Estado perde milhões no negócio da CP Carga

O crime das locomotivas

As co­mis­sões de tra­ba­lha­dores da CP e da CP Carga, num co­mu­ni­cado con­junto, vi­eram chamar a atenção para as in­for­ma­ções mais re­centes sobre o «si­nistro ne­gócio» da pri­va­ti­zação da trans­por­ta­dora fer­ro­viária de mer­ca­do­rias.

Esta ca­pi­ta­li­zação vale 60 vezes os dois mi­lhões de euros exi­gidos à MSC

Na pri­va­ti­zação da CP Carga por venda di­recta, ainda não con­su­mada, à MSC Rail, os con­tornos têm sido es­con­didos dos tra­ba­lha­dores e do Par­la­mento. Com base nos de­ta­lhes de que foram to­mando co­nhe­ci­mento, as CT da CP Carga e da CP (a em­presa pú­blica que detém a to­ta­li­dade do ca­pital da­quela) to­maram po­si­ções pú­blicas e aler­taram o Tri­bunal de Contas e a Au­to­ri­dade da Con­cor­rência. Na se­mana pas­sada, emi­tiram um co­mu­ni­cado con­junto a de­nun­ciar a «par­ti­cular gra­vi­dade» dos «úl­timos dados dis­po­ní­veis sobre este si­nistro ne­gócio», que se prendem com a «ca­pi­ta­li­zação em es­pécie» da CP Carga, ou seja, a trans­fe­rência para a posse desta das 59 lo­co­mo­tivas que per­tencem à CP e que, desde a cri­ação da CP Carga, são usadas em re­gime de alu­guer.
A ope­ração apa­ren­te­mente con­ta­bi­lís­tica sig­ni­fica, afinal, que «o erário pú­blico tudo perde e a mul­ti­na­ci­onal MSC tudo ganha». «Um crime», dizem as es­tru­turas re­pre­sen­ta­tivas dos tra­ba­lha­dores.

A dí­vida
e o bónus

A dí­vida da CP Carga tem ser­vido para jus­ti­ficar a in­tenção de pri­va­ti­zação, re­corda-se no co­mu­ni­cado, res­sal­vando que o re­sul­tado da ope­ração «crescia de ano para ano» e 2014 foi o me­lhor de sempre.
A dí­vida cres­cente tem origem numa de­cisão to­mada na al­tura em que a CP Carga foi au­to­no­mi­zada da em­presa-mãe: as lo­co­mo­tivas com que a CP Carga fun­ci­o­nava con­ti­nu­aram a ser pro­pri­e­dade da CP, que re­ce­beria uma renda pelo seu fun­ci­o­na­mento e ma­nu­tenção; os va­gões pas­saram para a CP Carga, com as obri­ga­ções do res­pec­tivo le­a­sing. Para fazer face a estes en­cargos, a CP Carga en­di­vidou-se e teve também que pagar juros à banca.
As CT apre­sentam nú­meros que mos­tram como se chegou à dí­vida de 120 mi­lhões de euros. Para o le­a­sing re­ma­nes­cente dos va­gões foram 30 mi­lhões. As rendas das lo­co­mo­tivas pagas desde 2009 podem ser es­ti­madas a partir dos 18,8 mi­lhões de euros re­fe­rentes a 2014. Neste mesmo ano, os juros da dí­vida foram de sete mi­lhões de euros.
Em 2015, o Go­verno veio de­fender como bom ne­gócio a venda da CP Carga por dois mi­lhões de euros, «pas­sando por cima do facto de ter ac­tivos su­pe­ri­ores a 60 mi­lhões».
Acresce a in­tenção do Go­verno PSD/​CDS de re­a­lizar um au­mento de ca­pital so­cial em es­pécie, trans­fe­rindo as lo­co­mo­tivas para a posse da CP Carga. Para este efeito, re­ferem as co­mis­sões de tra­ba­lha­dores, o parque das 59 lo­co­mo­tivas foi ava­liado em 116 mi­lhões de euros.
Logo numa pri­meira con­clusão, esta ope­ração limpa a dí­vida da CP Carga pri­va­ti­zada, à custa de uma des­ca­pi­ta­li­zação de igual mon­tante da CP pú­blica, en­quanto a com­pra­dora MSC apenas paga dois mi­lhões.
O pre­juízo pú­blico surge subs­tan­ci­al­mente agra­vado, de­pois de se ob­servar a ava­li­ação das lo­co­mo­tivas. As CT não ques­ti­onam o valor atri­buído a 29 lo­co­mo­tivas eléc­tricas, mais re­centes. Mas não com­pre­endem as grandes di­fe­renças entre os va­lores das 30 lo­co­mo­tivas a di­esel, que va­riam entre 17 mil e 310 mil euros cada. «Atri­buir a uma lo­co­mo­tiva a cir­cular um valor in­fe­rior ao seu valor em su­cata é inad­mis­sível», pro­testa-se no co­mu­ni­cado, re­al­çando que «todas estão em con­di­ções de cir­cular».
O facto de estar apta para o ser­viço na fer­rovia por­tu­guesa sig­ni­fica que, mesmo perto do fim de vida útil, qual­quer uma da­quelas lo­co­mo­tivas possui «equi­pa­mentos em­bar­cados» que valem cerca de 145 mil euros e podem ser re­ti­rados e mon­tados noutro veí­culo que vá cir­cular na rede fer­ro­viária na­ci­onal. O valor es­ti­mado dos «equi­pa­mentos em­bar­cados» das 59 lo­co­mo­tivas ul­tra­passa 8,5 mi­lhões de euros.
Também sem contar para o valor da «ca­pi­ta­li­zação», a CP pú­blica de­cidiu ainda ofe­recer à CP Carga pri­va­ti­zada um con­junto de peças so­bres­sa­lentes para a ma­nu­tenção do parque de lo­co­mo­tivas, o qual de­verá valer dez por cento do valor das má­quinas. Isto re­pre­sen­taria 11,6 mi­lhões de euros, mas sig­ni­fica muito mais, porque as lo­co­mo­tivas estão lar­ga­mente su­ba­va­li­adas pela CP.

 



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