Farsantes

Agostinho Lopes

Eram an­ti­co­mu­nistas ontem, con­ti­nuam an­ti­co­mu­nistas hoje

LUSA

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Uma in­fin­dável corte de ha­bi­tuais co­men­ta­dores – os Ta­vares (Mi­guel Sousa, João Mi­guel, Rui), os Hen­ri­ques (Mon­teiro & Ra­poso), Rangel e Assis, Te­resa de Sousa, Ma­nuel Car­valho, e etc., in­vec­ti­varam de forma apo­ca­líp­tica, in­chados de an­ti­fas­cismo e dedo acu­sador, o PCP (e ou­tros), pela sua po­sição sobre o des­fecho a dois (Le Pen e Ma­cron) da 2.ª volta das elei­ções pre­si­den­ciais fran­cesas.

O que mais os pre­o­cu­pava era mesmo o re­sul­tado, ca­recas de saber o seu ine­vi­tável des­fecho. As son­da­gens en­ganam-se, mas nem tanto, quando apontam uma di­fe­rença de 20 pontos per­cen­tuais. E so­bre­tudo quando co­nhe­ciam as in­cli­na­ções de voto dos blocos da 1.ª volta, e fun­da­men­tal­mente onde ia votar a oli­gar­quia fi­nan­ceira fran­cesa e os seus ór­gãos de co­mu­ni­cação so­cial, de que Ma­cron era o can­di­dato e hoje o Pre­si­dente. Oli­gar­quia essa res­pon­sável pela su­bida da ex­trema-di­reita e dos Le Pen em França e que tem cons­ti­tuído um se­guro de vida para a al­ter­nância elei­toral fran­cesa, ga­ran­tindo a po­lí­tica de di­reita do ca­pi­ta­lismo ne­o­li­beral pelo em­purrão ca­na­li­zador do voto útil para os par­tidos do cen­trão (PS e Re­pu­bli­canos). Quando con­si­de­rarem (como acon­teceu no pas­sado) que é tempo da Ma­rine Le Pen, ou de outra Le Pen qual­quer, lá che­garão.

En­gra­çado foi que, antes da 1.ª volta, se es­pe­ci­a­li­zaram na sua es­tranha ge­o­me­tria «dos ex­tremos que se tocam», Le Pen igual a Mé­len­chon. De­pois re­cla­maram que Mé­len­chon fosse di­fe­rente e vo­tasse em Ma­cron, contra Ma­rine! Aliás, teria sido in­te­res­sante que ti­vessem es­cla­re­cido em quem vo­tavam, numa hi­po­té­tica 2.ª volta Le Pen/​Mé­len­chon. Seria «uma es­colha im­pos­sível», como afirmou Carlos Gaspar (Pú­blico, 22A­BR17), o único que se ma­ni­festou sobre o as­sunto!

O que pro­cu­raram com todo este mau te­atro de fan­to­ches foi fugir a res­ponder (como já fu­giram na eleição de Trump) à questão cru­cial: por que é que as po­lí­ticas que apoi­aram nestes úl­timos 40 anos em Por­tugal, na Eu­ropa e no Mundo con­du­ziram ao de­sastre em curso, eco­nó­mico, so­cial, po­lí­tico e da paz no mundo, so­bre­tudo de­pois do de­sa­pa­re­ci­mento da sua «besta negra», a URSS, cul­pada de todos os males há 25 anos? Como con­du­ziram as «de­mo­cra­cias oci­den­tais e li­be­rais» as suas so­ci­e­dades até à beira do ninho da ser­pente fas­cista, do abismo de uma nova guerra ge­ne­ra­li­zada? Que fi­zeram do dito ele­vador so­cial en­quanto ca­vavam fundas de­si­gual­dades nesses países? Como foi pos­sível que essas so­ci­e­dades edu­cadas e aper­fei­ço­adas pelas dou­trinas so­cial-de­mo­cratas e de­mo­crata-cristãs, li­be­rais e oci­den­tais, ti­vessem pro­du­zido tais elei­tores?

