Jerónimo de Sousa sobre as medidas de «austeridade»

Uma pancada brutal sobre o povo

O pri­meiro-mi­nistro foi ao Par­la­mento afirmar, no dia se­guinte ao anúncio das bru­tais me­didas do seu Go­verno, que «não foi sem um aperto no co­ração» que as tomou. Houve um aperto, sim se­nhor, mas foi um «aperto no pes­coço» dos tra­ba­lha­dores e do povo, cor­rigiu Je­ró­nimo de Sousa.

Tra­ba­lha­dores pagam a crise do ca­pi­ta­lismo

Des­mon­tado foi assim o falso es­tado de alma de José Só­crates sobre as me­didas de re­dução do dé­fice com efeitos já para o ano em curso e para 2011 no seu pri­meiro de­bate quin­zenal desta sessão le­gis­la­tiva.

O que para o chefe do Go­verno são me­didas que ser­virão  para «afirmar as con­di­ções de con­fi­ança na eco­nomia e no fu­turo do País», para o PCP não passam de mais um roubo nos sa­lá­rios e um novo ataque às já muito di­fí­ceis con­di­ções de vida das classes tra­ba­lha­doras.

 

Roubo nos sa­lá­rios

 

Coube assim uma vez mais ao PCP, pela voz do seu Se­cre­tário-geral, in­tro­duzir no de­bate o que é ver­da­dei­ra­mente im­por­tante e ac­tual, re­jei­tando de forma firme o que clas­si­ficou de «pan­cada brutal» contra todos aqueles que vivem dos seus ren­di­mentos do tra­balho e das suas re­formas e pen­sões.

E sobre os cortes na des­pesa, não teve dú­vidas em afirmar que «são os tra­ba­lha­dores que vão pagar com língua de palmo as con­sequên­cias desta po­lí­tica de di­reita, desta crise do ca­pi­ta­lismo».

No que res­peita ao roubo dos sa­lá­rios dos tra­ba­lha­dores da ad­mi­nis­tração pú­blica - que equi­vale a menos 70 por cento do sub­sídio de Natal – o di­ri­gente co­mu­nista con­si­derou ainda que o pri­meiro-mi­nistro «não teve co­ragem de cortar no 13º mês, op­tando por 14 pres­ta­ções su­aves para re­cu­perar parte desse sub­sídio».

E quis saber se este corte é para manter até 2012, isto é: se se trata de re­dução tem­po­rária ou de uma re­dução de­fi­ni­tiva nos sa­lá­rios «para obter a tal com­pe­ti­ti­vi­dade à custa da di­mi­nuição dos sa­lá­rios».

Questão co­lo­cada pelo di­ri­gente co­mu­nista foi também a do corte das pen­sões, sobre a qual o pri­meiro-mi­nistro nada dis­sera. «O corte é para todas, para as mais baixas, para as mais altas?», per­guntou, ob­ser­vando que fi­cara no vago essa ideia do con­ge­la­mento das pen­sões.

Quanto ao corte nos abonos de fa­mília, se­gundo as contas do PCP, esse es­bulho sig­ni­fica que um casal com um ren­di­mento per ca­pita de 628 euros, com um filho, deixa de ter abono de fa­mília.

«Diga lá, se­nhor pri­meiro-mi­nistro: é rico um tra­ba­lhador com pouco mais de 600 euros? Me­rece esta me­dida  pro­fun­da­mente in­justa, de­mons­tra­tiva da sua con­cepção de de­fesa do Es­tado so­cial?», per­guntou.

 

Ainda mais de­sem­prego

 

Sem res­ponder a ne­nhuma das ques­tões con­cretas que lhe foram co­lo­cadas, como é seu há­bito, José Só­crates pro­curou jus­ti­ficar-se com ge­ne­ra­li­dades do tipo «nin­guém toma estas me­didas de ânimo leve».

E es­cudou-se na «si­tu­ação dos mer­cados in­ter­na­ci­o­nais» que, disse, «ameaça o fi­nan­ci­a­mento da nossa eco­nomia», con­cluindo que «es­tamos a ser muito pe­na­li­zados» por não termos adop­tado as me­didas que ou­tros países to­maram».

