Mantém-se a luta contra privatização dos transportes

É «doação» da CP Carga

As co­mis­sões de tra­ba­lha­dores da CP e da CP Carga vol­taram a es­crever ao Tri­bunal de Contas, re­al­çando nú­meros que o Go­verno es­conde mas que estão nas contas das em­presas e que jus­ti­ficam tratar a «venda» como «do­ação».

As en­ti­dades pú­blicas e re­gu­la­doras estão re­féns do poder eco­nó­mico

LUSA

Image 19091


Na se­gunda-feira, dia 21, a Fe­de­ração dos Sin­di­catos de Trans­portes e Co­mu­ni­ca­ções, em con­junto com ou­tras es­tru­turas de tra­ba­lha­dores de em­presas pú­blicas que na­quele sector estão en­vol­vidas em pro­cessos de pri­va­ti­zação e sub­con­cessão, re­a­lizou na Praça Luís de Ca­mões, em Lisboa, uma acção de pro­testo a coin­cidir com a as­si­na­tura do con­trato-pro­messa para en­trega da CP Carga à mul­ti­na­ci­onal MSC Rail.
Ou­tras ini­ci­a­tivas foram anun­ci­adas pela Fec­trans/​CGTP-IN, em termos se­me­lhantes, para os dias se­guintes:

ontem, em Lisboa, um des­file de ac­ti­vistas desde a baixa até junto do Mi­nis­tério da Eco­nomia, para con­testar a as­si­na­tura do con­trato de con­cessão do Me­tro­po­li­tano de Lisboa e da Carris à es­pa­nhola Avanza;
an­te­ontem, no Porto, uma tri­buna pú­blica no largo da es­tação da Trin­dade, em de­fesa do trans­porte pú­blico e contra a pri­va­ti­zação, por sub­con­cessão, da STCP e da Metro do Porto.

«Mesmo com a as­si­na­tura dos con­tratos, nada está ter­mi­nado, con­ti­nu­ando ao al­cance dos tra­ba­lha­dores a pos­si­bi­li­dade de travar esta ofen­siva do Go­verno e de­fender os in­te­resses do País, dos utentes e dos tra­ba­lha­dores», sa­li­entou a fe­de­ração.
As co­mis­sões de tra­ba­lha­dores da CP (em­presa for­mal­mente ven­de­dora) e da CP Carga (em­presa for­mal­mente ven­dida) não com­pa­re­ceram na ce­ri­mónia de se­gunda-feira, no Mi­nis­tério da Rua da Horta Seca. Além de se fa­zerem re­pre­sentar no pro­testo no Ca­mões, di­ri­giram-se nesse dia à Pro­cu­ra­doria-Geral da Re­pú­blica, à Au­to­ri­dade para as Con­di­ções do Tra­balho e, mais uma vez, ao Tri­bunal de Contas, «para apre­sen­tarem ou re­for­çarem as suas queixas contra esta ne­go­ciata»: «sus­peitas de prá­ticas de cor­rupção», porque «algo há-de ga­nhar quem assim des­ba­rata o erário pú­blico»; «vi­o­lação da lei no que res­peita aos di­reitos das CT»; e «gestão da­nosa dos in­te­resses pú­blicos» – como a CT da CP Carga ex­plicou.
Num co­mu­ni­cado de dia 18, esta es­tru­tura re­pre­sen­ta­tiva su­bli­nhou que «ainda é pos­sível travar esta pri­va­ti­zação e todas as bru­tais con­sequên­cias que se lhe se­guirão (para os fer­ro­viá­rios e para o País)». Deve ainda pro­nun­ciar-se sobre este ne­gócio a Au­to­ri­dade da Con­cor­rência. Mas a CT da CP Carga de­fende que, «com as en­ti­dades pú­blicas e re­gu­la­doras re­féns do poder eco­nó­mico, cabe aos tra­ba­lha­dores as­su­mirem as suas res­pon­sa­bi­li­dades». Como? «Desde logo, no dia 4 de Ou­tubro, indo votar contra esta po­lí­tica e os vá­rios par­tidos que a têm exe­cu­tado, e indo votar para dar força a quem de­fende um sector fer­ro­viário na­ci­onal uno e pú­blico, ao ser­viço do povo e do País». Mas igual­mente «re­for­çando a uni­dade e a mo­bi­li­zação, para as lutas que será ne­ces­sário er­guer ime­di­a­ta­mente de­pois das elei­ções, se o novo Go­verno tentar pros­se­guir, ao ar­repio da von­tade po­pular, o mesmo ca­minho de de­sastre na­ci­onal que agora tri­lhamos».

O TdC per­ce­berá?

