Denunciar as mistificações neoliberais, travar o assalto à Segurança Social

Fernanda Mateus (Membro da Comissão Política)

O Governo quer moldar a Segurança Social às orientações neoliberais

O Governo PSD/CDS tem na forja o ataque ao regime previdencial – que representa o núcleo central do sistema público de Segurança Social, universal e solidário –, que pretende transferir parcelas das contribuições do trabalho para os fundos privados de pensões. Trata-se de um processo de subversão do actual sistema de repartição para impor modalidades de capitalização, colocando o grande capital e o Governo como promotores da expansão dos complementos de reforma (individuais e profissionais) através da criação de diversas modalidades de incentivos (fiscais e outros) às empresas, incluindo a redução ou isenção da Taxa Social Única.

Isto é para servir que interesses? Obviamente que se trata de “moldar” o sistema às orientações neoliberais, tornando-o um instrumento ao serviço do capital financeiro, sujeitando as contribuições dos trabalhadores e as suas reformas à roleta da especulação financeira.

A suposta preocupação com a (in)sustentabilidade do sistema é uma gigantesca mistificação que visa desviar vultosas receitas, que são a fonte de financiamento do regime previdencial, para fins alheios aos seus princípios e finalidades: pela captura directa desses recursos, desde logo, mas também pela desvinculação do grande capital do pagamento das contribuições do trabalho. Uma opção que conta com o apoio do Governo PSD/CDS na sua política de baixos salários, de que é exemplo o adiamento para 2029 do aumento do salário mínimo para 1100 euros e do salário médio para 1750 euros só em 2030.

 

Suplemento não resolve

Não é a sustentabilidade futura do Sistema Público que está em causa para o governo PSD/CDS, com a convergência da Iniciativa Liberal e do Chega e o silêncio cúmplice do PS. Pelo contrário, é repercutir na Segurança Social um modelo de baixos salários e baixas reformas, destruindo a justiça contributiva e de solidariedade intergeracional entre trabalhadores.

Uma opção evidente na decisão do Governo de atribuir no mês de Setembro um suplemento de 200, 150 e 100 euros para pensões até 1567, 50 euros, uma medida pontual, de pendor assistencialista, que não se repercutirá na elevação dos montantes das pensões. Quando o que é prioritário é proceder ao aumento extraordinário de todas as pensões para garantir uma percentagem mínima de 5%, com um montante mínimo de actualização de 70 euros por pensionista, com efeitos a 1 de Janeiro de 2025, como o PCP preconiza.

A desvalorização das pensões e reformas do regime previdencial é acompanhada pelo objectivo de subversão do regime não contributivo, desvirtuando o seu papel complementar no assegurar de prestações sociais que asseguram direitos de cidadania, tendo por base a justiça distributiva, com financiamento por transferências do Orçamento do Estado.

O Programa do Governo deixa claro que visa alterar e uniformizar critérios de atribuição das actuais prestações sociais deste regime (incluindo a Prestação Social de Inclusão), sem ter em conta a natureza dos direitos que visam assegurar, a par da adopção de critérios mais apertados de acesso a quem delas precisa e colocando os seus beneficiários sob suspeita. No que respeita ao RSI, as alterações preconizadas incluem a criação de “obrigações de solidariedade”, impondo sobre todas as prestações o “acompanhamento” dos beneficiários visando garantir o “cumprimento dos compromissos assumidos de uma entrada célere no mercado de trabalho”.

 

Direito de todos

O sistema plasmado na Constituição, assente no regime previdencial, é a espinha dorsal do sistema público conquistado com a Revolução de Abril e um instrumento insubstituível no combate às desigualdades na distribuição do rendimento entre o capital e o trabalho. Um sistema cujo regime não contributivo se assume também como instrumento de combate à pobreza e exclusão social.

Um sistema que se tem vindo a robustecer, como é destacado no Relatório da Evolução Orçamental da Segurança Social 2024 – que registou o mais elevado excedente desde 2010: 5595 milhões de euros. A receita de contribuições e quotizações continuou a revelar-se determinante para o crescimento da receita efectiva (+10,3%) e é inseparável do aumento do número de trabalhadores com remunerações declaradas à Segurança Social, bem como os aumentos salariais, que sendo insuficientes para repor o poder de compra dos trabalhadores, evidenciam o seu contributo decisivo para o financiamento do sistema.

O Fundo de Estabilização Financeira visa garantir reservas acumuladas, um montante equivalente ao pagamento de pensões por um período de dois anos: o seu valor no final de 2024 era de 35 879 milhões de euros, atingindo mais de 40 mil milhões em Julho deste ano. Estes são recursos dos trabalhadores a que o capital quer deitar a mão.

Sabemos que o Governo e os seus aliados têm ao seu dispor uma gigantesca máquina de propaganda.

Novos perigos exigem que se combata mistificações e mentiras, ampliando a luta dos trabalhadores, dos reformados, da juventude, das mulheres, das pessoas com deficiência. Uma luta contra os retrocessos nos direitos, por melhores prestações sociais, pelo direito de todos à Segurança social. E neste combate contam com o PCP.



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