O espectro

Jorge Cadima

O espectro do comunismo mete-lhes medo

O Presidente da República Checa assinou uma alteração ao Código Penal «criminalizando a ideologia comunista, equiparando-a à propaganda nazi» (msn.com, 19.7.25). A lei prevê penas de prisão até cinco anos – prorrogáveis até 10 – para quem promova o movimento comunista. O Partido Comunista da Boémia e Moravia (KSCM) já declarou que «ninguém calará nunca o KSCM e os valores que os comunistas defendem», lembrando que «o Governo [do PM] Fiala é responsável pela introdução da censura, a proibição de portais na Internet, a intimidação, perseguição e criminalização de opositores políticos, bem como despedimentos por razões políticas» (30.5.25). Mais um país na UE que, enchendo a boca com palavras como democracia, mostra a sua verdadeira natureza.

Não é a primeira vez que tentam proibir o Partido Comunista naquele país. Em Dezembro de 1938, o então Presidente Hacha anunciou na sua mensagem de Natal a decisão de «dissolver formalmente o Partido Comunista na Checoslováquia. Retirou os mandatos a 25 deputados e 13 senadores comunistas e demitiu o vice-presidente comunista da Câmara de Praga e centenas de funcionários» (Sydney Morning Herald, 26.12.1938). Apenas três meses antes, os primeiros-ministros das democracias burguesas de Inglaterra e França, reunidos com Hitler e Mussolini mas sem o legítimo governo checo, haviam entregue à Alemanha nazi partes da Checoslováquia. Os Acordos de Munique foram apenas o prelúdio. Em Março de 1939, Hitler ocupou o resto do país, perante o silêncio anglo-francês. Mas os dirigentes da burguesia checa – tal como os franceses – estavam ocupados a perseguir os comunistas, opositores firmes da traição de Munique e do avanço do fascismo. Em vez de organizar a defesa do país, preparavam a sua entrega.

Agora proibida foi a “ideologia” comunista. Quem divulgar a obra de Marx – um dos maiores pensadores na história da Humanidade – vai ser condenado a cinco anos de prisão? Quem divulgar um livro de Lénine explicando as origens da I Guerra Mundial irá fazer companhia aos presos por roubo? Mas afinal, o comunismo não estava morto e enterrado? Porquê esta perseguição das ideias, 36 anos após o alegado “fim do comunismo” em terras checas? Só por as sondagens preverem o regresso dos comunistas ao Parlamento nas eleições de Outubro?

Segundo a imprensa, a lei não nomeia o fascismo em geral, mas apenas a sua variante alemã dos anos 30, o nazismo. Mussolini, Franco e Salazar passam o crivo. E os fascistas ucranianos, que homenageiam publicamente os colaboracionistas com o nazismo? E essa expressão medonha do fascismo nos nossos dias que é o governo israelita? Quando a Assembleia Geral da ONU aprovou, com 143 votos a favor, recomendar o reconhecimento do Estado da Palestina como membro pleno da ONU, o governo checo foi um de apenas nove votos contra (10.5.24). No mês passado, quando 149 Estados da ONU aprovaram uma resolução «exigindo um cessar-fogo imediato, incondicional e duradouro» em Gaza, e «condenando firmemente o uso da fome como arma de guerra», o governo checo absteve-se. A cumplicidade com os genocidas vai de mãos dadas com a perseguição dos comunistas.

O grande capital europeu nada tem para oferecer aos povos excepto guerra, miséria e vassalagem aos EUA. Teme as massas, embora estas ainda não tenham ganho consciência da sua força. À cautela, afina os mecanismos de repressão. Afinal, o espectro do comunismo mete-lhes medo.



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