Mais força aos trabalhadores transformar o sonho em vida

Álvaro Cu­nhal faria 109 anos a 10 de No­vembro. O seu Par­tido evocou-o a partir do va­lioso le­gado que deixou acerca da «im­por­tância da in­ter­venção e da luta dos tra­ba­lha­dores no pro­cesso de trans­for­mação pro­gres­sista de uma so­ci­e­dade que con­tinua mar­cada pela ex­plo­ração ca­pi­ta­lista e por ina­cei­tá­veis in­jus­tiças so­ciais».

«A força dos tra­ba­lha­dores está na sua uni­dade e or­ga­ni­zação»

A ini­ci­a­tiva foi re­a­li­zada faz hoje uma se­mana, no au­di­tório do Sport Ope­rário Ma­ri­nhense, na Ma­rinha Grande, sob o lema «Mais força aos tra­ba­lha­dores – con­quistar di­reitos, trans­formar o sonho em vida». E de­correu olhando «o pas­sado e o fu­turo deste com­bate através do con­tri­buto do di­ri­gente po­lí­tico ex­pe­ri­men­tado com uma in­ter­venção im­pres­siva na vida con­tem­po­rânea que foi Álvaro Cu­nhal», como ex­plicou Je­ró­nimo de Sousa no en­cer­ra­mento.

Com efeito, pouco após as 21h00 e já de­pois de Je­ró­nimo de Sousa en­trar na sala re­pleta sob o forte aplauso dos pre­sentes, co­meçou a sessão pú­blica, que in­cluiu um mo­mento cul­tural. Pri­meiro, foi exi­bido um curto filme que passou em re­vista e en­qua­drou a Re­volta de 18 de Ja­neiro de 1934 no con­texto na­ci­onal e in­ter­na­ci­onal e do de­sen­vol­vi­mento do mo­vi­mento ope­rário e sin­dical, bem como sa­li­entou o papel do PCP, os anos da re­sis­tência ao fas­cismo, a Re­vo­lução de Abril e a re­sis­tência à contra-re­vo­lução, em par­ti­cular no que diz res­peito à in­tensa e his­tó­rica luta de classes que sempre se de­sen­rolou na Ma­rinha Grande.

Mais tarde, Je­ró­nimo de Sousa viria a lem­brar o que disse Álvaro Cu­nhal sobre a «luta e per­curso dos tra­ba­lha­dores e do povo desta terra de tra­balho»: a «Ma­rinha Grande é um nome es­crito a ouro na his­tória do mo­vi­mento ope­rário por­tu­guês».

Estas mesmas pa­la­vras de Álvaro Cu­nhal vol­ta­riam a ser lem­bradas pelo actor André Levy, que lendo um ex­certo do dis­curso de Álvaro Cu­nhal a 18 Ja­neiro de 1975, aquando da trans­la­dação dos restos mor­tais de José Gre­gório para a sua terra natal – uma das mais im­pres­si­o­nantes ma­ni­fes­ta­ções po­pu­lares que se as­sistiu na Ma­rinha Grande, como se re­feriu em voz-off –, citou ainda que «a Ma­rinha Grande pode or­gu­lhar-se de muitos com­ba­tentes de van­guarda que tem dado ao mo­vi­mento ope­rário», mas o «ca­ma­rada José Gre­gório é, ao lado de ou­tros nomes glo­ri­osos, um sím­bolo das qua­li­dades e tra­di­ções do pro­le­ta­riado da Ma­rinha Grande e do papel da sua van­guarda re­vo­lu­ci­o­nária – o PCP».

André Levy vol­taria ao palco para de­clamar o poema «A Lâm­pada Ma­rinha», de Pablo Ne­ruda, de­di­cado a Álvaro Cu­nhal e no âm­bito de uma cam­panha in­ter­na­ci­onal pela sua li­ber­tação do cár­cere fas­cista onde se en­con­trava, bem como a todos os an­ti­fas­cistas por­tu­gueses.

Além de André Levy, foram su­bindo ao palco os mú­sicos Sara Vidal e Ro­gério Pires, que in­ter­pre­taram «Os Vam­piros», «Traz outro amigo também» e «Maio, Ma­duro Maio», de Zeca Afonso, e que, no final, se di­ri­giram ao Se­cre­tário-geral do PCP não es­con­dendo grata e sen­tida emoção.

