Bienal de Artes Plásticas

Outro modo de ver a arte

Manuel Augusto Araújo

A grande di­fe­rença entre a Bi­enal da Festa do Avante! e as bi­e­nais de artes que se re­a­lizam por todo o mundo é a da Festa do Avante! se ex­cluir da ór­bita do ca­pi­ta­lismo cul­tural, em que as bi­e­nais, feiras de arte e va­ri­antes se ins­crevem, que é do­mi­nado pelos mu­seus, ga­le­rias, onde as co­ta­ções das obras de arte e dos ar­tistas são de­ter­mi­nadas, pos­te­ri­or­mente afi­nadas nos lei­lões. Re­vistas de arte de re­fe­rência, a maior parte pro­pri­e­dade desses agentes do mer­cado, fazem anu­al­mente listas dos qui­nhentos ar­tistas mais co­tados e das cem pes­soas mais in­flu­entes no mundo das artes. Re­fira-se que nos úl­timos anos al­guns por­tu­gueses têm fi­gu­rado nessas listas. Na pri­meira lá se en­contra Joana Vas­con­celos, na se­gunda já lá es­teve o co­men­dador Be­rardo, o que diz muito e quase dis­pensa co­men­tá­rios. Esse sis­tema, em tudo se­me­lhante ao sis­tema ban­cário, co­locou o mer­cado das artes num nicho do mer­cado de ar­tigos de luxo. Os es­paços dos mu­seus e ga­le­rias são es­paços com uma aura de sa­cra­li­dade onde as obras se tornam in­tem­po­rais. Uma aura que O’­Doherthy, ar­tista e teó­rico, com­parou ao das igrejas me­di­e­vais e que vale di­nheiro. A Bi­enal da Festa do Avante! tem tudo o que as ou­tras bi­e­nais têm, menos o ser um es­paço com essas ca­rac­te­rís­ticas. Vai ao en­contro das pes­soas, muitas delas, pro­va­vel­mente a mai­oria, não são ou não eram fre­quen­ta­doras ha­bi­tuais de ga­le­rias. Isso al­tera não as obras de arte, mas a visão das obras de arte. A mesma obra de arte que já es­teve ex­posta numa ga­leria é outra obra de arte quando é ex­posta na Bi­enal da Festa do Avante!

A sur­presa que cons­ti­tuiu a re­a­li­zação da I Bi­enal di­luiu-se com o tempo. Nos dias de hoje os vi­si­tantes da Festa do Avante! sen­ti­riam a sua au­sência. Numa Festa que todos os anos não é sempre a mesma, que se re­nova e re­ju­ve­nesce sem fa­diga, a Bi­enal deve cor­res­ponder a essa le­gí­tima ex­pec­ta­tiva, o que tem pro­cu­rado fazer nas suas su­ces­sivas edi­ções. A pró­xima, a vi­gé­sima, tem a obri­gação de ser um salto qua­li­ta­tivo, como é usual nos nú­meros re­dondos dos ca­len­dá­rios.

Este ano a Bi­enal aco­lheu o que se de­signa uni­ver­sal­mente por Arte Ur­bana. Apa­ren­te­mente uma con­tra­dição porque a Festa do Avante! sempre foi uma grande e va­riada mostra de arte ur­bana na mul­ti­pli­ci­dade dos seus es­paços, em que a ima­gi­nação se solta para os animar vi­su­al­mente. Devem ser lem­brados os grandes pai­néis, re­a­li­zados por ar­tistas, dos mais des­ta­cados no nosso pa­no­rama ar­tís­tico, que ilu­mi­naram a Festa na Ajuda. Anos atrás, na Ata­laia, quando se ho­me­na­geou Ma­lan­ga­tana, foi ex­posto um grande painel por ele pin­tado ex­pres­sa­mente para a Festa do Avante! São ainda de re­cordar os pai­néis pin­tados por Ro­gério Ri­beiro que, além de du­rante muitos anos deixar o seu risco sempre ino­vador em todo o re­cinto da Festa, os pintou com a ge­ni­a­li­dade que trans­pa­rece em toda a sua obra.

De­pois de muitos anos em que os gra­fitis, os pre­cur­sores da Arte Ur­bana, serem con­si­de­rados trans­gres­sores e per­se­guidos, os po­deres ins­ti­tuídos per­ce­beram que a Arte Ur­bana en­ri­quecia cul­tural e ar­tis­ti­ca­mente os seus es­paços, as pa­redes de­gra­dadas das suas ci­dades. Co­me­çaram a usá-los para os or­na­men­tarem e ta­parem fe­ridas. Os ar­tistas que pra­ticam Arte Ur­bana ul­tra­pas­saram essa função or­na­mental, cri­ando ver­da­deiras obras de arte.

Por­tugal sempre foi um es­paço par­ti­cular na ocu­pação das pa­redes de­gra­dadas. Há que lem­brar os mu­rais que in­va­diram o País no pós 25 de Abril em que, por vias muito di­fe­rentes, se dis­tin­guiram os mu­rais do PCP pela con­vo­cação de ar­tistas seus mi­li­tantes ou ide­o­lo­gi­ca­mente pró­ximos que pin­tavam co­lec­ti­va­mente os mu­rais. Na al­tura, essa ac­ti­vi­dade causou es­cân­dalo na Eu­ropa re­ac­ci­o­nária que via nos mu­rais um sinal da «anar­quia» pro­vo­cada pela Re­vo­lução de Abril. Ou­tros tempos. Como ou­tros tempos são os de hoje em que na mesma ci­dade, Lisboa, que se or­gulha e exibe pelo mundo a sua ga­leria de Arte Ur­bana, se in­cen­tiva essa ac­ti­vi­dade e se prendem, iden­ti­ficam e hu­mi­lham jo­vens da JCP que pintam mu­rais com men­sa­gens po­lí­ticas. A Arte Ur­bana também é usada para do­mes­ticar as pa­redes.




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