Fim do império

Henrique Custódio

Na pas­sada sexta-feira, o pre­si­dente norte-ame­ri­cano, Do­nald Trump, exibiu o seu fun­ci­o­na­mento com as­si­na­lável es­plendor.

Es­co­lheu Miami como local, um pa­vi­lhão dos bom­beiros como palco e uma mul­tidão de cu­banos an­ti­Cuba ulu­lando aplausos no re­cinto. Cum­pri­mentou a mul­tidão, os bom­beiros que «for­ne­ceram as ins­ta­la­ções», os «he­róis da Baía dos Porcos» pre­sentes na pri­meira fila e mul­ti­plicou abun­dan­te­mente as duas si­na­lé­ticas que sabe fazer – es­petar o po­legar e apontar o in­di­cador.

Posto isto, anun­ciou o que se es­pe­rava: os EUA iam «anular» as re­la­ções com Cuba que a ad­mi­nis­tração Obama havia for­ma­li­zado – uma anu­lação «com efeito ime­diato», ga­rantiu ele, sempre tre­men­dista e em po­sição de as­si­na­tura.

Deste efec­tivo en­tremez as­si­nale-se a sau­dação de Trump aos «he­róis da Baía dos Porcos», pom­po­sa­mente ins­ta­lados na pri­meira fila. Su­pos­ta­mente, per­tencem ao bando de mer­ce­ná­rios e ener­gú­menos com que os EUA in­va­diram Cuba em 1961, sendo ven­cidos e es­cor­ra­çados em toda a linha pelas forças re­vo­lu­ci­o­ná­rias cu­banas. Um pre­si­dente norte-ame­ri­cano chamar-lhes «he­róis» 56 anos de­pois de en­xo­tados pelas armas, eis um feito que nem pre­si­dentes com o dé­fice cul­tural e re­van­chismo de Re­agan ou Ge­orge Bush ou­saram pra­ticar.

De qual­quer modo, as saídas de sen­deiro que ca­rac­te­rizam os actos pre­si­den­ciais de Trump também aqui se re­ve­laram, pois nem a em­bai­xada dos EUA em Cuba fe­chou ou vai fe­char, nem os voos norte-ame­ri­canos de e para Ha­vana ter­mi­naram. O cos­tume.

Deste homem, que é pre­si­dente da maior po­tência mun­dial, basta dizer que foi o in­ventor da «pós-ver­dade» ou seja, a men­tira como ins­tru­mento le­gí­timo da vida po­lí­tica, de­cor­rendo, de en­xur­rada, o des­pres­tígio ge­ne­ra­li­zado do exer­cício po­lí­tico e go­ver­na­mental em qual­quer cir­cuns­tância ou sen­tido. Na es­cala de va­lores que ins­ti­tuiu, chamar-lhe pa­lhaço, fas­cista, im­becil ou he­do­nista é sim­ples «ma­téria de pro­pa­ganda» dos «seus ini­migos».

Mas a cri­a­tura tem ins­tinto de pre­ser­vação, daí esta ofen­siva contra Cuba no mo­mento em que está en­cur­ra­lado por um inqué­rito ju­di­cial a in­ves­tigar a sua ale­gada obs­trução à Jus­tiça no «caso russo». Tal e qual o pre­si­dente Clinton fez quando es­tava a ser es­cru­ti­nado por obs­trução à Jus­tiça no caso Mo­nica Le­vinski, apenas com a di­fe­rença de alvo: Clinton bom­bar­deou a Ju­gos­lávia e Trump ataca as re­la­ções com Cuba.

Es­tamos pe­rante um homem pe­ri­goso na sua er­rância, dado o poder de que dispõe, sendo frágil e in­qui­e­tante a es­pe­rança de que fun­ci­onem os fa­mosos «contra-po­deres» nos EUA para travar me­didas de­men­ciais de Trump.

Uma coisa é certa: Do­nald Trump, na sua ar­ro­gância fla­tu­lenta, con­subs­tancia não apenas o beco sem saída da ex­plo­ração ca­pi­ta­lista, como pre­nuncia o fim do im­pério norte-ame­ri­cano.

 



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