Faltas

Correia da Fonseca

Com a falta de boas ma­neiras e de se­re­ni­dade que pa­recem ca­rac­te­rizá-lo desde que os re­pre­sen­tantes do povo por­tu­guês lhe re­ti­raram a chefia do go­verno, o dr. Passos Co­elho surgiu há dias nos nossos te­le­vi­sores a afirmar que a no­me­ação do dr. La­cerda Ma­chado para a ad­mi­nis­tração da TAP «é uma falta de ver­gonha». É certo que a no­me­ação em causa é dis­cu­tível, como aliás o PCP já afirmou pu­bli­ca­mente, em­bora não porque o dr. La­cerda possa ser amigo pes­soal de An­tónio Costa, como por aí consta e a TV não se cansa de re­petir (ainda que se com­pre­enda que o dr. Co­elho pre­fe­risse ver o PM ro­deado de ini­migos). Mas falar em «ver­gonha», e para mais ser o dr. Passos a fazê-lo, é um pouco mais que falta de ver­gonha: é falta de pru­dência e de bom senso porque se trata de uma acu­sação com fácil de­vo­lução ao re­me­tente. Em ver­dade, ver­gonha e das mais graves é o rol de gra­vís­simas e ines­que­cí­veis agres­sões per­pe­tradas sobre o povo por­tu­guês pelo go­verno do dr. Passos Co­elho nos anos em que exerceu o poder. Essa ver­gonha, pa­rece não a sentir o ex-PM da ri­dí­cula ban­dei­rinha na la­pela. O que re­força os mo­tivos de ver­gonha com a agra­vante da falta de cons­ci­ência.

Uma ci­lada fa­lhada

En­tre­tanto, acon­teceu um dia destes que a SIC re­cebeu não a vi­sita do dr. An­tónio Costa, pois de uma vi­sita não se tra­tava, mas de uma sua des­lo­cação ope­ra­ci­onal, di­gamos assim. É que, como aliás foi ex­pres­sa­mente con­fir­mado por José Gomes Fer­reira, co­nhe­cido fun­ci­o­nário local in­fe­liz­mente ho­mó­nimo de um grande poeta es­que­cido, o pri­meiro-mi­nistro foi ali em acei­tação de um pe­dido de en­tre­vista que lhe havia sido di­ri­gido, pelo que o te­les­pec­tador talvez um pouco in­génuo se pre­parou para as­sistir à en­tre­vista anun­ciada. Não foi ne­ces­sário muito tempo, porém, para se tornar claro que aquilo não era exac­ta­mente uma en­tre­vista mas sim um de­bate em que uma afir­mação do vi­si­tante era pron­ta­mente con­tra­riada pelo homem da casa que, en­trin­chei­rado nas sa­be­do­rias que aliás re­gu­lar­mente exibe, sus­ten­tava uma visão oposta pe­rante cada ponto por ele pró­prio pro­posto. Deste modo, a subs­ti­tuição da anun­ciada en­tre­vista por uma efec­tiva dis­cussão acerca de su­ces­sivas ques­tões era tão óbvia que no dia se­guinte o DN, que não é pro­pri­a­mente uma folha de pro­víncia com li­mi­tadas res­pon­sa­bi­li­dades jor­na­lís­ticas, sempre se re­feriu a «de­bate» e não a «en­tre­vista» ao dar no­tícia do pro­grama. Tornou-se assim claro que o PM foi alvo de uma es­pécie de ci­lada: atraíram-no àquela es­tação so­li­ci­tando-lhe uma en­tre­vista, for­çaram-no de facto a um de­bate com o es­pe­ci­a­lista local em Eco­nomia e Fi­nanças, e aí se si­tuou uma óbvia falta de le­al­dade, talvez de pudor. Acon­teceu, não de­certo por puro acaso, que An­tónio Costa não saiu dali es­ma­gado sob o peso de uma der­rota hu­mi­lhante, antes pelo con­trário: até se pode dizer que o ob­jec­tivo da em­bos­cada fa­lhara. Faltou, pois, a vi­tória que iria co­roar a es­per­teza do falso con­vite e a efi­cácia das sa­benças que ha­ve­riam de es­magar o PM. Mas não há ves­tí­gios de que tenha fal­tado a in­tenção. Pelo que convém re­gistar o feio epi­sódio para me­mória e even­tual pre­venção do fu­turo.

 



Mais artigos de: Argumentos

Paz – objectivo central da actualidade

A defesa da Paz é um objectivo central na actualidade. O nosso quotidiano é trespassado com cenas de violência e imagens televisivas que, em geral, escamoteiam os verdadeiros responsáveis. Raramente surge um debate verdadeiramente pluralista que aborde as causas, os...