Costa em Estrasburgo
O primeiro-ministro português discursou no Parlamento Europeu, a convite do seu presidente, sobre «o futuro da Europa».
O convite foi feito a todos os chefes de governo da UE, com excepção do Reino Unido. Costa foi o terceiro a marcar presença.
Parte integrante da operação de branqueamento e aprofundamento da UE, não é de esperar deste desfile de líderes de governo pelo Parlamento Europeu coisa diferente da estafada e fastidiosa profissão de fé nas virtudes da UE.
Uma das teses centrais que percorreu o discurso de Costa foi a de que, ao contrário do que alguns afirmavam, é possível levar a cabo políticas alternativas sem pôr em causa as «regras» da UE e do euro. Para suportar a afirmação, Costa acenou com a experiência portuguesa e com números: 2,7 por cento de crescimento económico em 2017, o valor mais alto do século; e 1,1 por cento de défice.
Ora, contraditoriamente, os 2,7 por cento de crescimento económico – expressão modesta de uma política de recuperação de rendimentos limitada precisamente pelas tais «regras» –, ficando aquém do que a dimensão dos problemas do País e a necessidade premente de lhes responder exigiriam, constituem, de facto, o ponto alto de quase duas décadas de estagnação económica. Facto que muito diz acerca dessas duas décadas, que correspondem, no essencial, ao período em que o País viveu amarrado ao euro. Tal é o impacto estrutural do euro, que nenhuma conjuntura poderá ocultar: estagnação económica, divergência, dependência, retrocesso social.
O referido crescimento económico, ainda assim, só foi possível – tal como a política de recuperação, defesa e conquista de direitos e de rendimentos que em boa medida o explica – graças à luta dos trabalhadores e do povo e ao papel determinante do PCP nesta fase da vida política nacional. Política que, não o esqueçamos, mesmo no seu limitado alcance e expressão, foi alvo de toda a sorte de pressões, chantagens e ameaças por parte da UE e das suas instituições.
Política que precisamente por esse limitado alcance e expressão – ditado pela obediência às «regras» a que Costa e o PS estão amarrados – não logrou responder a fundos problemas nacionais, como a debilidade do aparelho produtivo, os défices estruturais do País, a degradação dos serviços públicos, as assimetrias regionais, entre outros.
Talvez Merkel tenha ocasião de recordar a Costa, num qualquer Conselho Europeu, as afirmações que em tempos fez para justificar a necessidade do edifício legislativo que consubstancia as tais «regras» (Tratado Orçamental, Governação Económica, Semestre Europeu). Disse Merkel, de forma muito elucidativa: «na Europa, precisamos de algo que nos garanta que, mesmo que mudem os governos, não mudem as políticas».
Perante isto, a solução não passa nem por densificar e aprofundar essas regras, nem por encontrar formas ainda mais férreas de forçar a sua aplicação. Sem surpresa, por aqui andaram algumas das propostas de Costa, que nem se esqueceu de dar o seu acordo à criação do cargo de «ministro das finanças da Zona Euro».
A solução não é insistir em requentadas promessas e ilusões que a vida fez cair por terra, mas sim romper corajosamente as amarras que impedem o desenvolvimento soberano do País.