No combate à epidemia nem um direito a menos

RE­SISTIR No pas­sado sá­bado, dia 18, o PCP di­na­mizou, nas suas di­versas pla­ta­formas di­gi­tais, uma au­dição pú­blica sob o tema «No com­bate à epi­demia nem um di­reito a menos» que abordou os di­versos pro­blemas en­fren­tados pelos tra­ba­lha­dores nestes tempos com­plexos.

«São os tra­ba­lha­dores que ga­rantem que o País con­tinue a fun­ci­onar»

Se os vín­culos pre­cá­rios, sa­lá­rios baixos, ho­rá­rios des­re­gu­lados, entre ou­tros fac­tores, eram já uma re­a­li­dade na vida la­boral de mi­lhões de pes­soas, a epi­demia da COVID-19 apenas veio adensar e pi­orar a lista de pro­blemas en­fren­tados pelos tra­ba­lha­dores por­tu­gueses.

Para toda a acção existe uma re­acção, e o mesmo se aplica ao mundo do tra­balho: muita tem sido a ac­ti­vi­dade rei­vin­di­ca­tiva le­vada a cabo pelos sin­di­catos e pelos tra­ba­lha­dores. Assim como muitas têm sido as pro­postas co­lo­cadas à dis­cussão pelo PCP.

Di­reitos não estão em qua­ren­tena

Coube a Paulo Rai­mundo, membro do Se­cre­ta­riado do Co­mité Cen­tral do PCP, ini­ciar a sessão e apre­sentar os quase dez mem­bros que par­ti­ci­param na dis­cussão.

«Se é certo que vi­vemos tempos de grande com­ple­xi­dade e de in­cer­teza em re­sul­tado da epi­demia da COVID-19 (…), não é menos ver­dade que a par deste vírus en­fren­tamos um outro, também ele de di­men­sões e con­sequên­cias im­pre­vi­sí­veis, o vírus do ataque aos di­reitos dos tra­ba­lha­dores e do au­mento da ex­plo­ração», co­meçou por dizer.

Uma vez mais, são os tra­ba­lha­dores e as po­pu­la­ções, as prin­ci­pais ví­timas de todo o tipo de abusos contra os seus di­reitos: «mais de um mi­lhão de tra­ba­lha­dores em lay-off, mi­lhares de novos de­sem­pre­gados, im­po­sição de fé­rias for­çadas, corte nos sa­lá­rios, des­re­gu­la­men­tação dos ho­rá­rios de tra­balho, bancos de horas, vi­o­lação das mais ele­men­tares normas de se­gu­rança e hi­giene no tra­balho, pres­sões, chan­tagem, im­po­sição do medo», enu­merou o di­ri­gente co­mu­nista.

«Não mi­ni­mi­zamos a si­tu­ação di­fícil que, em par­ti­cular as micro, pe­quenas e mé­dias em­presas en­frentam e o es­forço que estão a fazer», afirmou o di­ri­gente, acres­cen­tando, no en­tanto, que essa não é a «re­a­li­dade das grande e lu­cra­tivas em­presas».

Antes do co­meço da dis­cussão, Paulo Rai­mundo ainda des­tacou quatro dos as­pectos que o PCP con­si­dera im­por­tantes no quadro da ac­tual si­tu­ação po­lí­tica e so­cial.

Em pri­meiro lugar, o PCP con­si­dera que «me­didas e al­te­ra­ções na le­gis­lação la­boral apre­sen­tadas como ino­va­doras e mo­dernas, mais não são do que ins­tru­mentos de pre­ca­ri­zação e de ataque aos di­reitos». Os tra­ba­lha­dores en­qua­drados pelo pe­ríodo ex­pe­ri­mental de tra­balho, uma das al­te­ra­ções mais re­centes na lei la­boral, foram os pri­meiros a ser des­pe­didos.

