AIL debate Lei dos «despejos»

Ataque aos inquilinos

O Go­verno apre­sentou na As­sem­bleia da Re­pú­blica três pro­postas de lei vi­sando al­terar o Re­gime da Re­a­bi­li­tação Ur­bana, o Re­gime de Ar­ren­da­mento Ur­bano e o Re­gime de Obras em casas ar­ren­dadas. A serem im­ple­men­tadas, tais al­te­ra­ções põem em causa a es­ta­bi­li­dade do ar­ren­da­mento ha­bi­ta­ci­onal e não ha­bi­ta­ci­onal, con­du­zindo a si­tu­a­ções de rup­tura, com fortes im­pli­ca­ções para as fa­mí­lias, co­mércio, res­tau­ração e ser­viços di­versos, co­lec­ti­vi­dades, as­so­ci­a­ções po­pu­lares e de ca­rácter so­cial.

Para a As­so­ci­ação dos In­qui­linos Lis­bo­nenses (AIL) a in­tenção do Exe­cu­tivo PSD/​CDS, que in­voca a ne­ces­si­dade de li­be­ra­li­zação do mer­cado do ar­ren­da­mento quando o mesmo já usu­frui de tal li­be­ra­li­zação desde 1990 com a en­trada em vigor do Re­gime de Ar­ren­da­mento Ur­bano (RAU), cons­ti­tuirá «um novo e grave factor de ins­ta­bi­li­dade so­cial» que «ani­mará e le­gi­ti­mará uma vaga de des­pejos, quer no ar­ren­da­mento ha­bi­ta­ci­onal, quer no não ha­bi­ta­ci­onal».

O Go­verno pre­tende, com estas pro­postas, «acabar com os con­tratos ce­le­brados antes de 1990», «fa­ci­litar os des­pejos dos in­qui­linos», «eli­minar a es­ta­bi­li­dade do ar­ren­da­mento», «in­ca­pa­citar as ac­ti­vi­dades eco­nó­micas e so­ciais de se es­ta­be­le­cerem com pers­pec­tivas de amor­ti­zação e ren­ta­bi­li­dade dos in­ves­ti­mentos», «pre­ju­dicar as di­versas ac­ti­vi­dades de ca­rácter so­cial de re­pre­sen­tação e de apoio às co­mu­ni­dades lo­cais» e «fa­vo­recer a es­pe­cu­lação e a con­cen­tração imo­bi­liária, com isenção de im­postos e fa­ci­li­dades acres­cidas para as re­mo­de­la­ções dos pré­dios».

Em As­sem­bleia de In­qui­linos, re­a­li­zada, dia 11, no Ci­nema São Jorge, em Lisboa, Romão La­va­dinho, da AIL, sa­li­entou que «es­tamos pe­rante um re­tro­cesso dos di­reitos dos in­qui­linos, que nos conduz ao ano de 1866, tempo em que os in­qui­linos não ti­nham quais­quer di­reitos». «Se a lei for apro­vada pela mai­oria PSD/​CDS, tudo fa­remos, junto dos grupos par­la­men­tares, e junto do Pre­si­dente da Re­pú­blica, para que na pro­mul­gação sejam ex­pur­gados os ar­tigos que levam ao des­pejo dos que sempre cum­priram», sa­li­entou, acres­cen­tando: «Se mesmo assim a lei en­trar em vigor, tal como está, a AIL fará as di­li­gên­cias ne­ces­sá­rias para que em fu­turos li­tí­gios ju­di­ciais se possa sen­si­bi­lizar o jul­gador (juiz) no sen­tido de con­si­derar, na apli­cação da lei, as con­di­ções so­ciais e os prin­cí­pios cons­ti­tu­ci­o­nais que servem de base o nosso Es­tado de Di­reito, em es­pe­cial o prin­cípio fun­da­mental do di­reito e acesso à ha­bi­tação. Na es­pe­rança que quem vier a aplicar esta lei tenha uma sen­si­bi­li­dade di­fe­rente do le­gis­lador.»

