A importância do Salário Mínimo Nacional

Duarte Alves

Os sa­lá­rios baixos levam a que muitos em­po­breçam a tra­ba­lhar

Em 2021, o Sa­lário Mí­nimo Na­ci­onal (SMN) au­men­tará 30 euros, para os 665. Este au­mento, acima do que tinha sido ini­ci­al­mente con­si­de­rado pelo Go­verno, é in­se­pa­rável da luta dos tra­ba­lha­dores e da in­ter­venção do PCP, em­bora não cor­res­ponda à ne­ces­si­dade de au­mento do seu valor para os 850 euros, a breve trecho.

Em torno do SMN, surgem li­nhas ar­gu­men­ta­tivas lan­çadas pelo grande pa­tro­nato e pelas suas cor­reias de trans­missão me­diá­ticas, que im­porta com­bater.

1. SMN e a sua função so­cial

Na dis­cussão pú­blica sobre o SMN, é muitas vezes omi­tida qual­quer pers­pec­tiva que aborde a função so­cial do SMN, os seus im­pactos na vida de quem tra­balha e por ele é abran­gido. In­vi­si­bi­liza-se a si­tu­ação so­cial por que passam mi­lhares de tra­ba­lha­dores que, com baixos sa­lá­rios, não con­se­guem fazer face ao custo de vida. Ig­nora-se que um em cada 10 tra­ba­lha­dores em­po­brece a tra­ba­lhar. A função so­cial do SMN, de­fi­nida na Cons­ti­tuição, é es­que­cida – e não por acaso – do de­bate pú­blico.

2. SMN e sa­lário médio

Re­cor­ren­te­mente ou­vimos que «mais do que o sa­lário mí­nimo, im­porta au­mentar os sa­lá­rios mé­dios, que estão a ser ab­sor­vidos pelos au­mentos do SMN» como ar­gu­mento para não au­mentar o SMN. Nor­mal­mente, dito pelos mesmos que con­tra­riam quais­quer me­didas que pro­movam au­mentos reais dos sa­lá­rios me­di­anos, como a re­vo­gação das normas gra­vosas da le­gis­lação la­boral, par­ti­cu­lar­mente a ca­du­ci­dade da con­tra­tação co­lec­tiva.

Sim, é pre­ciso um au­mento geral dos sa­lá­rios, o que exige um au­mento do SMN que im­pul­sione os sa­lá­rios me­di­anos e uma le­gis­lação la­boral que ga­ranta ins­tru­mentos para va­lo­rizar todos os pa­ta­mares sa­la­riais.

3. SMN e pro­du­ti­vi­dade

«Pri­meiro é pre­ciso au­mentar a pro­du­ti­vi­dade, de­pois sim pode haver au­mentos sa­la­riais.» A pro­du­ti­vi­dade do tra­balho de­pende do nível de in­cor­po­ração tec­no­ló­gica da eco­nomia. Ao con­trário do que trans­pa­rece de al­gumas de­cla­ra­ções, a baixa pro­du­ti­vi­dade não se trata de um menor «em­penho» dos tra­ba­lha­dores… Pelo con­trário, de­corre de um mo­delo eco­nó­mico ba­seado em baixos sa­lá­rios e baixa in­cor­po­ração tec­no­ló­gica, que tem sido im­posto em Por­tugal pelo ca­pital, go­vernos e União Eu­ro­peia.

A ideia de que «pri­meiro vem a pro­du­ti­vi­dade, de­pois os sa­lá­rios» ig­nora a di­nâ­mica da eco­nomia. Mesmo eco­no­mistas que estão longe de de­fender rup­turas com o sis­tema re­co­nhecem que, pelo con­trário, é o au­mento dos sa­lá­rios que in­cen­tiva a me­lho­rias na pro­du­ti­vi­dade. Isto porque sa­lá­rios mais ele­vados pro­movem que os in­ves­ti­mentos se di­rijam a sec­tores com maior in­cor­po­ração tec­no­ló­gica, em vez de sec­tores que, por serem pouco pro­du­tivos, só so­bre­vivem à custa de baixos sa­lá­rios.

4. SMN, em­prego e de­sen­vol­vi­mento eco­nó­mico

A velha e es­ta­fada tese de que o au­mento do SMN pro­move fa­lên­cias e de­sem­prego já foi des­men­tida à exaustão, mas nem por isso deixa de ser usada para com­bater qual­quer pers­pec­tiva de au­mento do SMN.

Basta to­marmos como exemplo a re­a­li­dade na­ci­onal nos úl­timos anos, em que os au­mentos (ainda que in­su­fi­ci­entes) do SMN não ori­gi­naram ne­nhuma quebra no em­prego, antes pelo con­trário.

So­bre­tudo para as micro e pe­quenas em­presas, os custos com energia, com­bus­tí­veis, cré­ditos, se­guros, etc. são muito su­pe­ri­ores aos custos com os sa­lá­rios. Ao mesmo tempo, estas em­presas pre­cisam que haja ren­di­mento dis­po­nível na eco­nomia para au­mentar a pro­cura e assim ven­derem os seus pro­dutos e ser­viços.

***

A luta pelo au­mento do SMN para os 850 euros in­sere-se no ca­minho para com­bater a po­breza no tra­balho, para dar res­posta à si­tu­ação so­cial que en­fren­tamos, para di­na­mizar a eco­nomia e as­se­gurar um rumo de pro­gresso e de­sen­vol­vi­mento so­be­rano do País.




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