Desenvolver a luta, construir a alternativa

Ângelo Alves (Membro da Comissão Política)

O que in­te­ressa é cen­trar as aten­ções no es­sen­cial

A su­cessão de ma­no­bras, po­lé­micas, ten­sões e jo­gadas, que ob­jec­ti­va­mente con­vergem para uma de­gra­dação da imagem das ins­ti­tui­ções, re­sultam da pro­mis­cui­dade entre o poder po­lí­tico o poder eco­nó­mico e me­diá­tico. Essa «re­a­li­dade» está cada vez mais dis­tan­ciada da re­a­li­dade ob­jec­tiva dos tra­ba­lha­dores e do povo, e isso foi pa­tente no 25 de Abril e 1.º de Maio.

Quem de­dique algum tempo ao vi­si­o­na­mento dos vá­rios ca­nais de te­le­visão ra­pi­da­mente fica com a ideia de que Por­tugal está a viver uma grave si­tu­ação de tensão e «ins­ta­bi­li­dade» po­lí­tica e ins­ti­tu­ci­onal. Os acon­te­ci­mentos de uma es­pécie de guião em torno de vá­rios «casos», al­ta­mente per­so­na­li­zados, co­lo­ridos com sen­sa­ci­o­na­lismo e dra­ma­tismo e ex­plo­rados ao má­ximo para ali­mentar as agendas po­lí­ticas do grande ca­pital dis­se­mi­nadas por via das portas gi­ra­tó­rias entre forças po­lí­ticas, poder eco­nó­mico e ór­gãos de co­mu­ni­cação so­cial, su­cedem-se a ritmo ace­le­rado. Tenta-se assim abrir campo a agendas re­ac­ci­o­ná­rias que ora con­frontam aber­ta­mente as ins­ti­tui­ções e a Cons­ti­tuição – como nas ten­ta­tivas der­ro­tadas de en­la­mear as co­me­mo­ra­ções do 25 de Abril e a vinda a Por­tugal do Pre­si­dente Lula da Silva – ora en­vergam as ima­cu­ladas vestes de «de­fen­sores do normal fun­ci­o­na­mento das ins­ti­tui­ções», como em torno dos mais re­centes epi­só­dios re­la­ci­o­nados com a Co­missão de Inqué­rito da TAP e o mi­nistro das In­fra­es­tru­turas.

Mas o Go­verno do PS está longe de ser uma ví­tima nesta his­tória. Como o PCP alertou em tempo, o grande ca­pital está a tentar «es­tafar» a mon­tada da mai­oria ab­so­luta do PS, ti­rando par­tido da sua acção con­ver­gente com os seus in­te­resses. Si­mul­ta­ne­a­mente, tira par­tido das con­sequên­cias, erros e tra­pa­lhadas de­cor­rentes dessas op­ções para abrir campo a uma «crise» que per­mita o apro­fun­da­mento da po­lí­tica de di­reita e des­brave ca­minho para so­lu­ções re­ac­ci­o­ná­rias.

Do ponto de vista de classe, tais «en­fren­ta­mentos» estão a mi­lhas dos in­te­resses dos tra­ba­lha­dores e do povo. É que esta «guerra» não apaga as con­ver­gên­cias de classe dos con­ten­dores. Provas não faltam. Basta re­cordar a tí­tulo de exemplo as con­ver­gên­cias do Go­verno do PS com os par­tidos à sua di­reita re­jei­tando, todos, vá­rias pro­postas do PCP para au­mentos dos sa­lá­rios e pen­sões ou fi­xação de preços má­ximos; re­cu­sando, todos, dar res­posta real aos gra­vís­simos pro­blemas da ha­bi­tação; ne­gando, todos, aceder às justas rei­vin­di­ca­ções de vá­rios sec­tores pro­fis­si­o­nais, como os pro­fes­sores ou os tra­ba­lha­dores por turnos; ma­ni­fes­tando, todos, o seu acordo ao au­tên­tico crime eco­nó­mico que está em curso com a pri­va­ti­zação da TAP; ou, ainda, ali­nhando, todos, com a es­tra­tégia dos EUA de pro­lon­ga­mento da guerra da Ucrânia, de­sig­na­da­mente com a re­cente des­lo­cação de uma de­le­gação par­la­mentar com­posta por PS, PSD, IL e BE a Kiev.

Es­ta­bi­li­dades...

Não nos es­panta que ne­nhum destes pro­ta­go­nistas se tenha in­dig­nado pelo facto de as co­me­mo­ra­ções do 25 de Abril – que der­ro­taram na rua todos aqueles que pre­ten­deram en­la­mear a co­me­mo­ração da re­vo­lução e afir­maram um ex­tra­or­di­nário apego do povo por­tu­guês aos va­lores de Abril – ou as enormes ma­ni­fes­ta­ções do 1.º de Maio por todo o País – que trou­xeram para a rua os ver­da­deiros pro­blemas dos tra­ba­lha­dores e do povo numa no­tável de­mons­tração de de­ter­mi­nação e luta – te­nham sido quase ig­no­radas pela mesma co­mu­ni­cação so­cial que não fala dos grandes e reais pro­blemas do povo e do País mas de­dica horas a fio à «crise po­lí­tica».

A «es­ta­bi­li­dade» da mai­oria ab­so­luta do PS saldou-se, como pre­vimos, na ins­ta­bi­li­dade do povo. Mas não pelas ra­zões que agora en­chem pa­ran­gonas. A questão es­sen­cial que in­te­ressa aos tra­ba­lha­dores e ao povo é cen­trar aten­ções no es­sen­cial e pros­se­guir a luta por uma po­lí­tica al­ter­na­tiva e por uma al­ter­na­tiva po­lí­tica, e não por uma al­ter­nância que está a ser ten­tada para apro­fundar ainda mais a po­lí­tica de di­reita. E há um dado in­te­res­sante nesta equação: por mais que a ofen­siva ide­o­ló­gica tente ar­rastar o povo para a po­sição de es­pec­tador da con­tenda, o facto é que a luta de massas está mais forte e alar­gada. Isso abre pers­pec­tivas de in­ter­venção para quem, como o PCP, não se desvia um mi­lí­metro do seu com­pro­misso com os tra­ba­lha­dores e o povo e re­jeita os ín­vios ca­mi­nhos do opor­tu­nismo e da es­puma dos dias.




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