«Basta de conversa! Está na tua mão lutar pelo direito ao alojamento»

A JCP promoveu, quinta-feira, 14, em Lisboa, uma iniciativa política com o mote «Basta de conversa! Está na tua mão lutar pelo direito ao alojamento», com a participação de Paulo Raimundo, Secretário-Geral do PCP.

Faltam 105 mil camas em residências públicas universitárias

A iniciativa decorreu junto à antiga sede do Ministério da Educação, na Avenida 5 de Outubro, cuja reabilitação para uma residência de estudantes com 600 camas, prometida em 2018 pelo Governo PS, continua sem uma conclusão à vista.

«Privo-me da minha vida para pagar a renda. Laura Abreu, 18 (anos), licenciatura na FCSH», «Se me atrasar uma hora a pagar a renda, o meu senhorio entra-me pela casa adentro. Duarte Raposo, 19, licenciatura na FCSH», «Tentei arranjar quarto: preços exorbitantes, pedidos de duas e três rendas adiantadas, não oferecem contrato. Pedro Henriques, 21, mestrado no ISCTE», «Não arranjei quarto na residência, voltei para casa da minha família. Dinis Silveira, 21 anos, mestrado no ISCTE», «Quando cheguei a casa tinha zero mobílias; zero electrodomésticos. Guilherme Vaz, 19, licenciatura na FCSH», «O quarto onde eu morava foi vendido a um nómada digital. Duarte Mihuta, 21 anos, mestrado no IST», «Duas semanas antes de renovar o contrato avisaram-me que a renda ia aumentar 100 euros. Vitória Alves, 22, licenciatura no ISCTE», «Arranjei um quarto longe da faculdade. São diariamente três transportes para ir e para voltar quase duas horas de viagem. Catarina Pereira, 26, mestrado na FBAUL», «Enquanto montava esta pancarta, soube que a minha renda vai aumentar 40 euros; são 440 euros por um quarto, para mim e para os outros seis estudantes. Pedro Fialho, 20, mestrado no IST». Os testemunhos – na primeira pessoa –eram muitos e podiam ler-se nas faixas envergadas pelos estudantes no local, que gritaram palavras de ordem como «Acção Social não existe em Portugal», «Mais, mais, condições materiais» ou «É preciso investir, queremos camas para dormir».

Seguiu-se uma pequena peça teatral que reproduziu a falta de alojamento estudantil em Portugal, uma barreira de classe que ano após ano priva milhares de jovens portugueses ao Ensino Superior público, democrático, gratuito e de qualidade. Tinha como protagonistas um estudante deslocado, que, tendo-se matriculado em Lisboa, agora corre todos os cantos da cidade em busca de um quarto para prosseguir os estudos. «Deparou-se no caminho com rendas exorbitantes, quartos partilhados com várias pessoas, quartos sem condições e em zonas muito distantes da faculdade. Um cenário que reflecte o compromisso do Governo com um caminho de elitização do Ensino Superior», ouviu-se em voz off. Outra das personagens retratava Elvira Fortunato, ministra da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, que foi inaugurar um «quarto provisório»daquela«possível futura residência», sem «paredes nem tecto».

Política das contas certas
«Enquanto os grandes grupos económicos somam lucros escandalosos, cada vez há mais famílias que empobrecem a trabalhar; cada vez há mais jovens que se vêem barrados do Ensino Superior pela existência da propina, que são obrigados a desistir dos estudos por causa da falta de alojamento e da subida das rendas. (…) A política de contas certas falha ainda em acertar contas com todos os estudantes que, apesar de conseguirem um quarto numa residência pública, se vêem alojados em residências sem condições e sem estabilidade, muitos com a constante ameaça que a sua residência possa vir a fechar», continuou a voz off.

André Marques, da Comissão Política da Direcção Nacional da JCP, referiu que a situação ali descrita «é uma amostra da realidade de décadas de política de desvalorização do Ensino Superior». «Num ano em que se regista um novo aumento de estudantes deslocados e em que existem 15073 camas para cerca de 119 mil estudantes deslocados, não vemos nenhum esforço sério [do Governo] que procure solucionar um dos grandes entraves ao acesso e frequência ao Ensino Superior: a questão do alojamento», acusou o jovem comunista. Informou que em 2023 «a média do aumento de rendas de quartos destinados a estudantes universitários ronda os 10,5 por cento». «No Porto e em Lisboa os valores passam já os 400 euros. (…) Em Portalegre o preço dos quartos aumentou cerca de 33 por cento», adiantou.

