A Gládio está presente

Jorge Cadima

Cala-se a im­prensa em nome da razão de Es­tado

Nos anos 80 o Lu­xem­burgo foi palco duma vin­tena de aten­tados bom­bistas. Vol­vidos quase 30 anos, dois po­lí­cias estão a ser jul­gados nesse país, acu­sados pelos aten­tados. Mas a mais es­cal­dante in­for­mação é alvo de férrea cen­sura me­diá­tica, apenas fu­rada pelo jor­na­lista Ra­fael Poch do ca­talão La Van­guardia. Em ar­tigo (13.4.13) de tí­tulo «A NATO tro­peça de novo com o seu pas­sado ter­ro­rista», Poch conta que um his­to­ri­ador alemão, An­dreas Kramer, de­clarou em tri­bunal que «o autor de 18 dessas 20 bombas foi seu pai, um agente dos ser­viços se­cretos ale­mães, BND, que agia por conta duma es­tru­tura se­creta da NATO. [] É assim que a cons­pi­ração Gládio, re­la­ti­va­mente bem co­nhe­cida em países como a Itália e Bél­gica, des­ponta agora no Lu­xem­burgo». No en­redo es­taria ainda en­vol­vido «o ex-chefe dos ser­viços se­cretos do Lu­xem­burgo». Se­gundo Kramer, o seu pai também «par­ti­cipou no aten­tado bom­bista mais grave da his­tória alemã do pós-guerra, a 26 de Se­tembro de 1980 na Ok­tober Fest, a festa da cer­veja de Mu­nique, que deixou um saldo de 13 mortos e 213 fe­ridos e que foi in­ve­ro­si­vel­mente atri­buído à acção de um único neo-nazi, morto na ex­plosão». Kramer de­clarou que «os aten­tados eram co­or­de­nados peloCo­mité Clan­des­tino Aliado, sob a di­recção do Ge­neral alemão Le­o­pold Cha­lupa [...] co­man­dante em chefe das tropas da NATO na Eu­ropa Cen­tral (CIN­CENT) entre 1983 e 1987». Cha­mados a depor no jul­ga­mento estão «o pri­meiro-mi­nistro lu­xem­bur­guês Jean-Claude Juncker, o ex-pri­meiro-mi­nistro e ex-pre­si­dente da Co­missão Eu­ro­peia Jac­ques Santer», um ex-mi­nistro da Jus­tiça e dois ir­mãos do Grão-Duque do Lu­xem­burgo. Mas, como es­creve Ra­fael Poch (27.4.13), pas­sadas duas se­manas «ne­nhum juiz alemão se in­te­ressou pelo as­sunto, nem chamou Kramer a depor. Nin­guém o acusou de mentir, nem de ser um char­latão. Ne­nhum meio de co­mu­ni­cação im­por­tante se fez eco [das suas pa­la­vras]. Si­lêncio.» É assim o «quarto poder» na «al­deia global» das «de­mo­cra­cias oci­den­tais». À per­gunta de como é que o seu pai jus­ti­fi­cava a «lou­cura», Kramer res­ponde: «Tra­tava-se de tirar os co­mu­nistas do ca­minho [] Apenas se queria go­vernos de di­reita, para ter um ba­lu­arte contra o co­mu­nismo []. Acre­di­tava-se que os co­mu­nistas ti­nham de­ma­siada in­fluência». O ob­jec­tivo era «criar medo e for­ta­lecer a se­gu­rança in­terna. Para isso havia que en­cenar ter­ro­rismo. E quem fez isso foram ofi­ciais em con­tacto com os Es­tados Unidos». Um mi­nistro do ex-chan­celer alemão Helmut Sch­midt, An­dreas von Bülow, igual­mente en­tre­vis­tado pelo La Van­guardia (5.5.13) de­clara «quando se trata da Gládio, e é disso que se trata neste caso, como se­gu­ra­mente o foi no caso da RAF (o bando Ba­ader-Mei­nhof, o prin­cipal grupo ter­ro­rista alemão), cala-se a im­prensa em nome da razão de Es­tado [...]. Vimo-lo no 11 de Se­tembro, quando se evi­taram as per­guntas crí­ticas». Pa­lavra de ex-mi­nistro alemão!

As con­fis­sões sobre o ter­ro­rismo da NATO e dos ser­viços se­cretos im­pe­ri­a­listas lançam luz sobre o pre­sente. Há dias, dois aten­tados ter­ro­ristas com carros ar­ma­di­lhados ma­taram de­zenas de pes­soas na ci­dade turca de Reyhanli. A Tur­quia, país membro da NATO, é a prin­cipal base dos bandos ter­ro­ristas que já co­me­teram idên­ticos aten­tados em vá­rias ci­dades sí­rias. Mas as au­to­ri­dades turcas apres­saram-se a culpar o «re­gime sírio» pelos aten­tados. Hoje mesmo o pri­meiro-mi­nistro Er­dogan es­tará na Casa Branca a pedir uma maior in­ter­venção dos EUA na guerra. E a co­mu­ni­cação so­cial de re­gime nunca re­fe­rirá que An­tió­quia, ca­pital da pro­víncia de Reyhanli, fora dias antes palco duma ma­ni­fes­tação de mi­lhares de pes­soas pela paz e contra o en­vol­vi­mento turco na agressão à Síria, or­ga­ni­zada pelo mo­vi­mento da Paz e com grande par­ti­ci­pação dos co­mu­nistas turcos.



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