O se­gundo as­pecto prende-se com o com­pro­vado papel es­tru­tu­rante e de­ci­sivo dos tra­ba­lha­dores na so­ci­e­dade e na di­na­mi­zação eco­nó­mica. São os tra­ba­lha­dores que ga­rantem que o País con­tinue a fun­ci­onar.

O ter­ceiro as­pecto prende-se com os ata­ques aos sa­lá­rios e ren­di­mentos dos tra­ba­lha­dores,os quais para além de pro­fun­da­mente in­justos, são al­ta­mente ne­ga­tivos para o de­sen­vol­vi­mento do País.

Por úl­timo, Paulo Rai­mundo afirmou que os únicos obs­tá­culos sé­rios aos ob­jec­tivos do pa­tro­nato são a luta e re­sis­tência dos tra­ba­lha­dores, a acção do mo­vi­mento sin­dical uni­tário e o papel de­ter­mi­nante do PCP.

Não es­tamos todos no mesmo barco

De­pois da de­cla­ração ini­cial, Paulo Rai­mundo abriu a dis­cussão aos pre­sentes. Ana Oli­veira, eco­no­mista, foi a pri­meira a in­tervir. Foi-lhe di­ri­gida uma questão acerca de uma ex­pressão que tem vindo a ge­ne­ra­lizar cada vez mais: es­tamos todos no mesmo barco?

«Grandes em­presas e micro pe­quenas e mé­dias em­presas (PME) não estão todas no mesmo barco», não de­morou Ana Oli­veira a res­ponder. «As PME, em Por­tugal, re­pre­sentam 99.7 por cento do nú­mero total das em­presas que temos. As grandes em­presas são pouco mais de mil, mas ar­re­cadam quase 50 por cento do lucro pro­du­zido em Por­tugal», afirmou a eco­no­mista. Os custos com tra­ba­lha­dores nestas grandes em­presas equi­valem a pouco mais de 10 por cento, no en­tanto foram as pri­meiras a re­querer o lay off, sendo que 45 por cento delas já o fi­zeram.

Se­gundo a eco­no­mista «tra­ba­lha­dores e ca­pi­ta­listas também não estão de todo no mesmo barco». «His­to­ri­ca­mente», afirmou, «em crises no pas­sado de Por­tugal, os tra­ba­lha­dores nunca so­freram da mesma forma que o ca­pital».

­­Hélder Guer­reiro, da Co­missão de Tra­ba­lha­dores da Pe­trogal, foi o pró­ximo a usar da pa­lavra, apro­vei­tando para ex­planar a cor­re­lação entre a pri­va­ti­zação e o de­te­ri­o­ra­mento das con­di­ções de tra­balho. Pedro Car­valho, di­ri­gente sin­dical, mas re­cen­te­mente des­pe­dido da Mar­tifer, expôs as dra­má­ticas si­tu­a­ções de in­cer­teza em que os tra­ba­lha­dores la­boram, assim como a per­se­guição re­a­li­zada pelas ad­mi­nis­tra­ções aos di­ri­gentes sin­di­cais.

Val­demar Pal­mela re­latou os des­pe­di­mentos sel­va­gens que têm sido le­vados a cabo no parque in­dus­trial da Auto-Eu­ropa, onde tra­balha. Luís Mestre, tra­ba­lhador na Iberol, também re­latou as ten­ta­tivas por parte da di­recção da em­presa em au­mentar a carga ho­rária de tra­balho para 12 horas diá­rias.

Rui Hi­gino, di­ri­gente sin­dical e tra­ba­lhador no Grupo Na­vi­gator, e Ma­nuel Bravo, di­ri­gente sin­dical da Fi­e­qui­metal, re­la­taram, por outro lado, os su­cessos al­can­çadas pela re­sis­tência e a luta dos tra­ba­lha­dores or­ga­ni­zados nos vá­rios lo­cais de tra­balho.

