A opção e os silêncios

Gustavo Carneiro

Num debate televisivo recente, o Secretário-Geral do PCP sublinhou aquela que é uma opção central do nosso tempo: «ou alimentamos a guerra e a escalada, até uma escalada que não sabemos qual será – em que nos querem convencer de que os nossos filhos e os nossos netos têm de ir para uma guerra –, (…) ou então vamos investir tudo o que teremos de investir para evitar o descalabro.» E recorreu à história para lembrar que momentos houve em que a guerra parecia iminente, mas que foi possível recuar e «recuar desarmando» – numa provável referência aos acordos de desanuviamento e desarmamento celebrados nas décadas de 1970 e 1980, tempos de forte luta pela paz em todo o mundo e também em Portugal.

Esta mensagem passou despercebida na generalidade da comunicação social, mais empenhada em insistir na tese do apoio a Putin – por mais que Paulo Raimundo tenha reafirmado, pela enésima vez, tratar-se de um regime com opções políticas e de classe às quais o PCP se opõe e combate – e na ideia de uma qualquer excentricidade dos comunistas portugueses.

Mas o PCP não está só. Há dias, 100 mil pessoas manifestaram-se em Roma contra os planos militaristas e armamentistas da UE: rejeitaram que enquanto milhões de cidadãos e empresas estarão sobrecarregados por «aumentos de preços sem precedentes», com «facturas altíssimas, salários insuficientes, um sistema de saúde colapsado», o governo italiano opte por «destinar milhares de milhões para despesa militar». Os promotores da manifestação – partidos políticos, sindicatos, organizações sociais – salientam que não querem um plano de rearmamento de 800 mil milhões de euros, mas sim «uma via para a paz que tenha a Europa como protagonista».

Aqui ao lado, em Espanha, 16 mil personalidades da cultura, das artes e de outras áreas subscreveram o Manifesto Não nos resignamos ao rearmamento e à guerra na Europa. Este rearmamento, garantem, não trará a paz nem contribuirá para a distensão, antes pelo contrário, aproximar-nos-à da guerra. Recordam que as operações militaristas costumam fazer-se acompanhar por «retrocessos nos direitos, liberdades e políticas sociais, originam medo e alarme social, contexto ideal para normalizar mecanismos de repressão e de autoritarismo». E recusam que o dinheiro «dos nossos hospitais públicos, das nossas escolas e universidades públicas, (…) as nossas políticas de protecção e cobertura social» possa ser utilizado para comprar tanques, metralhadoras, caças e mísseis para a guerra «porque assim o decidiram as elites belicistas que governam» actualmente a Europa e os EUA».

Que estas duas iniciativas, como outras, não tenham tido expressão mediática em Portugal diz menos sobre o seu valor ou oportunidade do que sobre os média e os seus donos.

Da nossa parte, insistiremos!

 



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