A exigência de mudar de rumo e fazer justiça a quem trabalha

As op­ções do Go­verno di­rigem-se de forma clara para «servir o lado dos grandes grupos eco­nó­micos e fi­nan­ceiros e não o lado do povo e de quem vive do seu tra­balho», acusa o PCP, que in­siste não ser este o ca­minho e que «é pre­ciso outro rumo».

É pre­ciso au­mentar os sa­lá­rios, va­lo­rizar car­reiras e pro­fis­sões

Esta po­sição foi as­su­mida dia 16 pela de­pu­tada co­mu­nista Alma Ri­vera em de­cla­ração po­lí­tica pro­fe­rida em nome da sua ban­cada, fo­cada quer nos pro­blemas e di­fi­cul­dades com que se con­fronta hoje a ge­ne­ra­li­dade dos tra­ba­lha­dores e da po­pu­lação - fruto de uma po­lí­tica que mantém in­to­cados pri­vi­lé­gios e que agrava in­jus­tiças e de­si­gual­dades - quer na afir­mação de uma po­lí­tica al­ter­na­tiva que abra um fu­turo de jus­tiça so­cial e de­sen­vol­vi­mento.

A par­la­mentar do PCP es­ta­be­leceu como ponto de par­tida para a sua in­ter­venção a com­pa­ração entre a nar­ra­tiva do Go­verno do PS e a re­a­li­dade con­creta da vida das pes­soas. E con­cluiu que não bate certo uma coisa com a outra, que o con­traste é fla­grante (ver caixa). O des­fa­sa­mento situa-se so­bre­tudo entre as «ma­ra­vi­lhas» que en­chem o dis­curso dos go­ver­nantes – dado foi o exemplo do mi­nistro da Eco­nomia, que ainda há 15 dias em de­bate par­la­mentar exal­tava o au­mento do PIB, o «de­sem­penho muito bom das eco­nomia» e a «grande ca­pa­ci­dade ex­por­ta­dora» - e as di­fi­cul­dades com que se de­pa­raram no dia a dia os por­tu­gueses, «à me­dida que os preços sobem, que o valor real dos sa­lá­rios en­colhe, que as pen­sões não chegam para pagar as des­pesas, a conta da far­mácia».

A provar, aliás, que nem a eco­nomia nem o País nem a vida das pes­soas corre bem está a re­acção dos mi­lhares e mi­lhares de tra­ba­lha­dores que par­ti­ci­param no pas­sado dia 9 nas cen­tenas de ac­ções em todo o País que en­gros­saram a jor­nada de in­dig­nação e pro­testo con­vo­cada pela CGTP-IN, a que se somou, logo dois dias de­pois, a ma­ni­fes­tação dos pro­fes­sores mo­bi­li­zados pela Fen­prof com a pla­ta­forma de sin­di­catos, sem falar das lutas de ou­tros sec­tores e da po­pu­lação.

 

Ouvir o povo

Foram ainda os ecos dessas gran­di­osas ac­ções que re­vi­braram no he­mi­ciclo, através das pa­la­vras de Alma Ri­vera, com esta a re­cordar que a «men­sagem clara» que essas cen­tenas de mi­lhares de tra­ba­lha­dores en­vi­aram ao Go­verno foi no sen­tido de afirmar que «este não é o ca­minho».

«É pre­ciso outro rumo: au­mentar os sa­lá­rios, va­lo­rizar car­reiras e pro­fis­sões, com­bater o au­mento do custo de vida, con­trolar os preços, au­mentar as pen­sões», sin­te­tizou a de­pu­tada do PCP, in­ter­pre­tando o clamor po­pular que, en­fa­tizou, «tem de ser ou­vido».

Essa é uma exi­gência in­con­tor­nável se se tiver pre­sente que «há, 2,6 mi­lhões de pes­soas a viver com menos de 660 euros men­sais em Por­tugal e há quase 400 mil cri­anças na po­breza», disse Alma Ri­vera, para quem tais dados são ainda de­mons­tra­tivos de como «não es­tamos no ca­minho certo».

