Arménio Carlos sobre a greve geral

Há condições e obrigação

No 10.º Con­gresso da US Porto, o Se­cre­tário-geral da CGTP-IN de­fendeu que, «de­pois desta greve geral, temos in­fi­nitas pos­si­bi­li­dades para de­sen­volver o nosso tra­balho».

«Não po­demos ficar à es­pera que ve­nham ter con­nosco»

Para Ar­ménio Carlos, esse tra­balho abarca a acção rei­vin­di­ca­tiva, a nível de em­presas, ser­viços e sec­tores, e a acção sin­dical mais geral, re­cla­mando outra po­lí­tica, que possa ga­rantir o au­mento dos sa­lá­rios e, em par­ti­cular, do sa­lário mí­nimo na­ci­onal (de 485 para 515 euros, ainda este ano). «Até a mais pe­quena pas­te­laria» pode pagar mais um euro por dia, acen­tuou Ar­ménio Carlos, re­cor­dando que a cen­tral já apre­sentou pro­postas para cortar custos que, para as em­presas e para as fa­mí­lias, pesam mais do que os sa­lá­rios (os preços da energia, das te­le­co­mu­ni­ca­ções e dos com­bus­tí­veis) e para que a Caixa Geral de De­pó­sitos, que «já foi es­bu­lhada pelo BPN em mais de seis mil mi­lhões de euros», possa «abrir uma via para fa­ci­litar o cré­dito às micro e pe­quenas em­presas, para fi­nan­ciar a eco­nomia».

«De­pois desta greve geral, temos muito mais força, temos muitos mais tra­ba­lha­dores dis­po­ní­veis para virem para os nossos sin­di­catos», mas «não po­demos ficar à es­pera que ve­nham ter con­nosco», de­sa­fiou. Igual­mente, «ti­vemos muitos jo­vens a ade­rirem a esta greve geral, ti­vemos jo­vens nos ple­ná­rios a pu­xarem pela greve geral e a as­su­mirem, pe­rante os mais ve­lhos, que era pre­ciso ir para a greve geral, mesmo es­tando com vín­culos pre­cá­rios». Ar­ménio Carlos apelou: «Vamos ter com eles, para que ve­nham aos sin­di­catos, para que sejam de­le­gados e di­ri­gentes, para re­ju­ve­nescer e alargar o nosso mo­vi­mento sin­dical», su­bli­nhando que «temos con­di­ções para ir muito mais longe e temos essa obri­gação, para re­for­çarmos a in­ter­venção nos lo­cais de tra­balho».

Há re­sul­tados

Mesmo face à grande de­si­gual­dade na cor­re­lação de forças, de­se­qui­li­brada pelo poder po­lí­tico fa­vo­rável ao grande pa­tro­nato, «a luta tem dado re­sul­tados e as coisas al­te­raram-se». O di­ri­gente sin­dical citou o exemplo da re­sis­tência ao abai­xa­mento do valor do tra­balho su­ple­mentar, ob­jec­tivo da re­visão do Có­digo do Tra­balho que en­trou em vigor a 1 de Agosto e que muitos pa­trões logo apro­vei­taram, para cor­tarem nos sa­lá­rios o que nunca sobra nos lu­cros.

«Al­guns nunca pen­sa­riam que desde Agosto se de­sen­vol­vesse uma di­nâ­mica de luta e rei­vin­di­ca­tiva, como não tí­nhamos há muitos anos, com muitos tra­ba­lha­dores em greve ao tra­balho ex­tra­or­di­nário e aos do­mingos», mas «o ba­lanço destes três meses é ex­tre­ma­mente po­si­tivo». Ar­ménio Carlos sa­li­entou que «muitas em­presas re­sol­veram con­ti­nuar a pagar o tra­balho ex­tra­or­di­nário de acordo com o que diz a con­tra­tação co­lec­tiva e a ACT veio es­cla­recer que podem pagar mais do que o que está no Có­digo», para con­cluir que valeu a pena ir à luta, pois «aqueles que lu­taram, ga­nharam, mesmo que te­nham per­dido umas cen­tenas de euros com estes dias de greve, porque vão re­cu­perar muito mais nos pró­ximos meses e anos».

