A raiz

Correia da Fonseca

Por si­nais de vária ordem, entre os quais o pro­testo que foi iden­ti­fi­cado como greve es­colar mo­ti­vada por pre­o­cu­pa­ções eco­ló­gicas, é evi­dente que se está a ge­ne­ra­lizar a dis­cussão em torno da questão am­bi­ental. E será ade­quado não apenas acres­centar que «ainda bem», mas também acen­tuar que a es­querda co­e­rente e lú­cida há muito se mo­bi­lizou para a questão, de­sig­na­da­mente através do PCP e do Par­tido Eco­lo­gista «Os Verdes», ali­ados na CDU. É certo que por essa Eu­ropa fora, por esse mundo fora, as gentes estão a ficar muito pre­o­cu­padas com a ame­a­ça­dora de­riva das ques­tões am­bi­en­tais que têm di­rec­ta­mente a ver com a pró­pria ha­bi­ta­bi­li­dade do pla­neta pelos hu­manos, esses bi­chos le­vi­anos que por vezes pa­recem quase in­di­fe­rentes às con­di­ções da sua pró­pria so­bre­vi­vência.

A so­bre­vi­vência

Acon­tece, porém, que para que uma in­qui­e­tação se torne útil e venha a gerar pro­vi­dên­cias efi­cazes não basta iden­ti­ficar a ameaça: é também in­dis­pen­sável co­nhecer as cir­cuns­tân­cias que a de­ter­minam, as raízes que a ali­mentam e o ter­reno onde elas se cravam. No caso da im­por­tante questão am­bi­ental o pre­si­dente Trump deu uma boa ajuda: in­formou o mundo, por pa­la­vras lá dele e no seu es­tilo sempre muito sa­bo­roso, que isso da ameaça cli­má­tica não existe, é in­venção de uns falsos sá­bios talvez ao ser­viço dos chi­neses, e que as in­dús­trias norte-ame­ri­canas e con­gé­neres podem con­ti­nuar a in­jectar no am­bi­ente todos os ele­mentos pe­ri­gosos que lhes ape­teçam de­certo porque «God will save Ame­rica». Na ver­dade, é um op­ti­mismo um tanto ex­ces­sivo, mas tem o mé­rito de in­vo­lun­ta­ri­a­mente de­nun­ciar o dado fun­da­mental: que a in­ten­si­fi­cação in­dus­trial des­pre­o­cu­pada e des­bra­gada em que os Es­tados Unidos são lí­deres, chefes de fila e exemplo que se ofe­rece para ser se­guido, me­rece estar num ima­gi­nável banco dos réus por crime de agressão ao am­bi­ente. Porém, falar de in­ten­si­fi­cação in­dus­trial é es­casso: é pre­ciso re­ferir o ines­crú­pulo da avidez cega pela ma­xi­mi­zação do lucro, da in­di­fe­rença por con­sequên­cias que por­ven­tura ou­tros su­portem, de uma es­pécie de so­lip­sismo ge­rador de crimes que está na pró­pria es­sência do ca­pi­ta­lismo. É ge­ne­ra­li­za­da­mente sa­bido ainda que também ge­ne­ra­li­za­da­mente ocul­tado, qual é o pró­prio motor in­terno do ca­pi­ta­lismo: a «ga­nância» que há poucas se­manas foi de­nun­ciada pelo Papa Fran­cisco, em­bora apenas como um mal do nosso tempo, de­certo porque se diria ex­ces­siva a au­dácia de colar ao crime a iden­ti­fi­cação do cri­mi­noso. E aí estão o facto e o res­pon­sável, a de­gra­dação am­bi­ental em ex­plosão e o me­ca­nismo cego e in­sa­ciável que a pro­voca. Ou de outro modo: a ár­vore fron­dosa mas tó­xica e a raiz que a ex­plica. Sa­bemo-lo. Por isso pros­se­guimos contra ela a luta. Já não apenas porque se trata de uma luta justa: também porque está ver­da­dei­ra­mente em questão a so­bre­vi­vência co­lec­tiva.




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