem obter res­posta.

A ver­dade é que «há risco», afirma o de­pu­tado co­mu­nista, re­al­çando que mesmo ad­mi­tindo que os bancos ga­rantam esse pa­ga­mento, im­porta não es­quecer que um deles é a Caixa Geral de De­pó­sito, que tem 30% da quota de mer­cado (o pa­ga­mento para o Fundo de Re­so­lução é pro­por­ci­onal à di­mensão do banco). Pelo que, in­di­rec­ta­mente, lá irá a fac­tura de mais uma rui­nosa ope­ração parar às mãos dos con­tri­buintes.

Ou­tros ce­ná­rios são pos­sí­veis, como seja o de al­guns bancos fa­lharem o pa­ga­mento, sendo que neste caso lá es­tará o Es­tado para as­sumir o pre­juízo.

A con­clusão, pois, só pode ser uma: «há mesmo risco».

Mi­guel Tiago, ao nosso jornal, ainda sobre esta questão, lem­brou, aliás, que não pode deixar de ser tido em conta o facto de a ge­ne­ra­li­dade dos bancos ter re­cor­rido nos úl­timos anos a di­nheiros pú­blicos para a sua re­ca­pi­ta­li­zação.

Foi o pró­prio Go­ver­nador do Banco de Por­tugal a ad­mitir, pe­rante os de­pu­tados, que o sis­tema ban­cário no início do mês «es­teve no fio da na­valha», na «imi­nência de uma crise sis­té­mica que afec­taria todos os bancos do sis­tema».

Des­cré­dito

É neste con­texto, pois, que se exi­giria ter ha­vido es­tudos de ava­li­ação de risco e não meros «pal­pites», diz-nos o de­pu­tado do PCP, que se in­ter­roga quanto à cre­di­bi­li­dade e à ga­rantia que pode dar quem ainda há pouco tempo dizia que es­tava tudo bem.

«As mesmas pes­soas que há 15 dias di­ziam que “nada in­dica que o Es­tado tenha de vir a in­tervir no BES”, ou que di­ziam que o “BES tem uma al­mo­fada fi­nan­ceira su­fi­ci­ente para aco­modar perdas”são as mesmas que agora vêm dizer que “não há risco”», ob­servou Mi­guel Tiago, alu­dindo a de­cla­ra­ções muito re­centes tanto da mi­nistra das Fi­nanças como do res­pon­sável pela re­gu­lação.

En­tre­tanto, é o que se vê: o Es­tado, desde já, a abrir os cor­dões; quanto à «al­mo­fada fi­nan­ceira», essa, sumiu-se em trans­fe­rên­cias obs­curas como as que fi­zeram eva­porar do BES 1500 mi­lhões de euros em apenas 15 dias.

E a questão que se co­loca, a este pro­pó­sito – esse é aliás outro dos mis­té­rios por des­lindar–, é a de saber como foi pos­sível que o Banco de Por­tugal tenha proi­bido ope­ra­ções de trans­fe­rência do BES para em­presas do Grupo Es­pí­rito Santo e não tenha, em si­mul­tâneo, acom­pa­nhado essa de­cisão pela ime­diata sus­pensão da res­pec­tiva ad­mi­nis­tração, com Ri­cardo Sal­gado à ca­beça. Como tem sido dito, foi o mesmo que manter a ra­posa dentro do ga­li­nheiro.

 



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