 

Vi­o­lência gra­tuita
e cons­ci­ência so­cial

No dia 14, «fi­zemos mag­ní­ficas ma­ni­fes­ta­ções em todo o País, em 39 ci­dades», nas quais, com os tra­ba­lha­dores em luta, es­ti­veram também de­sem­pre­gados, pen­si­o­nistas e re­for­mados, e «muitos micro e pe­quenos em­pre­sá­rios, também eles atin­gidos por esta po­lí­tica que os en­costa à pa­rede e con­di­ciona a pos­si­bi­li­dade de man­terem os seus ne­gó­cios».

Como «a greve es­tava a ter um grande im­pacto e as pro­postas da CGTP-IN cada vez têm maior apoio na opi­nião pú­blica», «tinha que acon­tecer al­guma coisa», co­mentou Ar­ménio Carlos. Foi assim que «as­sis­timos àquelas cenas la­men­tá­veis, frente à As­sem­bleia da Re­pú­blica, no final e de­pois da ma­ni­fes­tação da CGTP-IN».

O Se­cre­tário-geral frisou que a cen­tral «la­menta pro­fun­da­mente aquilo que se passou em Lisboa», e sus­citou uma re­flexão sobre quem be­ne­fi­ciou com a vi­o­lência. «Não foram os tra­ba­lha­dores. A vi­o­lência gra­tuita não leva a lado ne­nhum. Nós não que­remos um tra­ba­lhador re­vol­tado hoje, que amanhã se torne um tra­ba­lhador sub­misso. Que­remos um tra­ba­lhador in­dig­nado, que par­ti­cipe ci­vi­ca­mente em todas as ini­ci­a­tivas, que dê o seu con­tri­buto in­di­vi­dual, mas numa pers­pec­tiva de ele­vação da cons­ci­ência so­cial. Nós que­remos elevar a cons­ci­ência so­cial, que­remos que haja mais par­ti­ci­pação cí­vica, que­remos que todos, in­de­pen­den­te­mente dos seus po­si­ci­o­na­mentos po­lí­ticos ou sin­di­cais, par­ti­cipem ac­ti­va­mente na vida do País. Mas que­remos mos­trar a di­fe­rença em re­lação aos ou­tros, que­remo-nos afirmar não pela vi­o­lência, mas por aquilo que são as nossas pro­postas e as nossas ra­zões».

 

Re­ne­go­ciar
mas não o me­mo­rando

«De­fen­demos a re­ne­go­ci­ação da dí­vida, mas não de­fen­demos a re­ne­go­ci­ação do me­mo­rando», es­cla­receu Ar­ménio Carlos. Para a CGTP-IN, o «me­mo­rando de en­ten­di­mento» que o Go­verno do PS, o PSD e o CDS-PP as­si­naram com o FMI, a UE e o BCE «é para re­jeitar». Em par­ti­cular, «não acei­tamos que, pri­meiro, te­nham al­te­rado a le­gis­lação la­boral, te­nham in­tro­du­zido a fa­ci­li­tação dos des­pe­di­mentos, a re­dução das in­dem­ni­za­ções, a re­dução da pro­tecção so­cial, a re­dução do pa­ga­mento do tra­balho ex­tra­or­di­nário, te­nham in­tro­du­zido o “banco” de horas, te­nham posto em causa a con­tra­tação co­lec­tiva... e de­pois, ve­nham dar isto por ar­ru­mado e queiram ne­go­ciar aquilo que falta. Mas o que é que falta? Não acei­tamos isto».

A cen­tral de­fende que «é pre­ciso re­vogar as normas gra­vosas que atingem os tra­ba­lha­dores» e o Se­cre­tário-geral deixou claro que «por isso, vamos con­ti­nuar a lutar».




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