Ciência na Festa do Avante!

Visita guiada à biodiversidade

Hugo Janeiro

Associando-se à comemoração do Ano Internacional da Biodiversidade, o Espaço Ciência da Festa do Avante! tem como tema central a variedade de genes, espécies e ecossistemas que constituem a vida no planeta. Com algumas novidades, este ano os visitantes poderão usufruir de um autêntico roteiro sobre a matéria, sempre de uma perspectiva cientificamente rigorosa e de classe, didáctica e interactiva, como sublinharam os membros do grupo de trabalho em conversa com o órgão central do PCP.

«O capitalismo não conserva, não protege, não integra»

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As inovações começam logo no espaço exterior do pavilhão, que terá uma fachada mais apelativa onde pontificam um «painel de 28 metros, com três tiras representando as espécies dos meios aquático, terrestre e aéreo», explicou Aurora Bargado. Para a parte frontal, a artista plástica está ainda a elaborar «uma árvore em cujas folhas - recicladas a partir de chapas de offset para contribuir para a preservação da diversidade biológica, notou - vão surgir alguns animais em vias de extinção».

Quanto à estrutura, também não se repete totalmente, estando previstas inovações «na arrumação do espaço interior», a começar por um percurso mais intuitivo e por «um auditório de tamanho mais generoso», acrescentou Patrícia Bargado.

Lá dentro, a biodiversidade estará em destaque. O tema não foi escolhido ao acaso. «Em 2010 assinala-se o Ano Internacional da Biodiversidade e, por isso, decidimos associar a Festa do Avante! a esta comemoração», explicou Susana Varela.

«O ano passado já abordámos de alguma forma esta matéria, uma vez que celebrámos os 200 anos de Charles Darwin e os 150 anos da publicação da “Origem das Espécies”. Apesar disso, a exposição que estamos a preparar vai ser muito diferente, dado que se antes abordámos a evolução da vida na terra, agora procuramos explicar a importância da sua preservação e a sua relação com a actividade humana», sublinhou.

 Alerta geral

 Este Ano Internacional da Biodiversidade tem, no entanto, um contexto histórico que vale a pena conhecer.

«Em 1992, a cimeira ocorrida no Rio de Janeiro constatou que a acção humana estava a destruir a natureza e, com isso, a reduzir as possibilidades de vida na Terra, eliminando simultaneamente referências culturais dos povos. A partir dessa conferência, estabeleceu-se um tratado internacional para a protecção da biodiversidade, chamado Convenção para a Diversidade Biológica. A questão é que, desde então, a sua aplicação prática tem sido escassa. Até 2010, era necessário reduzir energicamente a destruição dos ecossistemas, o que está a acontecer a um ritmo muito superior ao passado. Estamos a cometer os mesmos erros e a inacção prende-se, evidentemente, com opções políticas», frisou Susana Varela.

Ora um dos objectivos da exposição patente no Espaço Ciência da Festa do Avante! é explicar não apenas a importância da diversidade biológica e da sua conservação, mas lembrar igualmente que nós somos parte integrante dela, falando do que se passa em Portugal e das soluções, incluindo os pequenos passos ao alcance de cada um», acrescentou.

«Com o desaparecimento das espécies, a natureza não funciona em equilíbrio. O ar puro, a água pura e os solos férteis deixam de existir», alertou ainda.

Exemplo tangível

A introdução de espécies invasoras por parte de multinacionais ligadas à agro-indústria, as chamadas alterações climáticas e os efeitos directos e indirectos do sistema na biodiversidade são outras questões a tratar, mas uma perspectiva mais tangível referida por Joana Dinis aproxima-nos da problemática.

«Vamos salientar a centralidade dos microorganismos como sustentáculos de toda a biodiversidade. Bactérias e fungos e microalgas são como que a base de toda a vida», na medida em que desempenham, respectivamente, «papéis fundamentais na decomposição dos organismos (processo sem o qual não seria possível a existência de nutrientes básicos para a renovação das espécies); e na produção de oxigénio, sendo que as microalgas são mesmo uma das principais fontes de produção de O2».

Sem estes microorganismos, ameaçados pelo predador modo de produção capitalista, o ciclo da vida interrompe-se.

 As propostas e o projecto do PCP

Para que uma catástrofe não aconteça é necessário agir. «Na exposição, vamos mostrar as posturas, as propostas e o projecto dos comunistas portugueses e as diferenças com outras correntes ideológicas. Pretendemos afirmar que as nossas propostas defendem a biodiversidade e que almejamos um sistema oposto ao que esgota os recursos naturais», disse Augusto Flor.

«A lógica capitalista assenta na exploração máxima dos recursos muito rentáveis. Os recursos menos rentáveis são abandonados, o que se reflecte no equilíbrio do planeta. O capitalismo não conserva, não protege, não integra. Aplica à biodiversidade a lógica do seu modo de produção com as consequências que estão à vista», concluiu.


