Durval de Noronha
Partido Comunista do Brasil

«O Estado passou a intimidar o povo»

Con­fron­tado com uma agenda re­a­ci­o­nária e fas­ci­zante, o Par­tido Co­mu­nista do Brasil (PCdoB) pro­cura re­sistir num con­texto ex­tre­ma­mente di­fícil em que avulta a cam­panha de ma­ni­pu­lação, medo e in­ti­mi­dação das massas, ex­plicou ao Avante! Durval de No­ronha.

A forma como o go­verno bra­si­leiro tem li­dado com o co­ro­na­vírus é um dos pi­ores exem­plos, talvez só mesmo su­pe­rado pelos EUA. Há essa per­cepção entre o povo bra­si­leiro?

Uma pes­quisa re­cente in­di­cava que 70 por cento da po­pu­lação re­pudia, con­dena ou abo­mina a con­dução da questão da pan­demia de COVID-19 pelo go­verno fe­deral.

Mas essa per­cepção tem-se tra­du­zido em pro­testo?

Com a ins­tau­ração do Es­tado po­li­cial, o Go­verno tem in­ti­mi­dado as ins­ti­tui­ções – le­gis­la­tivas, ju­di­ciais, neste caso até mesmo o Su­premo Tri­bunal Fe­deral. Se isso até certo ponto in­co­moda os ou­tros po­deres, cer­ta­mente in­ti­mida a nação.

As pes­soas lêem no­tí­cias sobre ma­ni­fes­ta­ções mas, ques­ti­o­nadas pela co­mu­ni­cação so­cial, não ex­pressam opi­nião sobre elas. Já em redes so­ciais como o What­sApp, não se abstêm tanto e ma­ni­festam apoio ao pro­testo e re­púdio por Bol­so­naro.

Esse é um dos efeitos da cam­panha do medo?

Claro. O povo tem medo. Existe uma agenda e prá­ticas fas­cistas por parte do go­verno, que se traduz no ge­no­cídio das co­mu­ni­dades in­dí­genas, na li­qui­dação de jo­vens ne­gros nas fa­velas, cor­tiços e bairros po­bres. Através das po­lí­cias mi­li­tares, o Es­tado passou a in­ti­midar o povo, que mantém me­mória da di­ta­dura mi­litar. Assim, muitas pes­soas pre­ferem omitir a sua opi­nião.

Creio que boa parte da classe média, a qual foi de­ter­mi­nante na eleição de Bol­so­naro, tem hoje per­cepção da­quilo para o que con­tri­buiu. Porém, ainda se re­trai face a ele­mentos fas­cistas, cri­mi­nosos, ge­no­cidas que estão a emergir na so­ci­e­dade.

A to­mada do poder por Bol­so­naro e agora a crise sa­ni­tária agra­varam as de­si­gual­dades so­ciais, fi­zeram re­tro­ceder o Brasil re­la­ti­va­mente aos avanços re­gis­tados com os go­vernos Lula e Dilma?

Sem dú­vida. Há de­sem­prego mas­sivo, cortes sa­la­riais per­mi­tidos pelo go­verno, não se pro­te­geram ga­ran­tias so­ciais que per­mi­tiam ao povo so­bre­viver com al­guma dig­ni­dade. Não sa­bemos onde esta si­tu­ação nos vai con­duzir nem qual a sua ex­tensão exacta, mas con­si­de­ramos que pode ser muito grave.

Essa agenda re­ac­ci­o­nária do go­verno Bol­so­naro tem no ter­reno uma tropa de choque e está in­ti­ma­mente li­gada aos in­te­resses do im­pe­ri­a­lismo no Brasil. Como se de­sen­volve a res­posta do mo­vi­mento po­pular?

A agenda re­ac­ci­o­nária foi im­posta por um golpe de Es­tado de­sen­ca­deado a partir do ex­te­rior e da cor­rupção do poder ju­di­ciário. Esse golpe cor­res­pondeu aos in­te­resses das mul­ti­na­ci­o­nais, so­bre­tudo do sector fi­nan­ceiro na­ci­onal e in­ter­na­ci­onal, que con­trola a co­mu­ni­cação so­cial. Esta formou a opi­nião das massas.

Os apo­lo­gistas de sempre de Bol­so­naro estão entre as qua­dri­lhas de neo-pen­te­cos­tais, cujo centro de di­recção se en­contra também nos EUA. São ban­didos or­ga­ni­zados com ór­gãos de co­mu­ni­cação so­cial po­de­ro­sís­simos, que captam apoio for­ne­cendo bens bá­sicos de so­bre­vi­vência, mi­nando assim a cons­ci­ência so­cial.

Nesse con­texto, como está a agir o Par­tido Co­mu­nista do Brasil?

A si­tu­ação é muito di­fícil. Não dei­xamos, con­tudo, de de­nun­ciar e de pro­curar elevar a acção rei­vin­di­ca­tiva, con­ju­gada com ini­ci­a­tivas par­la­men­tares que cor­res­pondam às ne­ces­si­dades e an­seios po­pu­lares.

No Par­tido man­temos a aposta na es­cola de qua­dros e numa linha de tra­balho vol­tada para os jo­vens, com bons re­sul­tados entre os es­tu­dantes.




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