A ter­minar, Romão La­va­dinho apelou aos in­qui­linos ha­bi­ta­ci­o­nais e não ha­bi­ta­ci­o­nais para ma­ni­fes­tarem o seu «de­sa­cordo na rua, ou por todos os meios dis­po­ní­veis ao seu al­cance», no dia em que forem vo­tadas na As­sem­bleia da Re­pú­blica as pro­postas do Go­verno. «A pro­posta de Lei 38/​XII, em dis­cussão, a ser apro­vada, vai pôr em causa os con­tratos de ar­ren­da­mento an­te­ri­ores e pos­te­ri­ores a 1990, mas mais, irá pôr em causa o fu­turo das novas ge­ra­ções que fi­carão com­ple­ta­mente des­pro­te­gidas de quais­quer di­reitos e su­jeitas ao livre ar­bí­trio e dis­cri­ci­o­na­ri­e­dade dos se­nho­rios», re­feriu.

 

Fa­mí­lias serão des­pe­jadas

 

Na­quela sessão in­ter­vi­eram ainda muitos mo­ra­dores, que re­pu­di­aram a Lei do ar­ren­da­mento ur­bano que «de­se­qui­libra a re­lação entre o se­nhorio e o in­qui­lino». «Cerca de 100 mil fa­mí­lias po­derão ser des­pe­jadas das suas casas, mesmo sa­bendo que a mai­oria dos 255 mil ar­ren­da­tá­rios são pes­soas de idade, com di­fi­cul­dades eco­nó­micas e pro­blemas de saúde», disse um membro do Grupo de Mo­ra­dores de Campo de Ou­rique, la­men­tando que se «até aqui os “ve­lhos” mor­riam, muitas vezes so­zi­nhos, mas nas suas casas», agora, «se a lei for apro­vada, vai fazer com que morram so­zi­nhos, mas na rua». «Uma das mai­ores per­ver­sões desta lei é per­mitir o des­pejo sem que tal seja de­cre­tado pelo tri­bunal e, mesmo que o in­qui­lino tenha di­nheiro para obrigar o pro­cesso a ir a tri­bunal, é obri­gado a sair da casa onde viveu toda a vida en­quanto de­corre o pro­cesso».

Um outro, da Co­missão de In­qui­linos das Ave­nidas Novas, ape­lidou a pro­posta de lei do Go­verno como «vi­o­lenta», atin­gindo «fron­tal­mente um grupo po­pu­la­ci­onal idoso e o co­mércio tra­di­ci­onal». «Se vier a ser apro­vada na sua ac­tual versão, esta pro­posta de lei irá, no caso de Lisboa, pre­ci­pitar de forma ine­xo­rável o de­sa­pa­re­ci­mento do in­qui­li­nato que ha­bita os bairros da ci­dade e varrer um tipo de vida e de co­mércio ca­rac­te­rís­ticos», alertou, re­cor­dando ainda que esta lei surge quando os in­qui­linos «estão a ser es­po­li­ados dos seus ren­di­mentos, su­jeitos a um pro­cesso rá­pido de em­po­bre­ci­mento, sem fim à vista, com o con­ge­la­mento e cortes de pen­sões e au­mentos ga­lo­pantes de bens e ser­viços, par­ti­cu­lar­mente os de saúde, e os co­mer­ci­antes se vêem na con­tin­gência de fe­charem portas por falta de cli­entes».

 

AIL propõe al­te­ra­ções às pro­postas do Go­verno

 

  • Ga­rantir o re­a­lo­ja­mento do ar­ren­da­tário em con­di­ções de dig­ni­dade e de preço por efeito da re­a­li­zação de obras;
  • Manter os con­tratos de ar­ren­da­mento ha­bi­ta­ci­o­nais por tempo in­de­ter­mi­nado ce­le­brados antes de No­vembro de 1990;
  • Manter o valor de quatro por cento cons­tante do NRAU (Lei nº 6/​2006) sobre o valor pa­tri­mo­nial ac­tu­a­li­zado, para efeitos do cál­culo da renda, uma vez que se trata de casas an­tigas já to­tal­mente amor­ti­zadas;
  • In­tro­duzir um fa­se­a­mento no au­mento das rendas, à se­me­lhança do que acon­tece no NRAU;
  • Con­si­derar o ren­di­mento das fa­mí­lias, para efeitos de ac­tu­a­li­zação das rendas;
  • Que as ac­ções de des­pejo te­nham pro­ce­di­mentos que ga­rantam os di­reitos das partes e de­corram pe­rante um juiz, mesmo que se tenha de cons­ti­tuir tri­bu­nais para o efeito, em ordem a aplicar-se a jus­tiça com a ne­ces­sária ra­pidez.


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