A vida de Octávio Pato é um apelo à resistência
«Octávio Pato foi um dirigente comunista com uma vida de coragem dedicada à causa revolucionária, foi um incansável construtor do Partido», afirmou Paulo Raimundo na sessão evocativa realizada em Lisboa anteontem, 1, dia em que faria 100 anos.
O legado de Octávio Pato constitui um apelo à resistência e à intervenção
O salão da Casa do Alentejo encheu-se para celebrar a vida e a luta revolucionária de um destacado dirigente comunista e resistente antifascista, que atravessou a dureza da luta clandestina (e sofreu as brutais violências que tal ousadia acarretava), o exaltante período revolucionário e as intensas batalhas em defesa de Abril e das suas conquistas.
Na sala repleta, para além dos seus familiares – os filhos Álvaro, Isabel, Rui, João e Ana, a companheira, Paula, e alguns dos seus netos –, estavam camaradas que com ele travaram lutas e partilharam tarefas. E outros, muitos outros, que nem militantes (ou até nascidos) eram quando faleceu, em 1999. A dar razão a Paulo Raimundo quando afirmou, na sua intervenção, que o legado de Octávio Pato constitui, «no tempo em que vivemos, um exemplo e um apelo à resistência, à intervenção confiante, um estímulo aos que lutam pela liberdade e democracia, por uma sociedade sem exploradores nem explorados, pelo socialismo e o comunismo».
Na sua intervenção, Paulo Raimundo resumiu «quase seis décadas de militância, com variadas tarefas e diversas responsabilidades» desempenhadas por Octávio Pato, nascido em Vila Franca de Xira em 1925 que começou a trabalhar aos 14 anos: na Federação das Juventudes Comunistas Portuguesas, primeiro, no PCP, depois, onde assumiu os pseudónimos de «Melo» e «Frazão».
Esteve na preparação e organização das greves de 8 e 9 de Maio de 1944 e, depois, na organização da solidariedade aos grevistas e suas famílias. Já como funcionário do Partido, condição à qual passou em 1945, foi responsável pelo trabalho de juventude e pela criação e dinamização, juntamente com outros jovens comunistas, do MUD Juvenil. Entre muitas outras tarefas, Octávio Pato foi também responsável pelas tipografias centrais, sendo o autor dos textos que marcam a primeira página do último Avante! clandestino: «Aliar à luta antifascista os patriotas das forças armadas» e «Não dar tréguas ao fascismo».
Como tantos outros comunistas, lembrou Paulo Raimundo, Octávio Pato «conheceu a brutalidade do cárcere fascista. Preso pela PIDE em 15 de Dezembro de 1961, tendo sido um dos que foi mais brutalmente torturado. Para além de espancamentos, foi sujeito à tortura do sono, totalizando 18 dias e noites sem dormir». A tudo resistiu corajosamente, valorizou. O Secretário-Geral do PCP lembrou ainda a destacada militância de Octávio Pato após a Revolução, enquanto dirigente do PCP, deputado e candidato à Presidência da República. Uma exposição patente no átrio da Casa do Alentejo e um filme ali exibido destacavam estes e outros momentos.
Companheiro, pai e avô
Se as palavras de Paulo Raimundo impressionaram, pelo que revelaram da dimensão revolucionária e humana do comunista ali homenageado, as de Álvaro Pato, proferidas em nome da família, emocionaram. O filho mais velho de Octávio Pato, que também foi resistente antifascista e preso político, falou das relações com o pai, que apesar de todos os constrangimentos procurou sempre «o contacto, o gesto, a comunicação».
Recordou a infância passada com os avós e a reunião clandestina em que, com nove anos, viu o pai pela primeira vez. Lembrou a prisão dos irmãos Isabel e Rui (com seis e dois anos) juntamente com a mãe deste, Albina Fernandes, e as visitas que fez à prisão de Peniche, para ver o pai. Destacou a campanha pela sua libertação e a reunião que teve com ele e de como se beijaram às escondidas dos restantes camaradas, que não sabiam – nem podiam saber – que estavam perante pai e filho. Referiu-se à carta que recebeu do pai, enviada da Checoslováquia, quando ele próprio estava preso, a dar-lhe ânimo. E recorda como o viu na televisão, logo após o 25 de Abril, a mobilizar para o 1.º de Maio.
Apesar da intensa da actividade política, Álvaro Pato recordou o pai presente nos momentos mais importantes da família: os casamentos, os aniversários, o Natal. «Ao longo da vida, o Octávio esteve sempre connosco, ajudando na medida do possível, apesar das circunstâncias», lembrou, salientando a forma solidária como foi tratado pelo PCP nos seus últimos anos de vida e o carinho que o rodeou nos períodos mais difíceis da doença. O seu pai, lembrou ainda Álvaro Pato, «viveu com muita alegria e muitas paixões».
Mais do que palavras
Para além das palavras – e houve ainda oportunidade de ouvir as do próprio Octávio Pato, na voz de Edite Queiroz –, a sessão evocativa fez-se ainda de música, daquela que sempre acompanha as lutas dos trabalhadores e dos povos. O projecto Cancioneiro Clandestino, oriundo como Octávio Pato de Vila Franca de Xira, reinventou sonoridades populares e revolucionárias. «Vozes ao alto, unidos como os dedos da mão», ouviu-se a várias vozes.
Cátia Lapeiro, do Comité Central, dirigiu a sessão e lembrou que as comemorações continuam: já no domingo, 6, às 15h30, com a inauguração de uma exposição no Ateneu Artístico Vilafranquense; no dia 12, à mesma hora, será descerrada uma placa evocativa da efeméride, na rua Octávio Pato, em Vila Franca de Xira, seguindo-se um desfile até ao largo da Câmara Municipal.
«Num desses “interrogatórios” fui impedido de dormir durante 11 dias e noites. De outra vez essa “tortura do sono” prolongou-se durante sete dias e noites consecutivas, acompanhada de brutais espancamentos, que me deixaram o corpo com inúmeras equimoses.»
(Intervenção no tribunal fascista, 1962)
«Com a promulgação da Constituição inicia-se um novo ciclo da história do nosso país. A partir de hoje o povo português passará a ter na Constituição um valioso instrumento, que deve tomar nas suas mãos, para o defender e utilizar na luta pela consolidação da democracia e das conquistas fundamentais da Revolução».
(Assembleia Constituinte, 1976)
«A maior de todas as riquezas do Partido, a riqueza de termos milhares e milhares de militantes profundamente devotados aos interesses da classe operária e de todos os trabalhadores, aos interesses de todo o povo e às conquistas do Portugal de Abril.»
(IX Congresso do PCP, 1979)
«É neste grande e riquíssimo colectivo humano que se alicerça a nossa força, uma força insubstituível na luta dos trabalhadores e de todas as camadas sociais que aspiram a um Portugal democrático, independente e socialista.»
(XIV Congresso do PCP, 1992)