«Com estes nú­meros, que o Go­verno sempre es­conde da opi­nião pú­blica, mas estão nos Re­la­tó­rios e Contas das em­presas, per­ce­berá o Tri­bunal de Contas por que fa­lamos de do­ação e não de venda da CP Carga?» – a in­ter­ro­gação surge su­bli­nhada na carta de dia 21 ao pre­si­dente do TdC, logo de­pois de as duas CT apon­tarem al­guns factos re­la­tivos ao «preço de venda», no­me­a­da­mente:
o Go­verno fala em 53 mi­lhões de euros, mas 51 destes mi­lhões são para a MSC ca­pi­ta­lizar a sua em­presa, de­pois de a com­prar, pelo que o preço é efec­ti­va­mente de dois mi­lhões;
no fim de 2014, a CP Carga tinha 5,8 mi­lhões de euros à ordem, pos­suía edi­fí­cios, va­gões e ou­tros ac­tivos fixos no valor bruto de 88 mi­lhões de euros (60,9 mi­lhões de­pois de apli­cadas as de­pre­ci­a­ções), con­tava com 11,1 mi­lhões de euros de dí­vida de cli­entes para re­ceber a 90 dias;
na ope­ração de «venda» à MSC, a CP trans­fere para a CP Carga lo­co­mo­tivas, com um valor bruto de 110 mi­lhões (re­a­va­li­adas em 88 mi­lhões);
a CP Carga re­cebeu da Refer 28 mi­lhões de euros, no final de 2014, a pro­pó­sito da de­cisão do Go­verno de trans­ferir para esta os ter­mi­nais fer­ro­viá­rios de mer­ca­do­rias.

A dí­vida da CP Carga «foi sempre em­po­lada pelos su­ces­sivos go­vernos, quando tra­tavam de jus­ti­ficar» a pri­va­ti­zação. As CT vão mais fundo e lem­bram que, da dí­vida de 120 mi­lhões de euros (a 31 de De­zembro de 2014), 31 mi­lhões res­pei­tavam a ope­ra­ções de le­a­sing de ma­te­rial cir­cu­lante da CP Carga e 71 mi­lhões eram dí­vidas à CP.
Esta dí­vida à em­presa-mãe de­corre «da opção, to­mada em 2009, de manter na CP as lo­co­mo­tivas uti­li­zadas pela CP Carga, em vez de as co­locar como ca­pital da CP Carga». Isto «impôs um pa­ga­mento anual de 18 mi­lhões de euros (va­lores de 2014) da CP Carga à CP», mais juros. «Ou seja, o Es­tado, en­quanto a CP Carga foi uma em­presa pú­blica “des­ti­nada” à pri­va­ti­zação, impôs uma po­lí­tica de des­ca­pi­ta­li­zação», mas «com a sua “venda”, é o pró­prio Es­tado que des­man­tela o me­ca­nismo de des­ca­pi­ta­li­zação da CP Carga à custa da des­ca­pi­ta­li­zação da CP (que passa à ca­te­goria de em­presa pú­blica a pri­va­tizar)», acusam as CT.

Por outro lado, o Tri­bunal de Contas é ins­tado a «ana­lisar com par­ti­cular atenção» se a es­tru­tura da dí­vida da CP Carga (da qual a CP era ava­lista e prin­cipal credor) «foi ela pró­pria re­de­se­nhada, em pre­juízo da CP e em be­ne­fício da mul­ti­na­ci­onal». É o que de­corre de in­for­mação que as CT pos­suem mas que não pu­deram ve­ri­ficar, uma vez que as em­presas e o Go­verno negam sis­te­má­tica e ile­gal­mente o acesso às contas e re­cu­saram-se a es­cla­recer as ques­tões co­lo­cadas.
Con­tudo, «não se trata apenas de um pro­cesso de oferta da CP Carga que ro­tu­lamos de cri­mi­noso e le­sivo do in­te­resse pú­blico». As CT alertam: «Trata-se pa­ra­le­la­mente de um pro­cesso de des­ca­pi­ta­li­zação da CP, in­se­rido numa ofen­siva mais vasta que visa li­quidar o sector fer­ro­viário na­ci­onal e co­locá-lo como apên­dice das mul­ti­na­ci­o­nais e dos grandes grupos eco­nó­micos “na­ci­o­nais”».

 



Mais artigos de: Trabalhadores

A luta não fica à espera

Ac­tu­a­li­zação de sa­lá­rios, res­peito de di­reitos e de­fesa de ser­viços pú­blicos jun­taram ope­rá­rios da BA Vidro, pes­soal da So­flusa e do INEM e en­fer­meiros do Minho na de­cisão comum de re­correr à greve, a poucos dias das elei­ções le­gis­la­tivas.

Cláusula 74 sem cortes

A cláusula 74.ª do contrato colectivo de trabalho aplicável aos trabalhadores dos transportes TIR prevê o pagamento de uma compensação cujo valor não pode ser reduzido, determinou o Tribunal da Relação de Lisboa. Num acórdão de dia 9, divulgado...

Encontro da CIL apela ao voto

No dia 4 de Outubro «os trabalhadores não podem ficar em casa», devem «ir votar com memória», tanto dos PEC e do memorando da troika, como «de quem os assinou e de quem os aplicou», mas igualmente com «memória do muito que o povo pode, quando percebe a...

Fenprof espera alteração profunda

Das eleições legislativas, a Federação Nacional dos Professores espera «que resultem condições para uma alteração profunda nas políticas para a Educação e o País». Em conferência de imprensa, no Porto, no dia 21,...