Comentário

Políticas de integração:<br>falhanço ou intencionais?

João Pimenta Lopes

Nas úl­timas se­manas, cum­prindo o de­sígnio e com­pro­misso de manter uma es­treita e in­tensa li­gação à re­a­li­dade na­ci­onal, foi pos­sível, no con­texto de vi­sitas ao dis­trito de Se­túbal, tomar con­tacto com re­a­li­dades que cer­ta­mente se re­pli­carão nou­tras re­giões do País. Re­a­li­dades que não se des­ligam das po­lí­ticas de di­reita que su­ces­sivos go­vernos têm pros­se­guido ao longo das úl­timas quatro dé­cadas, mas que de­correm também e estão li­gadas às ori­en­ta­ções e prá­ticas po­lí­ticas da União Eu­ro­peia a que Por­tugal con­tinua sub­me­tido.

Na pri­meira vi­sita, a um grupo de jo­vens, no Seixal, reu­nidos no âm­bito de uma as­so­ci­ação local em torno das opor­tu­ni­dades do ser­viço de vo­lun­ta­riado eu­ropeu e do Erasmus+, foi pos­sível con­firmar al­gumas das crí­ticas e pre­o­cu­pa­ções que o PCP tem vindo a fazer sobre estes ins­tru­mentos.

Por um lado o facto de que a in­te­gração de vá­rios pro­gramas de mo­bi­li­dade para a edu­cação, for­mação e tra­balho jovem no pro­grama Erasmus+, por via da con­cen­tração de com­pe­tên­cias numa só Agência em Por­tugal, em nada con­tri­buiu para cum­prir os ob­jec­tivos po­si­tivos que lhes estão as­so­ci­ados. Re­sultou no con­di­ci­o­na­mento a in­te­resses po­lí­ticos de que de­correm pos­turas dis­cri­mi­na­tó­rias re­gi­o­nais, no­me­a­da­mente na re­gião de Se­túbal, tendo re­du­zido e di­fi­cul­tado bu­ro­cra­ti­ca­mente o acesso de jo­vens ca­ren­ci­ados da pe­nín­sula a estes pro­gramas. Para lá da aná­lise po­lí­tica que temos quanto ao ser­viço de vo­lun­ta­riado (o con­ceito da ci­da­dania eu­ro­peia e de um ser­viço cí­vico eu­ropeu, ou a des­res­pon­sa­bi­li­zação dos es­tados em de­ter­mi­nadas si­tu­a­ções como é exemplo a crise hu­ma­ni­tária dos re­fu­gi­ados), é um facto que sendo um pro­grama que cobre a to­ta­li­dade dos custos, pode ser uma opor­tu­ni­dade real para estes jo­vens.

No caso do Erasmus+, o afu­ni­la­mento é de classe, pro­mo­vendo-se, à imagem da visão po­lí­tica para o en­sino, a eli­ti­zação do acesso. A pro­moção da mo­bi­li­dade es­tu­dantil através deste pro­grama tem fi­cado não só aquém, como im­posto uma ina­cei­tável e in­con­tor­nável dis­cri­mi­nação de acesso, o que é evi­dente nas baixas taxas de mo­bi­li­dade. Não só tem sido es­sen­ci­al­mente ao nível do En­sino Su­pe­rior que se tem ve­ri­fi­cado o acesso ao pro­grama, como é evi­dente que o mesmo não está aces­sível a qual­quer um. Sem a de­vida re­ta­guarda fi­nan­ceira que per­mita cus­tear todo o pe­ríodo fora o seu país de origem (pro­pinas, alo­ja­mento, ali­men­tação), só uma elite com mai­ores re­cursos fi­nan­ceiros pode be­ne­fi­ciar desta mo­bi­li­dade.

Mais re­cen­te­mente, uma vi­sita ao CLAIM da Moita (Centro Local de Apoio à In­te­gração de Imi­grantes), per­mitiu iden­ti­ficar uma outra re­a­li­dade. O das di­fi­cul­dades por que passam as co­mu­ni­dades es­tran­geiras imi­grantes em Por­tugal. Di­fi­cul­dades bu­ro­crá­ticas, eco­nó­micas, cul­tu­rais e edu­ca­tivas, que vão blo­que­ando, por anos e dé­cadas a quem chegou ao País com le­gí­timas as­pi­ra­ções, pro­cu­rando uma vida me­lhor, tra­balho e se­gu­rança, o le­gí­timo acesso à le­ga­li­zação no País ou à na­ci­o­na­li­dade por­tu­guesa. Casos há que levam mais de 30 anos. As mesmas le­gí­timas as­pi­ra­ções que cen­tenas de mi­lhares de por­tu­gueses pro­cu­raram fora do seu país. O ce­nário des­crito é dra­má­tico. A bu­ro­cracia e a falta de von­tade ins­ti­tu­ci­onal en­rolam estas pes­soas numa teia de que não con­se­guem sair sem a ajuda de cen­tros como este, com forte apoio da au­tar­quia. O sis­tema gera si­tu­a­ções in­com­pre­en­sí­veis, como al­guns casos re­la­tados de cri­anças nas­cidas em Por­tugal a quem não foi con­ce­dida na­ci­o­na­li­dade au­to­má­tica, e a quem os ser­viços su­gerem a des­lo­cação aos países dos seus pais (que a maior parte não co­nhece) para ob­terem o cer­ti­fi­cado cri­minal exi­gido. Cri­anças que por serem «ile­gais» não têm acesso na es­cola a acção so­cial es­colar, ou seja a ali­men­tação e ma­te­riais, con­tra­ri­ando o que a pró­pria lei de­ter­mina. Tudo isto num con­texto so­cial de grande ca­rên­cias, po­breza e ex­clusão. Nas­ceram em Por­tugal, mas o país que os viu nascer não lhes re­co­nhece os di­reitos que daí de­correm.

Quando as ques­tões da in­te­gração são tantas vezes li­gadas à ex­clusão, à de­linquência e até à cha­mada «ra­di­ca­li­zação», é caso para per­guntar, por que razão se mantêm abor­da­gens que ex­cluem, que se­gregam, que mantêm afas­tadas estas co­mu­ni­dades das opor­tu­ni­dades que de­ter­mi­nados me­ca­nismos cri­ados po­de­riam pro­por­ci­onar. A res­posta é sim­ples e as po­lí­ticas de mi­gração exis­tentes ou em ela­bo­ração da UE são disso exemplo. Ao sis­tema ca­pi­ta­lista im­porta acu­mular e agravar as de­si­gual­dades, a po­breza, man­tendo um exér­cito de mão-de-obra ca­ren­ciada, des­pro­te­gida, dis­posta a tra­ba­lhar a qual­quer preço. Não são as po­lí­ticas de in­te­gração que fa­lham. Elas cum­prem os fins que servem!

 



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