Cultura - Um enorme potencial transformador e emancipador

Jorge Pires (Membro da Comissão POlítica)

“A Cul­tura re­pre­senta um po­ten­cial e um valor in­subs­ti­tuível de de­sen­vol­vi­mento”

No pas­sado dia 15 de Maio, o PCP re­a­lizou o 2.º En­contro Na­ci­onal sobre Cul­tura, no de­correr do qual foi abor­dado o es­tado da Cul­tura em Por­tugal e apon­tado um con­junto de pro­postas, cuja con­cre­ti­zação, per­mi­tirá avançar sig­ni­fi­ca­ti­va­mente na de­mo­cra­ti­zação da Cul­tura.

In­te­gram hoje a es­fera cul­tural, como foi si­na­li­zado no En­contro, ele­mentos de enorme po­ten­cial trans­for­mador e eman­ci­pador e também po­de­rosos fac­tores de ali­e­nação e do­mi­nação de classe.

Não é por acaso, que após a Re­vo­lução de Abril, em que se ve­ri­fi­caram sig­ni­fi­ca­tivas mu­danças na Cul­tura em Por­tugal, os mais de qua­renta anos de po­lí­tica de di­reita que se se­guiram, mer­gu­lharam a Cul­tura numa pro­funda crise com o re­gisto de uma acen­tuada eli­ti­zação, pri­va­ti­zação e mer­can­ti­li­zação, li­mi­tando assim o acesso, por parte dos tra­ba­lha­dores e do povo, aos bens e ser­viços cul­tu­rais.

A se­cun­da­ri­zação a que a Cul­tura tem sido su­jeita, não pode deixar de ser as­so­ciada a um pro­jecto ide­o­ló­gico que visa pôr em causa o im­por­tante papel que ela tem, con­si­de­rada em sen­tido lato, na for­mação das cons­ci­ên­cias, no con­tri­buto in­subs­ti­tuível que dá na for­mação do Homem que se quer pre­pa­rado para in­tervir na so­ci­e­dade aos vá­rios ní­veis, na noção que temos de «cul­tura in­te­gral do in­di­víduo» for­mu­lada por esse grande in­te­lec­tual co­mu­nista que foi Bento de Jesus Ca­raça.

Na Con­fe­rência que re­a­lizou em 1933 sobre «A Cul­tura In­te­gral do In­di­víduo – Pro­blema Cen­tral do Nosso Tempo», Bento Jesus Ca­raça de­fende a ideia de que é com uma so­ci­e­dade de ho­mens cultos e ín­te­gros que se pode as­se­gurar que todos serão li­vres, iguais e so­li­dá­rios, com a Cul­tura a as­sumir uma cen­tra­li­dade fun­da­mental para a vida do co­lec­tivo. Uma ideia que pas­sados 90 anos mantém toda a ac­tu­a­li­dade.

Como foi re­fe­rido no En­contro, para o PCP, «a Cul­tura re­pre­senta um po­ten­cial e um valor in­subs­ti­tuível de de­sen­vol­vi­mento, de li­ber­tação e eman­ci­pação in­di­vi­dual, so­cial e na­ci­onal». Por outro lado, não nos de­vemos es­quecer que a de­mo­cra­ti­zação da so­ci­e­dade é, um factor de so­be­rania na­ci­onal, questão cen­tral nos dias que correm.

Ao longo dos anos, uma das prin­ci­pais li­nhas de des­va­lo­ri­zação da Cul­tura tem pas­sado pela des­res­pon­sa­bi­li­zação do Es­tado e pelo sub­fi­nan­ci­a­mento, com con­sig­na­ções que nos úl­timos anos tem va­riado entre os 0,1% e os 0,3% do Or­ça­mento do Es­tado. Para a Cul­tura, um valor tão baixo, sig­ni­fica as­fixiá-la do ponto de vista fi­nan­ceiro e ao mesmo tempo cen­surar muito tra­balho de grande qua­li­dade pro­du­zido pelos nossos ar­tistas, im­pe­dindo desta forma que esse tra­balho possa ser fruído pelos tra­ba­lha­dores e pelo nosso povo. Este é um sinal inequí­voco da falta de von­tade po­lí­tica que marca a ati­tude de su­ces­sivos go­vernos em re­lação ao prin­cípio cons­ti­tu­ci­onal da de­mo­cra­ti­zação da Cul­tura.

Al­guns dos arautos da po­lí­tica de di­reita na Cul­tura são de­fen­sores da tese de que ao Es­tado apenas in­cubem res­pon­sa­bi­li­dades nas ques­tões do pa­tri­mónio e mesmo estas par­ti­lhadas com o sector pri­vado, de que é exemplo o Pro­grama Re­vive. A po­lí­tica de Cul­tura, que o PCP de­fende, atribui ao Es­tado um papel e uma res­pon­sa­bi­li­dade pú­blica de­ter­mi­nantes nessa área, en­ten­didos como factor de ga­rantia da li­ber­dade de cri­ação ar­tís­tica, pres­su­posto da li­ber­dade de fruição.

«A de­mo­cra­ti­zação no acesso à fruição e a de­mo­cra­ti­zação no acesso à cri­ação exigem uma de­ci­dida e clara pri­o­ri­dade or­ça­mental e po­lí­tica e uma res­pon­sa­bi­li­zação de­ter­mi­nante do Es­tado.»

Ob­jec­tivo con­subs­tan­ciado na pro­posta que o Par­tido apre­senta ao povo por­tu­guês de cri­ação de um Ser­viço Pú­blico de Cul­tura, que mais do que uma agre­gado e fun­ci­o­na­mento ar­ti­cu­lado e sus­ten­tado de um con­junto de es­tru­turas, ins­ti­tui­ções, en­ti­dades, re­cursos e meios, é uma pro­posta de vi­ragem nas po­lí­ticas da cul­tura.

O com­pro­misso do Par­tido é de mo­bi­lizar os ho­mens e as mu­lheres da Cul­tura na luta pela de­fesa dos va­lores cul­tu­rais e ar­tís­ticos. Uma luta que, como re­feriu Álvaro Cu­nhal, «é uma ta­refa dos ar­tistas mas é também ta­refa comum da classe ope­rária, dos tra­ba­lha­dores, de todos os de­mo­cratas».



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