Revogar a lei dos despejos

Dias Coelho

Pro­postas apre­sen­tadas pelo PS não re­solvem nem atacam o pro­blema

O pro­cesso de li­be­ra­li­zação das rendas e dos des­pejos, ini­ciado pelo go­verno do PS em 2006, foi­a­gu­di­zado pelo an­te­rior go­verno PSD/​CDS e fra­gi­lizou e pre­ca­rizou os di­reitos dos in­qui­linos.

Por pro­posta do PCP, vai ser amanhã dis­cu­tida na As­sem­bleia da Re­pú­blica a re­vo­gação da lei dos des­pejos, da au­toria do go­verno PSD/​CDS e na qual As­sunção Cristas tem par­ti­cu­lares res­pon­sa­bi­li­dades. Esta lei veio des­re­gu­la­mentar o mer­cado de ar­ren­da­mento e fa­ci­litar o des­pejo de mi­lhares de pes­soas e fa­mí­lias, em be­ne­ficio apenas da es­pe­cu­lação imo­bi­liária. São os dados ofi­ciais que dizem que em média mais de cinco fa­mí­lias são des­pe­jadas da sua ha­bi­tação, por dia, porque os seus ren­di­mentos não lhes per­mitem pagar os ele­vados va­lores de renda (só num ano, se­gundo um portal imo­bi­liário, au­men­taram 26%) im­postos pela es­pe­cu­lação, tor­nando-os em muitos casos proi­bi­tivos para a es­ma­ga­dora mai­oria da po­pu­lação e para mi­lhares de jo­vens que se vêem im­pe­didos de cons­ti­tuir fa­mília.

Mi­lhares de por­tu­gueses, par­ti­cu­lar­mente os de mais baixos ren­di­mentos, ou mesmo de mé­dios ren­di­mentos, são ex­pe­lidos para a pe­ri­feria, fi­cando al­guns sem uma ha­bi­tação. Cen­tenas de pe­quenas em­presas do co­mércio e res­tau­ração, de­zenas de co­lec­ti­vi­dades e as­so­ci­a­ções po­pu­lares fi­caram sem os seus es­paços. Tudo isto pro­voca al­te­ra­ções so­ci­o­ló­gicas, cul­tu­rais, eco­nó­micas e so­ciais no meio, nas vidas e vi­vên­cias co­lec­tivas cons­truídas ao longo de ge­ra­ções, des­povoa as ci­dades.

As pro­postas agora apre­sen­tadas pelo PS, sob a capa de uma «Nova Ge­ração de Po­lí­ticas Ha­bi­tação», para lá de uma ou outra me­dida avulsa, não re­solvem nem atacam o pro­blema de fundo que anima e sus­tenta a es­pe­cu­lação imo­bi­liária, nem as­sumem a res­pon­sa­bi­li­dade que a CRP co­mete ao Es­tado e sem a qual não há res­posta séria e eficaz ao di­reito à ha­bi­tação. Ao fim e ao cabo, ao invés de as­sumir a vital e in­subs­ti­tuível in­ter­venção do Es­tado neste do­mínio, o PS toma a opção de fra­gi­lizar a sua ca­pa­ci­dade mos­trando-se in­capaz de re­solver com efi­cácia o pro­blema da ha­bi­tação, re­me­tendo para as au­tar­quias, na linha da des­res­pon­sa­bi­li­zação do Es­tado pa­tente no pro­cesso de trans­fe­rência de com­pe­tên­cias uma grande parte do ónus da re­so­lução deste grave pro­blema.

Di­reito à ha­bi­tação

Para o PCP é ne­ces­sário: as­se­gurar o di­reito Cons­ti­tu­ci­onal a uma ha­bi­tação con­digna para todos, com o Es­tado a as­sumir o papel fun­da­mental; re­vogar a lei dos des­pejos; as­se­gurar o fi­nan­ci­a­mento do Es­tado na pro­moção di­recta de ha­bi­tação; al­terar a lei da renda apoiada e do alo­ja­mento local; de­finir um pro­grama de apoio à in­ter­venção do mo­vi­mento co­o­pe­ra­tivo ha­bi­ta­ci­onal ga­ran­tindo con­di­ções de fi­nan­ci­a­mento e in­cen­tivos fis­cais; es­ta­be­lecer pro­gramas pú­blicos de re­a­bi­li­tação do parque ha­bi­ta­ci­onal, ga­ran­tindo o di­reito das po­pu­lação de origem ao local de re­si­dência; mo­bi­lizar os mi­lhares de fogos de­vo­lutos, co­lo­cando-os no mer­cado quer de renda apoiada, quer con­di­ci­o­nada; de­sen­volver e pro­mover uma po­lí­tica de uso do solo de­ter­mi­nada pelos di­reitos das po­pu­la­ções e não pelos in­te­resses da es­pe­cu­lação; de­sen­volver uma po­lí­tica de pla­ne­a­mento de­mo­crá­tico, par­ti­ci­pada e trans­pa­rente, que dê pri­mazia ao in­te­resse pú­blico sobre os pri­vados

In­de­pen­den­te­mente do des­tino da sua pro­posta de re­vo­gação da lei dos des­pejos, o PCP não des­per­di­çará ne­nhuma opor­tu­ni­dade para repor di­reitos, não de­sis­tirá de lutar por um di­reito bá­sico cons­ti­tu­ci­o­nal­mente con­sa­grado. O PCP apela aos tra­ba­lha­dores e ao povo, às vastas ca­madas da po­pu­lação por­tu­guesa que vivem do seu tra­balho, para que lutem em de­fesa do di­reito a uma ha­bi­tação con­digna!




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