Hoje como ontem

No que a in­ter­ven­ções po­lí­ticas diz res­peito, im­porta ainda re­levar as pro­fe­ridas por Etel­vina Ri­beiro, membro do Co­mité Cen­tral (CC) do PCP, e An­tónio Luís Santos, da Di­recção da Or­ga­ni­zação Re­gi­onal de Leiria (Dorlei) do PCP. A pri­meira as­si­na­lando as he­roicas lutas do pro­le­ta­riado ma­ri­nhense, em es­pe­cial dos ope­rá­rios vi­dreiros – dos der­ra­deiros anos da di­ta­dura fas­cista aos go­vernos de má me­mória de PS, PSD e CDS, so­zi­nhos ou juntos aos pares; das cargas po­li­ciais or­de­nadas em de­fesa dos in­te­resses do pa­tro­nato, às mar­chas pelo pa­ga­mento dos sa­lá­rios em atraso, em de­fesa do em­prego, da pro­dução vi­dreira, à mas­siva so­li­da­ri­e­dade sempre con­cre­ti­zada pelo povo da Ma­rinha Grande. O se­gundo, si­na­li­zando as lutas que hoje de­correm e as ra­zões que as sus­tentam; as que estão con­vo­cadas e para as quais im­porta mo­bi­lizar e as justas re­cla­ma­ções que urge dar a co­nhecer; as po­ten­ci­a­li­dades de de­sen­vol­vi­mento da acção rei­vin­di­ca­tiva, da uni­dade e or­ga­ni­zação dos tra­ba­lha­dores e de re­forço do PCP entre estes, nas em­presas e lo­cais de tra­balho.

Mas a in­ter­venção prin­cipal e a mais aguar­dada era a de Je­ró­nimo de Sousa. De­pois de serem cha­mados ao palco os mem­bros dos or­ga­nismos exe­cu­tivos da Dorlei, Luís Cai­xeiro, do CC e res­pon­sável pela Or­ga­ni­zação, Ângelo Alves, da Co­missão Po­lí­tica, e Mar­ga­rida Bo­telho, do Se­cre­ta­riado do CC, o Se­cre­tário-geral do Par­tido di­rigiu-se à tri­buna.

«En­con­tramo-nos hoje, aqui, na Ma­rinha Grande, para evocar e ho­me­na­gear a fi­gura ímpar de Álvaro Cu­nhal no dia da pas­sagem de mais um ani­ver­sário do seu nas­ci­mento», co­meçou por dizer, antes de passar à questão subs­tan­tiva: a ac­tu­a­li­dade de dar mais força aos tra­ba­lha­dores para con­quis­tarem di­reitos e per­correm o ca­minho da trans­for­mação do sonho em vida, o con­tri­buto de Álvaro Cu­nhal no pas­sado e para o fu­turo desse com­bate.

Je­ró­nimo de Sousa re­a­firmou ainda que «a força dos tra­ba­lha­dores está na sua uni­dade e or­ga­ni­zação e o grande ca­pital sabe que assim é. Por isso, a ba­talha pela uni­dade dos tra­ba­lha­dores, no quadro de uma justa ori­en­tação, in­de­pen­dente dos in­te­resses do ca­pital, con­frontou-se em todos os tempos com a acção em­pe­nhada da­queles que apostam na in­ten­si­fi­cação da ex­plo­ração e na eter­ni­zação do sis­tema que a serve – o sis­tema ca­pi­ta­lista».

«Esse sis­tema pro­dutor de in­jus­tiças e de­si­gual­dades que in­veste re­cursos enormes, in­cluindo em meios de in­to­xi­cação ide­o­ló­gica, vi­sando a di­visão dos tra­ba­lha­dores, para as­se­gurar a sua pró­pria so­bre­vi­vência».

À luta!

Exem­plos disso mesmo, pros­se­guiu o di­ri­gente co­mu­nista, re­velam-se quando atira «tra­ba­lha­dores do pri­vado contra o pú­blico, os novos contra os mais ve­lhos, os pre­cá­rios contra os que con­quis­taram o di­reito a um em­prego es­tável, apon­tados como pri­vi­le­gi­ados, os ho­mens contra as mu­lheres, e in­vestem enormes for­tunas para di­vidir as suas or­ga­ni­za­ções de classe».

De resto, «a acção di­vi­si­o­nista tem em Por­tugal um longo his­to­rial, as­su­mindo as mais va­ri­adas formas e mo­bi­li­zando po­de­rosos re­cursos», alertou também o Se­cre­tário-geral do PCP, para quem «o grande ca­pital mo­no­po­lista en­con­trou sempre nas forças po­lí­ticas que pro­mo­veram o pro­cesso de re­cu­pe­ração do seu do­mínio per­dido com a Re­vo­lução de Abril, os seus mais so­lí­citos ali­ados – os Go­vernos do PS, PSD e CDS, a que se juntam hoje a IL e o Chega».

