O BCE e as ilusões de um capitalismo verde

Miguel Viegas

Quase três décadas passadas sobre a conferência do Rio já perdemos a conta às cimeiras internacionais sobre o clima, sempre coroadas com declarações sonantes das principais potências capitalistas batendo com a mão no peito e afirmando que agora sim, vamos pôr mãos à obra. De acordo com resultados apresentados na 24 Conferência do Clima realizada no ano passado na Polónia, 2018 foi o ano de todos os recordes de emissões de CO2 e tudo indica que 2019 irá ser ainda pior. É por isso justa a luta dos muitos milhões de jovens que se manifestaram no mês passado em todo o mundo, incluindo em Portugal. Pena é que na ampla cobertura dada a este movimento, não tenha havido nenhuma análise crítica sobre as causas do completo fracasso das medidas postas em prática pelos países capitalistas e pela União Europeia para mitigar as alterações climáticas. Bastaria, por exemplo, um olhar sobre o papel do Banco Central Europeu (BCE) para se antever as contradições do sistema e perceber melhor a natureza das medidas sucessivamente postas em práticas nas últimas décadas. Mas isto seria questionar o próprio sistema e suscitar a sua superação…

Na sequência da crise financeira de 2008, numa tentativa desesperada de salvar o capital financeiro, o euro e o capitalismo, o BCE começou em 2015 o seu programa de expansão quantitativa com a compra mensal de 60 mil milhões de títulos de dívida no mercado secundário. Esta liquidez foi entregue ao sistema financeiro e às grandes empresas. Um estudo recente do Instituto Veblen revela que grande parte deste dinheiro acabou por financiar actividades altamente poluentes e fortemente ligadas às energias fósseis. Do programa de expansão quantitativa do BCE 80% destinaram-se à compra de dívida pública sendo o restante dirigido às empresas privadas. De acordo com o estudo, 63% dos 110 mil milhões de euros de títulos obrigacionistas privados comprados pelo BCE acabou por financiar empresas do ramo automóvel, centrais de produção eléctrica a partir de combustíveis fósseis (incluindo carvão), auto-estradas e gasodutos.

De acordo com o Tribunal Europeu de Contas, a transição energética necessária para diminuir as emissões de carbono e mitigar as alterações climáticas implica um investimento anual da ordem de um bilião de euros. Ou seja, pouco mais do que o BCE injectou no sistema financeiro e nas grandes empresas nos últimos anos. Podemos imaginar o que seria a constituição de um fundo solidário de investimento ecológico distribuído e gerido pelos Estados Membros de acordo com o seu tamanho e o seu nível de desenvolvimento. Este fundo serviria para financiar políticas de transportes orientadas para a valorização do serviço público ou para políticas energéticas ao serviço das populações e da economia e não centradas no lucro das grandes multinacionais do sector. É para isto que queremos uma outra Europa, não a União Europeia do Capital mas antes a Europa dos trabalhadores e dos povos em luta pela defesa do ambiente e da gestão racional dos recursos naturais.




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