Aprender experimentando


Como já é habitual, o Espaço Ciência terá uma área dedicada às experiências e observações. «Este ano, a propósito da biodiversidade, vamos pôr o visitante a examinar seres existentes no solo que só são possíveis de vislumbrar através de uma lupa binocular», adiantou Anabela Silva. «Para além disso, vamos tentar relacionar as plantas com a nossa alimentação diária, e vamos ensinar a construir jardins em vasos, o que implica a construção de um terrário para observação», aduziu.

«Ainda relacionado com os promotores directos e indirectos da alteração dos ecossistemas, que conduzem à diminuição da biodiversidade, teremos experiências sobre chuvas ácidas e o ciclo da chuva, e brincadeiras com várias sementes, pedindo às pessoas que as identifiquem usando um de dois sentido: o tacto ou a visão», destacou.


A biodiversidade nas artes e letras


Uma das abordagens mais surpreendentes do pavilhão da Ciência é a que diz respeito às artes e letras, relacionando-as com o tema que em cada ano se destaca. «Na nossa pesquisa, encontrámos um poema de Vitorino Nemésio dedicado à minhoca», conta Alice Figueira. «Nunca nos lembramos destes seres que nos rodeiam e que têm tanta importância na nossa vida».

«Vamos igualmente ter passagens de “As Viagens na Minha Terra”, de Almeida Garrett, obra na qual ele descreve o Vale de Santarém como o éden onde tudo está no seu lugar, onde existe equilíbrio entre o homem e o meio ambiente, de tal forma que cria uma personagem chamada joaninha, cujos olhos são verdes como a natureza», explicou com entusiasmo.

«Depois, trazemos coisas mais antigas, como a Ilha dos Amores, de “Os Lusíadas”, local descrito como idílico, ou “A Casa Grande de Romarigães”, de Aquilino Ribeiro, que numa passagem descreve um pinhão que um pé de vento arrancou ao dormitório da pinha mãe, e uma bolota que a árvore deixou cair no solo, acto que repetido mil vezes gerou a floresta».

Finalmente, nesta dialéctica entre as artes e letras e as ciências ditas duras, Alice Figueira levanta o véu ao tratamento que este ano será dado às fábulas e aos contos tradicionais, «onde aparece o lobo, a coruja, a raposa malandra, esses bichos associados a histórias cujo objectivo é sempre ensinar qualquer coisa».

 

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 Para miúdos e graúdos

 

 Certa e segura é a existência de uma área dedicada às crianças, mas que, talvez não tão estranhamente, acaba sempre por atrair igualmente os mais graúdos, lembrou Lurdes Silva.

«Vamos ter actividades mais recorrentes, como pinturas e recortes relacionados com o tema», mas como já é da praxe, «vamos adaptar um jogo totalmente elaborado por nós, tipo de pistas, de forma a que retenham alguma informação da exposição que apresentamos», garantiu.


Experiência polivalente


Em três dias de Festa, sobra tempo para usufruir diversas experiências e ambientes. «Foi sempre esse o sentido que procurámos dar ao auditório do Espaço Ciência, o qual, este ano, se chamará polivalente precisamente porque por lá encontraremos os conteúdos da exposição, os filmes, os debates, o teatro ou a poesia. Estas duas últimas vão regressar este ano à Festa», disse Silvia Silva.

Momento alto será, também, a comemoração do décimo aniversário da Ciência na Festa do Avante!, efeméride que merecerá uma mostra sobre o passado e um debate onde se espera ter presentes muitos dos que colaboraram na concepção, construção e realização de uma década de ciência na Festa com espaço próprio, explicou.

Quanto aos debates, «vamos dedicar um aos ecossistemas no bem-estar humano, outro ao valor económico da biodiversidade, e um terceiro intitulado «agir para proteger, o que é que eu posso fazer?», referiu Silvia Silva.

Este último debate implica um trabalho já em curso. Trata-se de uma pesquisa etnográfica.

«A Festa fica num triângulo. Estamos a recolher testemunhos sobre a diversidade biológica o aparecimento e o desaparecimento de espécies em Sesimbra junto dos pescadores. Já em Palmela, uma região de grande biodiversidade, falamos das actividades agroflorestais; e em Alcochete, zona húmida interior, procuramos recolher os relatos sobre a avifauna, os impactos da ponte no rio, etc.», esclarece Augusto Flor.

«Na Festa apresentamos tudo isto comentado por especialistas em várias disciplinas, e vamos tentar trazer os entrevistados, que poderão ainda ver as fotos e os textos resultantes da pesquisa e, sem preconceitos, contribuírem para o debate junto com os cientistas convidados», concluiu.


Exposição e jogo em DVD


Quem quiser levar a Festa da Ciência para casa, este ano pode fazê-lo. Vai estar disponível um DVD que, para além do conteúdo integral da exposição, incluirá o jogo de computador disponível na área dedicada às crianças.



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