Vitória da luta na Kellogg’s

António Santos

11 semanas em greve: foi este o preço da vitória dos trabalhadores da Kellogg’s nos Estados do Michigan, Nebrasca, Pensilvânia e Tennessee. O acordo conquistado pela luta prevê aumentos remuneratórios para todos os 1400 operários, o fim o sistema de discriminação a duas velocidades e o compromisso de não encerrar qualquer fábrica até 2026.

«Há um ano chamavam-nos heróis», explicou ao The Guardian Trevor Bidelman, presidente do BCTGM Local 3-G, o sindicato do sector, «Trabalhámos durante a pandemia, sete dias por semana, 16 horas por dia. Hoje já não nos chamam heróis, mas continuamos a trabalhar 16 horas por dia (…) Nem temos fins-de-semana a sério. Simplesmente trabalhamos sete dias por semana, às vezes 100, 130 dias seguidos. Durante 28 dias as máquinas não param. Durante os outros estamos a limpá-las. As máquinas são mais bem tratadas do que os trabalhadores».

A verdade é que, apesar da pandemia, a Kellogg’s bateu recordes de lucros em 2020: mais de 1,25 mil milhões de dólares, um aumento de 25 por cento em relação ao ano passado. Na esteira destes resultados históricos, o presidente-executivo da Kellogg’s, Steve Cahillane que, em 2020, já tinha levado para casa 11,7 milhões de dólares, deverá receber um proporcionalíssimo aumento de 25 por cento.

O mesmo princípio não se aplica, todavia, aos produtores da riqueza. Em sentido inverso, os patrões chegaram à mesa das negociações exigindo a expansão de um sistema de salários a duas velocidades (two-tier system) em que os novos trabalhadores entram progressivamente com salários mais baixos e menos direitos do que os trabalhadores mais antigos, que preservam os seus direitos e níveis salariais até à reforma: uma estratégia conhecida para dividir os trabalhadores e transferir lentamente os rendimentos do trabalho para o capital.

O ardil saiu furado quando, a 7 de Dezembro, já corriam nove semanas de greve, a maioria dos trabalhadores votou contra a proposta patronal. Em declarações à Democracy Now, Kevin Bradshaw, operário da Kellogg’s em greve, explicava porquê: «Estamos a lutar por salários iguais e direitos iguais. Se aceitássemos o que a empresa está a dizer, mais trabalhadores não teriam as mesmas oportunidades que eu tenho, de me reformar com a mesma pensão, os mesmos direitos, o mesmo seguro, a mesma capacidade de cuidar da minha família.»

A resposta da Kellogg’s ao chumbo da proposta foi a ameaça de transferir a produção para o México e a tentativa de substituir os trabalhadores grevistas. Se a ameaça não surtiu o efeito esperado nos trabalhadores, que mantiveram a greve, foi graças à solidariedade que a tentativa de os substituir não passou disso mesmo: quando a Kellogg’s colocou anúncios na Internet para contratar fura-greves, milhares de pessoas organizaram-se espontaneamente no Reddit e no TikTok para entupir o sistema com dezenas de milhares de candidaturas falsas.

A onda de solidariedade atingiu níveis tão expressivos que o próprio presidente dos EUA, Joe Biden, sentiu necessidade de se posicionar, condenando a substituição de trabalhadores em greve sem, contudo, tomar qualquer acção. A classe trabalhadora só pode contar consigo mesma.




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