Política de habitação

Francisco Queirós (Membro do Comité Central)

«Todos têm direito, para si e para a sua família, a uma habitação de dimensão adequada, em condições de higiene e conforto e que preserve a intimidade pessoal e a privacidade familiar.», pode ler-se no número 1 do artigo 65.º da Constituição da República (CR). A Constituição consagra direitos fundamentais que os trabalhadores conquistaram nas ruas e pela luta naqueles dias da revolução de Abril. O direito a um tecto é essência da dignidade humana. A lei das leis determina o papel do Estado para assegurar este direito, realçando no número 3 do artigo 65.º: «O Estado adoptará uma política tendente a estabelecer um sistema de renda compatível com o rendimento familiar e de acesso à habitação própria».

A habitação, além do papel determinante na vida de cada um, determina e é determinada por políticas de ordenamento do território e é condicionada pelas políticas económicas, constituindo um importante sector de negócios e por isso sujeita aos interesses do capital financeiro.

Para muitos milhares de portugueses o acesso a habitação condigna é ainda um sonho. Temos milhares de casas vazias (735 mil nos Censos de 2011). Mas também temos milhares de cidadãos sem casa condigna (cerca de 400 mil), vivendo em casas degradadas, sem condições mínimas de habitabilidade, ou a viver em grave sobreocupação.

Não há uma política pública de habitação, o que seria fundamental para a concretização de políticas de maior justiça social, redução das desigualdades e para o próprio desenvolvimento económico.

A intervenção dos últimos governos, em especial do PSD/CDS, com alterações à lei das rendas e à lei do arrendamento apoiado tornou mais distante o acesso à habitação. A opção ideológica e política era evidente. Reduzir as políticas de habitação social ao assistencialismo, tratando os sectores sociais mais desfavorecidos à luz de uma lógica de marginalidade social que tinha de ser vigiada e controlada. E, claro, favorecer os interesses económicos. Na actual conjuntura política foi já possível inverter algumas destas medidas socialmente mais gravosas com alterações às leis de arrendamento e em particular ao arrendamento apoiado.

Não há uma política coerente de reabilitação urbana. Os centros das cidades ficam à mercê de grandes interesses e sujeitos a uma política de expulsão dos seus habitantes, substituídos pelos mais ricos ou por actividades económicas como o turismo. Os preços médios do arrendamento são proibitivos. O apoio a arrendamento jovem reduziu-se. O capital financeiro está a lançar um novo ciclo de promoção especulativa de aquisição de habitação, com todos os riscos que tal comporta.

Importa alterar o rumo das políticas de habitação, fazendo cumprir a Constituição. O negócio do imobiliário é extremamente apetecível. A habitação é porém demasiado central na vida das populações, um imperativo de bem-estar, um direito fundamental. A sua relevância no ordenamento do território e para a economia nacional impõe também aqui uma política alternativa, patriótica e de esquerda.

Um tecto digno, uma habitação de dimensão adequada com condições de higiene e de conforto para todos, como expressa a CR, faz parte do Abril por construir. Tarefa para a qual, ontem como hoje, se apresentam os militantes comunistas.




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