 

PCP apresenta propostas para responder aos problemas

Segunda contas feitas por Paulo Raimundo no encerramento da iniciativa da JCP, faltam 105 mil camas em residências públicas universitárias, «uma realidade que está para lá das inaugurações e das promessas» e «um problema identificado há muito».

Porque a «situação é muito grave», o PCP apresentou, sexta-feira, na Assembleia da República (ver pag. 14) um projecto-lei que prevê o aumento do complemento para alojamento e o seu alargamento a todos os estudantes deslocados; o alargamento do complemento de deslocação a todos os alunos bolseiros deslocados; o levantamento, até ao final deste ano, de todos os edifícios públicos que possam vir a servir de residência; o combate à especulação.

Estas são «medidas que não resolvem todos os problemas, mas que contribuem de forma decisiva para que seja possível ingressar e estudar no Ensino Superior», reforçou o dirigente comunista. Defendeu também a necessidade de concretizar o Plano Nacional para o Alojamento Superior (PNAES), uma exigência que o PCP tem apresentado, ano após ano, nos orçamentos do Estado.

Nova subida das taxas de juro
No dia em que o Banco Central Europeu (BCE) anunciou uma nova subida das três taxas de juro directoras em 25 pontos base, que têm particular incidência nas taxas de juro à habitação, o Secretário-Geral do PCP assinalou que esta é «uma decisão ao serviço do capital financeiro» com «consequências gravosas» para o País, sujeito que fica a novas pressões para o seu financiamento, para as pequenas e médias empresas e, sobretudo, para as mais de um milhão e 300 mil famílias que têm empréstimo à habitação.

«Isto do BCE decretar aumentos brutais dos juros, a União Europeia (UE) subscrever, o Governo, o PS, o PSD, o Chega e a IL obedecerem e o povo pagar tem de parar», insistiu, afirmando ser preciso que o Governo «assuma uma posição clara, exigindo a baixa das taxas de juro por parte do BCE» e «faça frente às imposições da UE e à submissão do País ao Euro».

Entre outras medidas, disse ser necessário atribuir à Caixa Geral de Depósitos «orientações que contribuam para uma efectiva descida das taxas de juro no mercado bancário», avançar «para a moratória nos termos em que houve durante a epidemia, que baixe de imediato os encargos das prestações» e que «seja fixado 0,43 por cento como valor máximo de aumentos das rendas» em 2024. «O que é preciso é pôr os lucros da banca a suportar o aumento das insuportáveis taxas de juro», concluiu.

Com Paulo Raimundo esteve Alexandre Araújo, do Secretariado do Comité Central do PCP.

 

Depoimentos

Margarida Costa, do ISCSP: «A minha senhoria ameaçou expulsar-me de casa só porque me atrasei na renda por um dia».

Rita São João, da FCSH: «Vir estudar para Lisboa foi muito complicado. Não é só sair de casa dos país, é dar de caras com entraves que nunca imaginaste. É um acordar para a realidade, uma vez que não existem alojamentos acessíveis para os estudantes. No meu primeiro ano fui para Sintra, o sítio mais acessível que encontrei. Para chegar à faculdade demorava no mínimo umas duas horas. Depois consegui encontrar uma casa mais perto, com custos enormes para os meus pais; a minha mãe trabalha mais de 12 horas por dia. (…) ao fim de seis meses a senhoria instalou câmara de vigilância em casa; obviamente, tive que sair. Agora estou em Algés, mas vou ter que procurar casa a partir de Dezembro».

Francisco Cardoso, do IGOT: «Entrei no Ensino Superior em 2018, ano em que foi criado o Plano Nacional para o Alojamento Superior (PNAES). Desde então, a Acção Social da Universidade de Lisboa encerrou, pelo menos, quatro residências e, como é sabido, nenhuma cama foi adicionada à conta. Até agora, tudo parece revelar que este plano foi, na verdade, uma forma de esconder a contínua degradação da Acção Social. Para além destas quatro, pelo menos mais duas serão encerradas nos próximos dois anos».

Mariana Metelo, dirigente associativa estudantil: «O PNAES estabelecia em 2018 o aumento de reforço de 11 795 camas, o que representa um aumento de cerca de 78 por cento face às cerca de 15 já existentes. Hoje, o PNAES continua por cumprir e dos 108 mil estudantes deslocados do Ensino Superior, dos quais 43 mil são bolseiros, apenas 14 por cento do total de alunos deslocados tem lugar numa residência universitária pública. Mas o problema não é só este: sabemos que além de não serem suficientes, uma grande parte delas não garante um mínimo de condições dignas para viver».




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