Palestina, a luta tem de continuar

Ângelo Alves

A luta pela paz tem de con­ti­nuar

Ao mo­mento da re­dacção deste ar­tigo as no­tí­cias sobre a guerra na Pa­les­tina estão cen­tradas na pos­si­bi­li­dade de um acordo de troca de pri­si­o­neiros pa­les­ti­ni­anos e is­ra­e­litas, que seria acom­pa­nhado de uma pausa de quatro ou cinco dias nos com­bates.

A con­cre­tizar-se, o acordo em que o Qatar e o Egipto pa­recem ter tido um papel im­por­tante terá al­guma im­por­tância po­lí­tica, pois Is­rael acei­taria ne­go­ciar (com quem afirmou nas úl­timas se­manas nunca o fazer) a li­ber­tação de uma pe­quena parte (no má­ximo 300) dos 4500 pa­les­ti­ni­anos que estão presos nas pri­sões de Is­rael em troca da li­ber­tação de 73 dos 236 pri­si­o­neiros que a re­sis­tência pa­les­ti­niana tem em seu poder na Faixa de Gaza. Si­mul­ta­ne­a­mente a con­cre­ti­zação deste acordo seria o pri­meiro, ténue e curto mo­mento de pausa no au­tên­tico in­ferno em que Is­rael trans­formou a Faixa de Gaza inin­ter­rup­ta­mente há mais de um mês. Caso Is­rael aceite as con­di­ções pro­postas pelo lado pa­les­ti­niano, seria pos­sível du­rante quatro ou cinco dias parar os bom­bar­de­a­mentos e per­mitir a en­trada de ali­mentos, água e com­bus­tível. Tudo isto é po­si­tivo.

Por outro lado, Is­rael e seus apoi­antes vão ins­tru­men­ta­lizar o pos­sível re­gresso dos pri­si­o­neiros para levar ainda mais longe a pro­pa­ganda de guerra que, ins­tru­men­ta­li­zando os acon­te­ci­mentos do dia 7 de Ou­tubro, tenta jus­ti­ficar a bar­bárie em curso na Pa­les­tina. Podem in­clu­sive tentar usar esse acordo para dar uma imagem «hu­ma­nista» ao já in­dis­far­çável ob­jec­tivo de alargar a ocu­pação de ter­ri­tó­rios pa­les­ti­ni­anos e de pro­ceder à ex­pulsão em massa de pa­les­ti­ni­anos, um te­ne­broso «plano fa­seado» ao qual faz cada vez mais sen­tido chamar se­gunda Nakba. Aliás, os EUA – que jun­ta­mente com o Reino Unido, a Aus­trália, a Ale­manha e a Ho­landa re­for­çaram for­te­mente os seus já po­de­rosos meios mi­li­tares na re­gião para pro­teger e dar co­ber­tura aos crimes e ao plano de Is­rael – irão tentar usar o acordo para dar co­ber­tura à cí­nica e hi­pó­crita imagem de «me­di­ador» do con­flito – ins­tru­men­ta­li­zando in­clu­sive a ajuda hu­ma­ni­tária – quando na re­a­li­dade são cúm­plices de Is­rael, co-res­pon­sá­veis pelo mas­sacre e co-au­tores do plano de ocu­pação.

Con­tra­ri­a­mente ao am­bi­ente que se pode vir a criar na co­mu­ni­cação so­cial do­mi­nante, o acordo que está a ser ne­go­ciado está longe de ser um cessar-fogo com vistas ao fim das hos­ti­li­dades. Es­pe­ramos sin­ce­ra­mente estar en­ga­nados, mas tendo em conta as de­cla­ra­ções fas­cistas e cri­mi­nosas de vá­rios res­pon­sá­veis mi­li­tares e po­lí­ticos is­ra­e­litas, esta «pausa hu­ma­ni­tária» será apenas um curto in­ter­valo num es­pec­tá­culo dan­tesco que já matou 14200 pes­soas, 6000 das quais cri­anças, e feriu 33.000 pes­soas, 75% das quais mu­lheres e cri­anças.

Os bom­bar­de­a­mentos no sul de Gaza; a acção cri­mi­nosa dos co­lonos e do exér­cito is­ra­e­lita na Cis­jor­dânia; a “nor­ma­li­zação” dos in­di­zí­veis crimes nos hos­pi­tais, es­colas, campos de re­fu­gi­ados e ins­ta­la­ções da ONU; os bom­bar­de­a­mentos em Gaza, Cis­jor­dânia e sul do Lí­bano; o as­sas­si­nato se­lec­tivo de jor­na­listas, são al­guns dos si­nais de que o mas­sacre vai con­ti­nuar. Uma au­tên­tica bar­bárie de­sen­ca­deada com o pre­texto de «res­ponder» ao «ataque ter­ro­rista» de 7 de Ou­tubro, sobre o qual pendem agora vá­rias dú­vidas e in­ves­ti­ga­ções re­la­tivas ao que re­al­mente acon­teceu na­quele dia. Não po­demos de­sarmar. A luta pela paz no Médio Ori­ente e pelos di­reitos do povo pa­les­ti­niano tem, in­fe­liz­mente, de con­ti­nuar.




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