Numa terra chamada Vénus

António Santos

Numa terra chamada Vénus, no Texas, uma mulher engravidou. Não sendo a gestante cantora, actriz ou rainha, nem sendo o genitor futebolista, presidente ou o Espírito Santo, não deveria tão reiterado facto da História humana merecer parangonas e manchetes, mas assim foi. É que, em Janeiro deste ano, no Hospital «sem fins lucrativos» Texas Health Mansfield , estava prestes a fazer-se História do capitalismo

Colheram-lhe sangue para as análises normais e os resultados voltaram mais normais ainda: nem doenças, nem vírus, nem valores anómalos, a não ser na conta. Cobraram-lhe 9520 dólares e dois cêntimos, o valor mais alto alguma vez cobrado pela mais rotineira das análises clínicas.

Porquê 9520 dólares e dois cêntimos por umas simples análises? Porque podem. No capitalismo, a formação do preço pode ser mais misteriosa do que a formação da vida. Os mercados são deuses misteriosos.

No ventre da seguradora pública, a Anthem, regateava-se o preço com o hospital. Passaram-se meses e, do consistório financeiro finalmente saiu fumo branco: afinal as análises custariam apenas 6700 dólares e cinquenta cêntimos. A seguradora, sem mais fins lucrativos do que o hospital, decidiu que assumiria 4310 dólares e 38 cêntimos, pelo que, no final de contas, à grávida só caberia pagar a módica quantia de 2390 dólares e 12 cêntimos.

Não tentemos entender estes números nem decifrar estes valores, ou a falta deles. Alguém porventura dirá que no fundo é só a oferta, a procura, a especulação e a natureza humana, seja lá o que isso for, mas algo está profundamente errado quando umas análises ao sangue custam mais do que um salário.

A grávida, não diremos o seu nome, acabou por perder o bebé, mas não perdeu a dívida. Para os dramas da natureza humana, o capitalismo não tem descontos. A carta com a conta para pagar, 2390 dólares e 12 cêntimos, chegaria nove meses depois, no Texas, em Vénus, mesmo aqui na Terra.





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