Ainda sobre as eleições nos EUA

Albano Nunes

A luta não pode ficar na ex­pec­ta­tiva

O Par­tido tomou pron­ta­mente po­sição sobre as elei­ções nos EUA e, em­bora o es­sen­cial es­teja já con­tido na nota do seu Ga­bi­nete de Im­prensa de 6.11.24, pra­ti­ca­mente ig­no­rada pela co­mu­ni­cação so­cial do­mi­nante, é im­pos­sível fugir a um tema que con­tinua a marcar a agenda me­diá­tica e a sus­citar da parte dos ha­bi­tuais fa­ze­dores de opi­nião todo o tipo de con­tor­ci­o­nismos para, ao fim e ao cabo, de­fender um sis­tema de­ca­dente e em de­clínio no plano mun­dial e fazer crer que o mundo está sus­penso do que venha a de­cidir a nova ad­mi­nis­tração norte-ame­ri­cana, pro­cu­rando ali­mentar a ex­pec­ta­tiva no campo das forças da paz, pro­gres­sistas e anti-im­pe­ri­a­listas.

Neste tempo de ins­ta­bi­li­dade e in­cer­teza que, como jus­ta­mente as­si­nalam as Teses – Pro­jecto de Re­so­lução Po­lí­tica para o XXII Con­gresso, ca­rac­te­riza a si­tu­ação in­ter­na­ci­onal, não faltam in­ter­ro­ga­ções quanto ao pró­ximo de­sen­vol­vi­mento de si­tu­a­ções que exigem pronta so­lução po­lí­tica (como na Pa­les­tina ou na Ucrânia) ou quanto à ne­ces­si­dade de pôr fim à cor­rida aos ar­ma­mentos e à es­ca­lada de con­fron­tação pro­mo­vida pelo im­pe­ri­a­lismo, par­ti­cu­lar­mente na Eu­ropa e, cada vez mais, na re­gião Ásia-Pa­cí­fico, vi­sando “conter” a China. Mas dentre essa densa nuvem de in­cer­tezas uma cer­teza se impõe: a de que “é pela luta que lá vamos”, luta que não pode ficar na ex­pec­ta­tiva, antes deve in­ten­si­ficar-se na sua di­mensão po­pular e ti­rando também par­tido das di­fi­cul­dades e con­tra­di­ções que per­correm o campo im­pe­ri­a­lista (bem vi­sí­veis tanto no quadro da UE como nas suas re­la­ções de ri­va­li­dade/​sub­missão com os EUA) e da “ban­car­rota” po­lí­tica e ide­o­ló­gica do ca­pi­ta­lismo norte-ame­ri­cano que as elei­ções pu­seram ainda mais a nu.

“Ban­car­rota” que está pa­tente no de­gra­dante es­pec­tá­culo de um sis­tema elei­toral que nada tem que ver com o prin­cipio de­mo­crá­tico de “uma pessoa um voto” e numa cam­panha es­can­da­lo­sa­mente do­mi­nada pelo di­nheiro, pela luta entre di­fe­rentes frac­ções da classe do­mi­nante e di­fe­rentes grupos eco­nó­micos por po­si­ções de poder, pela ma­ni­pu­lação da co­mu­ni­cação so­cial e das redes so­ciais (de que Elon Musk é o exemplo mais es­pan­toso, sem es­quecer Soros, Jef­frey Bezos e ou­tros), em que o es­pec­tá­culo e o in­sulto es­condem o vazio da men­sagem po­lí­tica, aliás coin­ci­dente no es­sen­cial. Tudo isto e muito mais mostra o que na re­a­li­dade é aquele país que, apre­sen­tado como o “farol da li­ber­dade” e a po­tência “in­dis­pen­sável” pre­tende dar li­ções de li­ber­dade e de­mo­cracia a todo o mundo, sempre em­pe­nhado em de­sa­cre­ditar nou­tros países re­sul­tados elei­to­rais que não cor­res­pondam aos seus in­te­resses e em pro­vocar “re­vo­lu­ções co­lo­ridas” e “guerras hí­bridas” “pró-oci­den­tais”.

Seria er­rado su­bes­timar o que o re­sul­tado das elei­ções norte-ame­ri­canas re­pre­senta de en­co­ra­ja­mento ao avanço das forças de ex­trema-di­reita, ra­cistas e fas­ci­zantes, no­me­a­da­mente na Eu­ropa onde ocupam já im­por­tantes po­si­ções de poder em vá­rios países. O com­bate ao fas­cismo tornou-se de facto uma frente de luta pri­o­ri­tária, luta que en­tre­tanto, só po­derá ser tra­vada com su­cesso, iden­ti­fi­cando os in­te­resses de classe que serve e com­ba­tendo as sua raízes so­ciais e ide­o­ló­gicas e não, como fazem al­guns, ig­no­rando-as. E muito menos, ma­ni­pu­lando ge­nuínos sen­ti­mentos an­ti­fas­cistas, fo­men­tando a ideia de que o com­bate ao fas­cismo passa pela ren­dição ao ne­o­li­be­ra­lismo e ao im­pe­ri­a­lismo e o ali­nha­mento com as forças que os servem.

 



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