Pro­cu­rando mi­ni­mizar os ter­rí­veis im­pactos das suas me­didas, re­cuou ainda ao pas­sado para dizer que em oca­siões an­te­ri­ores ocor­reram re­du­ções de sa­lá­rios reais «muito mais gra­vosas», no tempo em que se «des­va­lo­ri­zava a moeda».

Afirmou-se ainda con­ven­cido de que Por­tugal «tem de fazer este es­forço para jus­ta­mente res­ponder às ques­tões da eco­nomia e do em­prego», ideia con­tes­tada por todos aqueles, entre os quais o PCP, que ad­vertem que estas me­didas po­derão, ao invés, tra­duzir-se em nova re­cessão e, se­gu­ra­mente, mais de­sem­prego.

Je­ró­nimo de Sousa, na ré­plica, alu­dindo à ale­gada «co­ragem» que José Só­crates disse ter tido para tomar as me­didas que tomou, con­si­derou não existir qual­quer  co­ragem quando tais me­didas re­caem sobre os tra­ba­lha­dores e re­for­mados. Mesmo no plano da re­ceita fiscal, es­pe­ci­ficou, a ver­dade é que só dez por cento é que pe­na­lizam o ca­pital, ao passo que 90 por cento pe­na­lizam os tra­ba­lha­dores e as fa­mí­lias.

«Esta é a co­ragem do se­nhor pri­meiro-mi­nistro: a co­ragem para car­regar em quem menos tem e menos pode, sobre quem não tem voz, e falar de man­sinho, bai­xinho, para aqueles que con­ti­nuam a amassar for­tunas, lu­cros, a viver à tripa forra, à conta do Es­tado».

 

Du­elos de pól­vora seca

 

Este foi um de­bate onde o pri­meiro-mi­nistro pro­curou jus­ti­ficar a sua te­rapia de choque para as contas pú­blicas com o ar­gu­mento de que não lhe res­tava al­ter­na­tiva, de que as me­didas ti­nham de ser to­madas, sob pena de males mai­ores.

Negou culpas pró­prias, re­cu­sando as­so­ciar as suas po­lí­ticas aos pro­blemas ac­tuais, en­dos­sando tudo para a crise in­ter­na­ci­onal e para a mais re­cente «pressão» e «ner­vo­sismo» dos cha­mados mer­cados fi­nan­ceiros.

À di­reita, sem nunca con­testar aber­ta­mente as me­didas do Exe­cu­tivo – que aliás vêm ao en­contro do que vinha exi­gindo, em par­ti­cular no ca­pí­tulo da des­pesa - o que pre­o­cupou no de­bate o PSD foi en­con­trar ex­pli­cação para «o que correu mal» nas contas do Go­verno para que este ti­vesse de­ci­dido cortar de so­petão 3 400 mil mi­lhões de euros na des­pesa e au­mentar 1 700 mil mi­lhões nas re­ceitas.

A compra dos sub­ma­rinos e so­bre­tudo a pa­ter­ni­dade de quem lançou o res­pec­tivo con­curso foi, por seu lado, o grande tema a animar no de­bate as pi­car­dias entre o CDS/​PP e o Go­verno.

De tal ma­neira que, em vá­rios dos seus mo­mentos, este mais mais pa­receu um ro­ti­neiro e normal de­bate, como se na vés­pera não ti­vessem sido to­madas me­didas tão graves para a vida dos por­tu­gueses como as que foram anun­ci­adas.

O facto não es­capou a Je­ró­nimo de Sousa que viu neste «duelo de sa­liva» entre PS e PSD mais um dado  tran­qui­li­zador para o pri­meiro-mi­nistro: «em re­lação aos cortes bru­tais que atin­girão os tra­ba­lha­dores, em par­ti­cular os da ad­mi­nis­tração pú­blica, vai ter a con­cor­dância do PSD e pos­si­vel­mente do CDS/​PP» e, por con­se­guinte, «ver o Or­ça­mento do Es­tado apro­vado».



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