O novo

Manuel Gouveia

Não nos in­ti­mi­demos por re­gressar ao bá­sico, ao bê-à-bá, pois é mesmo isso que faz falta. O grande ven­cedor das úl­timas elei­ções foi o ca­pital, o grande ca­pital.

E é o grande ven­cedor porquê? Em pri­meiro lugar e es­sen­ci­al­mente porque fra­gi­lizou quem lhe faz frente: o PCP. As úl­timas duas elei­ções re­ti­raram aos tra­ba­lha­dores um con­junto de ins­tru­mentos para estes re­sis­tirem à ex­plo­ração e lu­tarem por um outro mundo. Re­flectem ine­gá­veis avanços ide­o­ló­gicos das classes do­mi­nantes, da sua ca­pa­ci­dade de ma­ni­pular e iludir as massas.

Mas ga­nhou por outra im­por­tante razão: porque apesar do nú­mero de de­pu­tados que se sub­metem aos in­te­resses do ca­pital ser ba­si­ca­mente o mesmo do das úl­timas elei­ções, não é a mesma coisa – para a forma e a ve­lo­ci­dade de im­ple­men­tação da po­lí­tica ao ser­viço do ca­pital – que esses de­pu­tados te­nham sido eleitos di­zendo que eram de es­querda ou di­zendo que eram de di­reita ou ex­trema-di­reita. Uma das artes da po­lí­tica de di­reita é con­se­guir ser a al­ter­na­tiva a si pró­pria. O pro­grama do ca­pital será o mesmo que o que es­tava a ser con­cre­ti­zado pelo go­verno do PS: des­truir ser­viços pú­blicos, re­duzir im­postos aos ricos, pri­va­tizar a eco­nomia. Mer­can­ti­lizar e li­be­ra­lizar, en­quanto se mantém o país ajo­e­lhado aos pés do im­pe­ri­a­lismo. Só que sem pelos!

Es­teve muito bem o PCP ao co­locar-se no plano da opo­sição total e frontal aos pro­jectos do ca­pital. E não apenas na As­sem­bleia de Re­pú­blica com a moção de re­jeição. Em todos os planos da luta – po­lí­tica, eco­nó­mica, so­cial, ide­o­ló­gica – que per­ma­nen­te­mente opõe os in­te­resses an­ta­gó­nicos, ir­re­con­ci­liá­veis, de pro­le­ta­riado e bur­guesia.

Os co­men­ta­deiros não per­ce­beram. Claro. Estão presos nas ve­lhas ro­tinas, onde vale tudo para ga­nhar votos, para poder es­co­lher o CEO, e de­pois sermos todos ir­mãos na grande casa da de­mo­cracia, todos ao ser­viço do ca­pital e a ser por este re­com­pen­sados. Eles nunca per­ce­berão que nós sa­bemos que da luta sur­girá «a força capaz de varrer o velho e criar o novo». O novo!




Mais artigos de: Opinião

O futuro não acontece, constrói-se e conquista-se

As adversidades enfrentadas pelos trabalhadores, a degradação de serviços públicos e das funções sociais do Estado, o agravamento da situação económica, o acumular de desigualdades e injustiças levam a que dois milhões de portugueses estejam em risco de pobreza ou exclusão social… É este o...

Eles querem fazer esquecer...

No próximo domingo assinala-se 25 anos da agressão da NATO à Jugoslávia, desencadeada a 24 de Março de 1999. Depois de anos a fomentar, a apoiar e a instrumentalizar a acção terrorista do denominado «Exército de Libertação do Kosovo» na Jugoslávia – uma prática comummente levada a cabo pelos EUA contra diversos países e...

Ameaça e espantalho

É compreensível a preocupação pelo resultado alcançado pelo Chega nas eleições legislativas. Tão significativo reforço eleitoral de um partido com um projecto político reaccionário e fascizante, uma forte dimensão xenófoba e racista e um marcado discurso de ódio é, sem dúvida, um desenvolvimento particularmente negativo...

A coragem de sempre

«Professora comunista atirada de avião». A primeira página do Correio da Manhã chamava assim a atenção, esta terça-feira, para a publicação da última obra do Papa Francisco. Nas páginas interiores, afirma-se que Francisco, na altura ainda padre na sua Argentina natal, teria tentado, sem sucesso, salvar Esther...

Não vá o diabo tecê-las!

O Estado de direito está em declínio em toda a União Europeia, sendo o risco de deterioração mais elevado nos países onde os partidos de extrema-direita estão no poder ou a influenciar o poder. O alerta, se é que é disso que se trata, consta do relatório divulgado esta segunda-feira pela rede de defesa das liberdades...