Ana Pires, membro da Co­missão exe­cu­tiva da CGTP-IN, de­dicou uma parte das suas pa­la­vras ao 1.º de Maio e às ce­le­bra­ções que este ano to­marão ou­tros con­tornos.

Pro­posta do PCP

Diana Fer­reira, de­pu­tada do PCP na As­sem­bleia da Re­pú­blica (AR) eleita pelo cír­culo elei­toral do Porto, também par­ti­cipou na au­dição: «Ao longo destas se­manas temos tido exem­plos bas­tante claros de até onde os pa­trões estão dis­postos a ir nos atro­pelos la­bo­rais», co­meçou por afirmar. «Apro­vei­tando qual­quer si­tu­ação para re­tirar e ig­norar di­reitos, fi­cando também bem claro os opor­tu­nismos e os apro­vei­ta­mentos que estão a ter lugar a pre­texto da si­tu­ação de pan­demia que vi­vemos no País», con­ti­nuou.

«O PCP tem tido também na AR, uma in­ter­venção muito per­sis­tente neste con­texto, de­nun­ci­ando si­tu­a­ções, re­jei­tando todos os atro­pelos e re­pu­di­ando os apro­vei­ta­mentos e opor­tu­nismos dos quais os pa­trões têm sido os grandes pro­ta­go­nistas», ga­rantiu a de­pu­tada.

Foi o PCP que, com a suas pro­postas, con­se­guiu ga­rantir al­guma pro­tecção aos tra­ba­lha­dores, como no im­pe­di­mento do corte de água, da elec­tri­ci­dade, do gás ou de co­mu­ni­ca­ções. Também foi graças ao PCP que os tra­ba­lha­dores dos equi­pa­mentos so­ciais, como os lares de idosos, pas­saram a ser con­si­de­rados tra­ba­lha­dores es­sen­ciais. De igual forma também foi o PCP que ga­rantiu a pro­tecção da ha­bi­tação e o alar­ga­mento da ga­rantia de apoios ali­men­tares para cri­anças do es­calão B.

***

«As grandes em­presas têm-se apro­vei­tado do cheque em branco do Go­verno para au­mentar lu­cros».

Ana Oli­veira

«A na­ci­o­na­li­zação da Pe­trogal cumpre a am­bição dos tra­ba­lha­dores de terem me­lhores con­di­ções e a am­bição de termos um país mais de­sen­vol­vido».

Hélder Guer­reiro

 

«O que es­tamos a viver no sector do tra­balho do nosso País é algo com­ple­ta­mente sel­vagem e ver­go­nhoso».

Pedro Car­valho

 

«Não podem ser os tra­ba­lha­dores a pa­garem a crise eco­nó­mica e sa­ni­tária com a perda de em­prego e re­dução dos seus ren­di­mentos».

Val­demar Pal­mela

 

«Nas em­presas onde os tra­ba­lha­dores estão or­ga­ni­zados, onde existe es­tru­tura sin­dical e onde os di­ri­gentes sin­di­cais estão pre­sentes é pos­sível travar os in­tentos do pa­tro­nato».

Rui Hi­gino

 

«Temos este prin­cípio: em todas as em­presas em que há ac­ti­vi­dade la­boral tem de haver ac­ti­vi­dade sin­dical».

Ma­nuel Bravo

 

«A di­recção da em­presa disse aos tra­ba­lha­dores que uma vez que tinha sido de­cre­tado es­tado de emer­gência, a em­presa podia fazer o que qui­sesse e assim tentou im­ple­mentar um ho­rário de 12 horas».

Luís Mestre

 

«Para aqueles que sempre pro­cu­raram con­di­ci­onar Abril, Maio e a luta dos tra­ba­lha­dores, a nossa res­posta é a mesma de sempre: uma res­posta de in­ter­venção, de acção, de luta, de es­cla­re­ci­mento dos tra­ba­lha­dores e do povo no sen­tido de me­lhoria das suas con­di­ções».

Ana Pires

 



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