Je­ró­nimo de Sousa acusou, de­pois, o PS, «nestes úl­timos anos», sempre acom­pa­nhado «pelas forças re­ac­ci­o­ná­rias e re­tró­gradas de PSD, CDS, IL e Chega», de «de­mons­trar a na­tu­reza de classe das suas de­ci­sões a favor do grande ca­pital, vi­sando a in­ten­si­fi­cação da ex­plo­ração dos tra­ba­lha­dores».

«Veja-se como passam por cima do grave pro­blema do custo de vida que está a de­gradar sa­lá­rios e pen­sões, que perdem poder de compra a um ritmo e numa di­mensão cres­cente e como re­cusam e votam contra as pro­postas do PCP para repor o poder de compra dos tra­ba­lha­dores e con­trolar preços da es­pe­cu­lação de­sen­freada dos grupos eco­nó­micos mo­no­po­listas; como em­purram para cima dos tra­ba­lha­dores no ac­tivo ou na re­forma o peso das di­fi­cul­dades, en­quanto não mexem uma palha para con­di­ci­onar e im­pedir os abusos das mul­ti­na­ci­o­nais e dos grupos eco­nó­micos».

Assim, su­blinha-se a im­por­tância da luta dos tra­ba­lha­dores e das classes e ca­madas an­ti­mo­no­po­listas em de­fesa das suas con­di­ções de vida», do­mínio no qual «Álvaro Cu­nhal deu desde sempre im­por­tantes con­tri­butos que se pro­jectam como im­por­tantes en­si­na­mentos para a nossa in­ter­venção e para a in­ter­venção dos tra­ba­lha­dores na ac­tu­a­li­dade».

Ao con­creto, «a im­por­tância de todas as lutas, mesmo das pe­quenas lutas, das lutas par­ciais para re­solver os pro­blemas vi­tais dos tra­ba­lha­dores e das massas, e não só as grandes lutas por ob­jec­tivos eco­nó­micos e po­lí­ticos», pre­cisou Je­ró­nimo de Sousa, que cha­mando a atenção que Álvaro Cu­nhal também re­alçou que «a si­tu­ação eco­nó­mica e a vida po­lí­tica por­tu­guesa não se de­cide apenas nas altas es­feras», nela «in­tervêm di­rec­ta­mente os tra­ba­lha­dores» e «as massas po­pu­lares», apro­veitou para re­a­firmar «o com­pro­misso de sempre do PCP com os in­te­resses de classe dos tra­ba­lha­dores, (…) o apelo à sua or­ga­ni­zação, uni­dade e luta», a «in­que­bran­tável de­ter­mi­nação de con­ti­nuar a per­se­guir aquele sonho mi­lenar a cuja ma­te­ri­a­li­zação Álvaro Cu­nhal en­tregou toda uma vida de com­ba­tente re­vo­lu­ci­o­nário – o sonho da cons­trução de uma so­ci­e­dade li­berta da ex­plo­ração do homem pelo homem».

Estar onde estão as massas


Abor­dando com pro­fun­di­dade o con­tri­buto de Álvaro Cu­nhal através do «es­tudo atento e ri­go­roso às con­di­ções de vida e de tra­balho das classes la­bo­ri­osas, aos seus pro­blemas e as­pi­ra­ções, à sua luta e à luta das suas or­ga­ni­za­ções, no­me­a­da­mente ao es­tudo do mo­vi­mento sin­dical no nosso País», Je­ró­nimo de Sousa des­tacou, desde logo, a con­tri­buição par­ti­cular dada «no apro­fun­da­mento e con­cre­ti­zação das ori­en­ta­ções do PCP e da in­ter­venção dos co­mu­nistas por­tu­gueses». In­ter­venção que, «desde os fi­nais dos anos vinte do sé­culo pas­sado e com Bento Gon­çalves, tra­ba­lhavam na di­na­mi­zação de um mo­vi­mento sin­dical ver­da­dei­ra­mente de classe e de massas», o qual, de resto, «aqui na Ma­rinha Grande, se havia de con­cre­tizar com a uni­fi­cação das as­so­ci­a­ções sin­di­cais de classe (…), o Sin­di­cato Na­ci­onal dos Tra­ba­lha­dores da In­dús­tria do Vidro, cons­ti­tuído em 1931 e que, não tar­daria, o fas­cismo havia de en­cerrar, des­po­le­tando o mo­vi­mento in­sur­rec­ci­onal do 18 de Ja­neiro de 1934».

