Há Mar e Mar, há proteger e desenvolver ou há mercantilizar!

Vladimiro Vale

Para o Go­verno, de­finir uma po­lí­tica para o mar é co­locar-se como fa­ci­li­tador de ne­gó­cios

Pi­xabay

O Dia Eu­ropeu do Mar ce­lebra-se anu­al­mente a 20 de Maio. Se­gundo se pode ler no sítio do Mi­nis­tério dos Ne­gó­cios Es­tran­geiros, «este dia foi criado através da De­cla­ração Tri­par­tida Comum (da Co­missão Eu­ro­peia, do Con­selho da União Eu­ro­peia e do Par­la­mento Eu­ropeu) que es­ta­be­lece o Dia Eu­ropeu do Mar, a 20 de Maio de 2008».

Numa in­ter­venção na As­sem­bleia da Re­pú­blica, em 2008, Agos­tinho Lopes, do PCP, de­nun­ciava «a suma hi­po­crisia de aprovar um voto de con­gra­tu­lação pela cri­ação do Dia Eu­ropeu do Mar quando a União Eu­ro­peia, com a cum­pli­ci­dade do Go­verno por­tu­guês, do Par­tido So­ci­a­lista e do PSD, ra­ti­fi­caram, nesta As­sem­bleia, um tra­tado que ex­pro­priou a so­be­rania por­tu­guesa dos di­reitos sobre re­cursos bi­o­ló­gicos do mar, vi­o­lando a Cons­ti­tuição da Re­pú­blica».

Su­bli­nhando a «suma hi­po­crisia quando o Go­verno por­tu­guês e a União Eu­ro­peia per­mi­tiram o brutal agra­va­mento do sector pes­queiro, eu­ropeu e na­ci­onal e que só a luta mas­siva, ge­ne­ra­li­zada, do sector levou à to­mada de tí­midas me­didas», e a «suma hi­po­crisia quando a po­lí­tica de di­reita le­vada a cabo por su­ces­sivos go­vernos per­mitiu o de­fi­nha­mento, quase sem re­médio, da ma­rinha mer­cante na­ci­onal e o en­cer­ra­mento de grande parte dos es­ta­leiros do País». Afir­mando que «não basta a cri­ação de dias do mar. São ne­ces­sá­rias ou­tras po­lí­ticas que façam cor­res­ponder os actos às pa­la­vras. Desta forma, lo­gi­ca­mente, o grupo Par­la­mentar do PCP não se pode as­so­ciar a este voto de con­gra­tu­lação».


Por uma po­lí­tica global do mar

Pas­sados 15 anos, a pro­pó­sito da Con­fe­rência dos Oce­anos, re­a­li­zada em Lisboa, o PCP voltou a alertar: «o que esta Con­fe­rência veio re­velar é o pro­fundo atraso do País na adopção de uma po­lí­tica global capaz de as­se­gurar a so­be­rania, a se­gu­rança, a pre­ser­vação am­bi­ental e o de­sen­vol­vi­mento das múl­ti­plas ac­ti­vi­dades que o mar pro­picia e que podem ajudar a com­bater os dé­fices da eco­nomia na­ci­onal.» E re­a­firmou que «não basta, como al­guns pro­curam fazer crer, de­cretar a pro­tecção am­bi­ental de uma per­cen­tagem do ter­ri­tório ma­rí­timo, de forma dis­so­ciada de uma po­lí­tica global para o sector».

É pre­ciso uma «po­lí­tica na­ci­onal in­te­grada que as­se­gure de­sig­na­da­mente: a gestão, sal­va­guarda e apro­vei­ta­mento dos re­cursos ma­ri­nhos; in­vestir no co­nhe­ci­mento, na in­ves­ti­gação e de­sen­vol­vi­mento (I&D) e nou­tras ac­ti­vi­dades ci­en­tí­ficas e téc­nicas, na mo­ni­to­ri­zação e gestão dos re­cursos, alar­gando sig­ni­fi­ca­ti­va­mente o in­ves­ti­mento e a ca­pa­ci­tação das es­tru­turas pú­blicas e a ca­pa­ci­dade ci­en­tí­fica na­ci­onal, em co­o­pe­ração com ou­tros países; de­fender junto da ONU os di­reitos ter­ri­to­riais por­tu­gueses, onde se in­clui o alar­ga­mento da pla­ta­forma con­ti­nental; in­vestir na ca­pa­ci­dade de mo­ni­to­ri­zação, pa­tru­lha­mento e se­gu­rança das águas ter­ri­to­riais; pro­mover um amplo es­pectro de sec­tores de ac­ti­vi­dade eco­nó­mica li­gados aos mares e aos oce­anos, in­cluindo sec­tores tra­di­ci­o­nais e sec­tores emer­gentes, como sejam os se­guintes: pescas, aqua­cul­tura, trans­portes ma­rí­timos e flu­viais, portos e lo­gís­tica, tu­rismo e náu­tica de re­creio, cons­trução e re­pa­ração naval, obras ma­rí­timas e de de­fesa da orla cos­teira, pros­pecção e ex­plo­ração de re­cursos, bi­o­tec­no­logia, entre ou­tros».

Nessa mesma Con­fe­rência dos Oce­anos, re­a­li­zada em 2022, ou­vimos o mi­nistro por­tu­guês dos Ne­gó­cios Es­tran­geiros de­clarar que «acre­dito que Lisboa pode tornar-se numa praça fi­nan­ceira do mar»! Ou seja, como o PCP de­nun­ciou, «para o Go­verno PS, de­finir uma po­lí­tica para o mar é co­locar-se como fa­ci­li­tador de ne­gó­cios».

Já para o PCP, do que Por­tugal pre­cisa é de uma po­lí­tica ver­da­dei­ra­mente ori­en­tada para a de­fesa, pre­ser­vação e gestão pú­blica dos imensos re­cursos ma­ri­nhos, com­ba­tendo a sua mer­can­ti­li­zação.

 



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