Porta(s) giratória

Vasco Cardoso

Ao longo dos anos, fomos cons­ta­tando e com­ba­tendo essa es­pécie de porta gi­ra­tória por onde pro­e­mi­nentes fi­guras da po­lí­tica de di­reita cir­culam entre cargos go­ver­na­tivos e os con­se­lhos de ad­mi­nis­tração dos grupos mo­no­po­listas a quem essa mesma po­lí­tica serve. Altos di­ri­gentes, eleitos em im­por­tantes cargos pú­blicos, go­ver­nantes que ti­veram nas mãos de­ci­sões que va­leram mi­lhões de euros de lu­cros ao grande ca­pital, vão en­tre­me­ando as fun­ções de di­ri­gentes po­lí­ticos e aquilo a que al­guns eu­fe­mis­ti­ca­mente chamam de Mundo dos Ne­gó­cios. É uma evi­dência que a ex­po­sição pú­blica en­quanto in­ter­ve­ni­entes na acção po­lí­tica é muito maior do que aquela que se re­co­menda por de­trás da cor­tina onde o ca­pital ma­nobra e a opa­ci­dade im­pera. Mas há sempre aquelas si­tu­a­ções mais di­fí­ceis de es­conder, como a que foi re­ve­lada esta se­mana, com a cha­mada de dois ex-mi­nis­tros de go­vernos PS, An­tónio Vi­to­rino e Campos e Cunha, ao con­selho de ad­mi­nis­tração do Grupo San­tander/​Totta. Grupo eco­nó­mico es­pa­nhol que tem vindo a as­sumir po­si­ções cres­centes na banca e que abraça nos seus ór­gãos so­ciais fi­guras oriundas do PSD, CDS e PS.

Mas os úl­timos anos trou­xeram outra no­vi­dade: a «saída» da ac­ti­vi­dade po­lí­tica, não para uma ca­deira dou­rada dum qual­quer grupo eco­nó­mico, mas para o papel de co­men­tador po­lí­tico de pre­fe­rência, num canal de te­le­visão. De certa forma, à conta da re­pe­tição dessa prá­tica, quase que se tornou num cri­tério de es­colha aceite e na­tu­ra­li­zado. As te­le­vi­sões jus­ti­ficam tudo em nome das au­di­ên­cias, da no­to­ri­e­dade das suas es­co­lhas, do do­mínio dos dos­siers dos seus novos «co­la­bo­ra­dores». E os pró­prios re­agem com sa­tis­fação jo­gando em dois ta­bu­leiros: o ide­o­ló­gico e o pes­soal (dei­xemos aqui de lado o mo­ne­tário). Sendo que a sua pre­sença pú­blica e re­gular nos media é uma es­pécie de ga­rantia da sua re­a­bi­li­tação, so­bre­vi­vência e pro­jecção po­lí­tica fu­tura. O caso do ac­tual Pre­si­dente da Re­pú­blica é pa­ra­dig­má­tico da­quilo que se acabou de es­crever. E o caso de Paulo Portas, com o anúncio de que irá ter um pro­grama de co­men­tário se­manal na TVI, pa­recia que es­tava es­crito nas es­trelas.

 



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