Álvaro Cu­nhal se­guiu«uma linha de rumo que re­ser­vava às massas um im­pres­cin­dível e de­ter­mi­nante papel» para apontar a «via es­co­lhida da in­ter­venção do mo­vi­mento ope­rário no plano sin­dical», bem como para «ga­rantir a uni­dade da classe ope­rária».

«Uma mu­dança na ori­en­tação que se tra­duziu no aban­dono do de­sen­vol­vi­mento de sin­di­catos clan­des­tinos – a pri­meira res­posta à si­tu­ação criada com a fas­ci­zação dos sin­di­catos e que cedo se re­velou ine­ficaz – para uma de­ci­dida in­ter­venção vi­sando a to­mada, por dentro, em listas de uni­dade, dos sin­di­catos únicos e de sin­di­ca­li­zação obri­ga­tória do re­gime fas­cista – os de­no­mi­nados Sin­di­catos Na­ci­o­nais».

«Estar onde estão as massas e tra­ba­lhar com elas, e com elas agir na de­fesa dos seus in­te­resses, era a pa­lavra de ordem». Uma «nova e de­ci­dida ori­en­tação que exigia uma grande co­ragem e de­ter­mi­nação, num quadro de grande re­pressão e grandes pe­rigos, mas também de na­tu­rais in­com­pre­en­sões que foram ne­ces­sá­rias vencer, num de­bate ide­o­ló­gico, em que Álvaro Cu­nhal se em­pe­nhou de forma par­ti­cular», pros­se­guiu Je­ró­nimo de Sousa, que re­cor­dando que «isso está pa­tente no re­la­tório por si apre­sen­tado ao III Con­gresso do PCP», notou, igual­mente, que no mesmo re­la­tório, Álvaro Cu­nhal «avan­çava já a pers­pec­tiva, (...) do apro­vei­ta­mento, após o der­ru­ba­mento do fas­cismo, da base ma­te­rial e dos meios exis­tentes nos sin­di­catos na­ci­o­nais, não pre­co­ni­zando a sua dis­so­lução mas o seu apro­vei­ta­mento com a re­a­li­zação de elei­ções li­vres».

«Foi esta acer­tada e ori­ginal ori­en­tação, jun­ta­mente com a ini­ci­a­tiva di­recta do pró­prio Par­tido nas em­presas e nos campos, através do apoio e di­na­mi­zação das co­mis­sões de uni­dade - essas pre­de­ces­soras das ac­tuais Co­mis­sões de Tra­ba­lha­dores - que pos­si­bi­litou levar a cabo grandes lutas de massas, mesmo num quadro de au­sência de li­ber­dade e de grande re­pressão».

«Lutas de massas que Álvaro Cu­nhal re­fe­ren­ciava como in­dis­pen­sá­veis para apressar o der­rube do fas­cismo», já que, lem­brou ainda o Se­cre­tário-geral do PCP, como afir­mava, é nelas que «as massas ga­nham ex­pe­ri­ência, há­bitos de com­bate e de sa­cri­fício, educam-se re­vo­lu­ci­o­na­ri­a­mente, dis­põem-se cada vez mais a ac­ções enér­gicas e de­ci­didas», isto além da sua im­por­tância «para a de­fesa dos in­te­resses vi­tais dos tra­ba­lha­dores, para fazer frente à ex­plo­ração, para im­pedir a de­gra­dação das con­di­ções de vida e con­se­guirem me­lhorá-las».

«Foi a per­sis­tência na con­cre­ti­zação desta ori­en­tação que per­mitiu ao mo­vi­mento ope­rário e sin­dical, e de forma des­ta­cada à In­ter­sin­dical, ra­pi­da­mente re­co­nhe­cida como a grande cen­tral sin­dical dos tra­ba­lha­dores por­tu­gueses, dar um con­tri­buto de­ter­mi­nante no le­van­ta­mento po­pular que se se­guiu ao le­van­ta­mento mi­litar e ser uma força mo­tora da Re­vo­lução [de Abril], ga­rantir im­por­tantes me­lho­ra­mentos nas con­di­ções de vida dos tra­ba­lha­dores e lutar pela con­cre­ti­zação e re­co­nhe­ci­mento das [suas] grandes con­quistas».

«Uma justa ori­en­tação que armou os tra­ba­lha­dores com fortes ins­tru­mentos de or­ga­ni­zação e luta, ci­mentou a sua uni­dade que lhes deu a força in­dis­pen­sável para con­quistar di­reitos e trans­formar as suas vidas e a pró­pria so­ci­e­dade», con­cluiu Je­ró­nimo de Sousa.




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