Salvaguarda e reforço do SNS saiu à rua de Norte a Sul do País

Milhares de trabalhadores e utentes do Serviço Nacional de Saúde (SNS) participaram, sábado, 16, na jornada nacional em defesa do seu carácter público, universal e gratuito. Convocada pela CGTP-IN, a jornada incluiu desfiles, concentrações, tribunas públicas em mais de duas dezenas de localidades. Em Lisboa, interveio a Secretária-Geral da Intersindical Nacional.

O SNS é «conquista de Abril e direito constitucional»

Isabel Camarinha encerrou o período de intervenções, que culminou a marcha entre o início da Avenida Fontes Pereira de Melo e a Praça do Duque de Saldanha, trajecto que estruturas sindicais e comissões de utentes da Área Metropolitana de Lisboa (AML) percorreram a afirmar direitos e reivindicações, vertidas em palavras de ordem. Das já sobejamente conhecidas – «A Saúde é um direito, sem ela nada feito» ou «Público é de todos, privado é só de alguns» –, às mais recentes, como «O povo merece, melhor SNS» e «Lutar e agir, para o SNS garantir».

Trabalhadores, incluindo profissionais do sector e respectivas organizações representativas, bem como utentes, manifestaram-se identificados com panos e cartazes, pintados de exigências. As comuns: reforço do investimento em diversos planos e valorização do SNS e dos seus profissionais; as específicas de profissionais ou num determinado território, como as que dizem respeito às carreiras, rendimentos e condições de trabalho, no caso dos funcionários.

Os utentes, por seu lado, reclamaram a manutenção, reabertura ou fortalecimento de unidades, serviços, valências e especialidades clínicas, condição para que a população aceda aos cuidados primários e hospitalares, assim como um número suficiente de médicos, enfermeiros, técnicos e outros funcionários que os satisfaçam.

O SNS, apesar de tudo

De resto, antes de Isabel Camarinha, Célia Portela, em nome da União de Sindicatos de Lisboa, saudou «de forma muito especial os trabalhadores do SNS», cujo «sentido de serviço público, empenho e dedicação» contribuem decisivamente para que o sistema público não colapse definitivamente, e, pelo contrário, continue, apesar de todas as dificuldades e carências que lhe foram e são impostas, a dar uma resposta diferenciada.

Nesse sentido, a dirigente da USL sublinhou que sem profissionais de Saúde «qualificados e motivados», «respeitados e valorizados», «não há SNS». Isto antes de denunciar traços do ataque que sucessivos governos levam a cabo contra o SNS, praticamente desde a sua fundação, há 44 anos.

Ofensiva responsável pela falta de profissionais, a degradação dos cuidados de saúde primários, o subfinanciamento crónico em que assentam todo o tipo de carências, pela proliferação do negócio da doença, do que é ilustrativo o facto de, na AML, a maioria dos hospitais serem já privados (55%) ou em parceria público-privado (3,3%), notou Célia Portela.

Conquista de Abril

sob fogo cerrado

À mesma hora que em Lisboa decorreu o desfile ou durante a manhã de sábado, muitos milhares de trabalhadores e utentes do SNS estiveram nas ruas de mais de 20 outras localidades (ver caixa). Por isso, a Secretária-Geral da CGTP-IN começou a sua intervenção a saudar «todos os que participam nas inúmeras acções, nas manifestações e concentrações, nas tribunas públicas e nos desfiles em defesa e pelo reforço do SNS», contra o «ataque desenvolvido pelos que vêem na doença uma fonte de negócio e lucro».

Isabel Camarinha também sublinhou o SNS como «conquista de Abril e direito constitucional», que «levou os cuidados de saúde a todo o País e a toda a população», permitindo «profundas alterações nas condições de vida». Mas essa história, passado recente e, em muitos aspectos, ainda presente, nunca deixou de ser alvo do ataque da política de direita, alertou. «Um ataque que se desenvolveu a partir da diabolização da intervenção do Estado na nossa vida colectiva», desenvolvido «sob a batuta da tese do “dividir para reinar”, apresentando os trabalhadores do sector público como os “privilegiados” para depois lhes impor a precariedade, a perda de poder de compra e negar quaisquer perspectivas de desenvolvimento nas carreiras», acrescentou, antes de apontar responsáveis, pretéritos e actuais.

«É por opção dos sucessivos governos, incluindo o agora em funções, comprometidos com os interesses dos grupos económicos da saúde, que querem impor uma política de desvalorização do SNS, nomeadamente dos seus trabalhadores, levando a que milhares tenham sido empurrados» para os grupos privados ou para o estrangeiro.

«Um ataque ao SNS que conta com a poderosa campanha dos grandes grupos económicos do negócio da doença (…), com a acção subserviente dos governos PS e PSD e da direita no Parlamento», todos «apostados em fragilizar a resposta pública que abre portas ao negócio privado».

Um ataque que conta com as directrizes da União Europeia a que o nosso governo se submete, que «ganha novos contornos com a acção do governo PS. Um Governo que aposta na municipalização e em outras formas de desresponsabilização e transferência de ineficiências», acrescentou a dirigente da Intersindical Nacional, antes de denunciar alguns indicadores que atestam o caminho de liquidação do SNS em curso: 1 milhão e 600 mil dos que trabalham e vivem no nosso País não têm médico de família; 28,6% da despesa [com a saúde] é assumida pelos utentes, com um número crescente a não aceder a cuidados porque os salários e as pensões não o permitem; Portugal é dos que menos investe em saúde por habitante, menos 26% que a média da União Europeia e quase metade dos valores da Alemanha; quase metade dos 14 mil milhões de euros que constam do orçamento para a saúde em 2023 vão para o sector privado.