E por isso con­si­derou que «não pega o dis­curso de que é pre­ciso pri­meiro pro­duzir para dis­tri­buir» ou o que diz que se os sa­lá­rios au­men­tarem «vem a es­piral in­fla­ci­o­nista». Tal como «não pega» o dis­curso de que «os tra­ba­lha­dores têm de em­po­brecer e calar porque ti­vemos a pan­demia, antes o dé­fice abaixo dos 3%, agora a guerra e de­pois será outra coisa qual­quer».

Daí a rei­te­rada acu­sação ao Go­verno de que está a fa­vo­recer os grupos eco­nó­micos e fi­nan­ceiros, o que se com­prova, aliás - e este foi um dos exem­plos dados por Alma Ri­vera –, pela re­cusa da­quele em eli­minar normas gra­vosas da le­gis­lação la­boral, dei­xando a «faca e o queijo na mão do pa­tro­nato» para este «fazer chan­tagem, para blo­quear a ne­go­ci­ação co­lec­tiva, para não au­mentar sa­lá­rios».

«O que se passa é que o PS aprova uma “agenda do tra­balho digno” mas mantém as in­dig­ni­dades que estão na le­gis­lação la­boral», ver­berou Alma Ri­vera, que vê por de­trás da «des­va­lo­ri­zação dos pro­fis­si­o­nais e nos sa­lá­rios ver­go­nhosos» um claro pro­pó­sito de «des­truir de­li­be­ra­da­mente a Es­cola Pú­blica, o SNS, os ser­viços pú­blicos».

To­davia, porque «quem produz a ri­queza é quem tra­balha, são os tra­ba­lha­dores», deixou uma cer­teza: «o que irá ditar o fu­turo é a força desses tra­ba­lha­dores, a sua uni­dade, a sua de­ter­mi­nação, a sua co­ragem».

 

In­jus­tiça des­ca­rada

A de­pu­tada Alma Ri­vera levou a de­bate al­guns dados que ilus­tram de forma exem­plar a des­con­for­mi­dade entre o ce­nário que o Go­verno pinta e a re­a­li­dade con­creta da vida dos tra­ba­lha­dores e do povo.

«Temos bancos como o San­tander quase a du­plicar os lu­cros, temos a banca pri­vada a ter 4,4 mi­lhões por dia (!) en­quanto mi­lhares de fa­mí­lias estão em risco de perder a sua casa com os au­mentos de­ci­didos pelo BCE», as­si­nalou, antes de apontar esse outro caso não menos elu­ci­da­tivo: os lu­cros da Galp, que as­cen­deram a 1,104 mil mi­lhões de euros, assim ba­tendo novo re­corde, ao mesmo tempo que os preços dos com­bus­tí­veis su­biram sem freio.

Sin­to­má­tico é também o re­sul­tado da EDP, com muitos dos seus tra­ba­lha­dores em si­tu­ação de pre­ca­ri­e­dade, que apre­sentou «lu­cros obs­cenos», muito por via do facto de os preços não serem con­tro­lados. «Passa-se frio, passa-se mal em Por­tugal para manter di­vi­dendos», ver­berou Alma Ri­vera, não es­con­dendo a sua in­dig­nação.

Des­ta­cado por si neste ran­king de abas­tança foi ainda a Brisa, que viu os lu­cros au­men­tarem mais de 20%, in­di­fe­rente aos sa­cri­fí­cios de fa­mí­lias e em­presas que su­portam o au­mento das por­ta­gens.

Ra­zões para in­dig­nação en­contra ainda a par­la­mentar co­mu­nista no que toca aos lu­cros da grande dis­tri­buição. Fa­lando apenas da Sonae e da Je­ró­nimo Mar­tins, a cifra ar­re­ca­dada por cada grupo, por dia, é quase de dois mi­lhões de euros, con­se­guidos, su­bli­nhou Alma Ri­vera, «à custa dos tra­ba­lha­dores, al­guns com 30 anos de casa, a re­ceber 805 euros». Mas também, pros­se­guiu, à custa do au­mento dos preços, uma su­bida de tal ordem que «uma fa­mília faz com­pras e nem per­cebe de onde é que vem uma soma tão alta» quando olha para a fac­tura.

«Isto não são só nú­meros. Isto são os nú­meros das vidas adi­adas, de­ses­pero de fa­mí­lias, po­breza e in­jus­tiças», con­cluiu, por isso, a par­la­mentar do PCP.

 



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