O que pro­cu­raram foi fugir às suas res­pon­sa­bi­li­dades, face à sua in­ter­venção pú­blica, po­lí­tica, me­diá­tica na vida por­tu­guesa nestas três, quatro dé­cadas, apoi­ando os par­tidos PS, PSD e CDS e as po­lí­ticas de su­ces­sivos go­vernos que con­du­ziram o País à triste si­tu­ação em que se en­contra.

E os «co­men­to­cratas» não he­si­taram, na ex­pli­cação dos «ex­tremos que se tocam», em re­vi­sitar a his­tória com ve­lhas fal­si­fi­ca­ções e men­tiras dos anos ne­gros do as­censo do fas­cismo, 1930/​1940, em Por­tugal, na França, na Ale­manha e no mundo. De facto, ver­sões há muito re­es­critas pela so­cial-de­mo­cracia eu­ro­peia e a de­mo­cracia-cristã para es­con­derem trai­ções e cum­pli­ci­dades. Na Guerra Civil de Es­panha, na su­bida de Hi­tler e Mus­so­lini ao poder, no início e de­sen­vol­vi­mento da Se­gunda Guerra Mun­dial. Na ma­nu­tenção das di­ta­duras fas­cistas ibé­ricas du­rante dé­cadas, com o amém das de­mo­cra­cias oci­den­tais.

Co­e­rência...

Há os que jun­taram nesta la­men­tosa ja­cu­la­tória de fa­ri­saísmo an­ti­fas­cista, de facto ver­ri­noso an­ti­co­mu­nismo, a sua com­pun­gida crí­tica pelo PCP não se ter as­so­ciado às re­fe­rên­cias ao nome de Mário So­ares nas co­me­mo­ra­ções do 25 de Abril na As­sem­bleia da Re­pú­blica. Fartos que estão de co­nhecer a po­sição do PCP sobre Mário So­ares... O re­co­nhe­ci­mento do seu papel na luta an­ti­fas­cista, que não es­conde o seu papel e tra­jecto na contra-re­vo­lução em Por­tugal como se­cre­tário-geral do PS e altos cargos da Re­pú­blica. Que não podem ser apa­gados pela vi­ragem feita nos úl­timos anos de vida contra a po­lí­tica dos go­vernos do PSD/​CDS.

Como não he­si­taram em in­vocar pre­tensas cum­pli­ci­dades his­tó­ricas do PCP e dos co­mu­nistas com a di­reita e ex­trema-di­reita. Cer­ta­mente na lem­brança de que muitos deles não ti­veram pejo nem es­tados de alma, no pós 25 de Abril, em aliar-se com toda a es­cu­malha her­deira da di­ta­dura, co­lo­ni­a­listas in­clu­sive, para com­bater o PCP e sub­verter a Re­vo­lução e a Cons­ti­tuição. E talvez va­lesse a pena falar da rede bom­bista… e dos as­saltos aos Cen­tros de Tra­balho do PCP. Aliás, al­guns, ou quase todos, eram nessa al­tura gente de uma dita «ex­trema-es­querda re­vo­lu­ci­o­nária» (de facto quase sempre gru­pe­lhos pro­vo­ca­tó­rios), que logo vi­raram para ou­tros ares e ex­tremos po­lí­ticos, mais pro­pí­cios à su­bida na vi­dinha, mal a aragem do tempo passou a correr de outra forma. Gabe-se-lhes a co­e­rência. Eram an­ti­co­mu­nistas ontem, con­ti­nuam an­ti­co­mu­nistas hoje.

An­davam num su­foco, com falta de ar. Fi­caram ali­vi­ados com a eleição da opção «so­cial-de­mo­crata» Ma­cron, o «so­cial-li­beral» do «centro-es­querda». Em re­co­nhe­ci­mento, o novo pre­si­dente anuncia como uma das pri­meiras me­didas (no Verão) a «sim­pli­fi­cação da lei la­boral por de­creto». Isto é, pros­se­guir a de­mo­lição dos di­reitos dos tra­ba­lha­dores, ini­ciada como mi­nistro de Hol­lande. E de igual forma, ex­cluindo do de­bate e de­cisão a As­sem­bleia Na­ci­onal fran­cesa. Arre, que é de­mo­crata! Olha se não o fosse...




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