Defender é urgente

Neste contexto, Isabel Camarinha realçou ser «sintomático que, mesmo debaixo desta ofensiva, o SNS continue a ser fonte de progresso social (…). Uma resposta que só é possível pela ligação dos profissionais de saúde aos seus utentes e pela apropriação colectiva que o povo faz desta conquista que é o SNS, deste direito à saúde que é nosso e não pode ser subordinado à lógica do lucro e do mercado».

Nesse sentido, salientou a urgência de «defender o SNS», o seu carácter «público, universal, gratuito e de qualidade». E advertiu: «O SNS deve permanecer como um serviço integralmente público, exclusivamente constituído por entidades e serviços prestadores de cuidados de saúde públicos, não se confundindo com entidades e empresas privadas ou de carácter social, que lhe são externas». Aliás, «como está estabelecido na nova Lei de Bases da Saúde, aprovada em 2019», assinalou, antes de concluir com algumas das exigências aprovadas numa resolução colocada à votação logo em seguida (ver caixa).

 

Utentes e profissionais exigem ao Governo

  • O investimento e financiamento necessários para que as unidades do SNS possam cumprir a sua função e assim garantir a prestação de cuidados com segurança e qualidade;

  • A valorização profissional e salarial de todos os trabalhadores do SNS;

  • A formação e contratação de mais profissionais de saúde para o SNS, de todas as áreas;

  • Que crie condições para assegurar a toda a população a atribuição de médico e enfermeiro de família;

  • O fim do encerramento e a reabertura de valências e equipamentos de saúde;

  • Medidas de organização e direcção, que envolvam os trabalhadores e garantam a articulação entre os diferentes níveis de cuidados, por forma a garantir acesso atempado a consultas de especialidade, meios complementares de diagnóstico e terapêutica e a cirurgias;

  • Políticas de promoção de saúde e prevenção da doença, dotando o SNS de meios para as concretizar;

  • O reforço dos cuidados de saúde primários, continuados e paliativos;

  • O fim da promiscuidade entre o SNS e o sector privado, terminando com as Parcerias Público-Privado.

 

PCP na primeira linha

Presente na marcha que, em Lisboa, deu expressão à jornada nacional convocada pela CGTP-IN, esteve uma delegação do PCP, liderada pelo seu Secretário-Geral e integrada, também, por Jorge Pires, da Comissão Política, e Bernardino Soares e Alma Rivera, do Comité Central.

Em declarações à comunicação social, Paulo Raimundo alertou que o SNS está «em perigo e é preciso salvá-lo», resultado de «um caminho desmantelamento que não corresponde às necessidades do País, à realidade dos utentes, às necessidades profissionais». Por isso, advogou a «inversão desse caminho», a quebra «desse processo» cujo «objectivo fundamental» é «transferir para o sector privado da saúde uma parte fundamental das valências e serviços que o SNS presta e tem que continuar a prestar».

Questionado sobre medidas governamentais como as supostamente destinadas a fixar médicos no SNS, Paulo Raimundo qualificou-as como «um esforço para iludir e criar condições para que se mantenha o movimento do público para o privado», considerando, por outro lado, um «escândalo» que 6 mil milhões de euros do orçamento da Saúde sejam entregues ao sector privado, ao invés de serem investidos no público.


Muitos, muitos mil>

Para além de Lisboa, iniciativas semelhantes foram promovidas de Norte a Sul do País, no Litoral e no Interior (ver fotos). No distrito do Porto, foram quatro as concentrações realizadas, em Vila Nova de Gaia, Campanhã, Vila do Conde e Amarante. Em Aveiro, à concentração frente ao Hospital São Sebastião - em Santa Maria da Feira, seguiu-se uma manifestação e tribuna pública frente à Câmara Municipal, o mesmo molde seguido em Beja, entre o Centro de Saúde e o Hospital José Joaquim Fernandes, Braga, da Praça da República até à porta da Direcção Regional da Saúde, Coimbra, entre a Av. Fernão de Magalhães e a Praça 8 de Maio; Évora, do Largo de Camões até à ARS, ou Faro, neste caso com partida do Mercado Municipal.

Em Bragança, utentes e trabalhadores concentraram-se na Praça Cavaleiro Ferreira; em Castelo Branco, no Centro Hospitalar e Universitário da Cova da Beira; nas Caldas da Rainha, na Rua das Montras; em Santarém, no Jardim da Liberdade; em Viana do Castelo, na Praça 1.º de Maio; no distrito de Vila Real, junto ao Mercado Municipal da cidade, mas igualmente no Jardim das Feiras, em Chaves.

Em Portalegre, os participantes concentraram-se no Rossio. No distrito da Guarda, aconteceram um cordão humano na Alameda Santo André da cidade e uma tribuna pública em Seia, e no distrito de Setúbal, enquanto em Santiago do Cacém a concentração decorreu na Estação Rodoviária, de manhã, à tarde uma marcha uniu, em defesa do SNS, o Hospital de São Bernardo e o Jardim do Bonfim, em Setúbal.



Mais artigos de: Em Destaque

Quando a CDU avança a vida de cada um melhora

O Secretário-Geral do PCP, Paulo Raimundo, participou na sexta-feira, 15, num grande jantar da CDU no concelho da Ribeira Brava, inserido na campanha para as eleições do próximo domingo, para a Assembleia Legislativa Regional da Madeira.