Comentário

Mistificações e objectivos de classe

Maurício Miguel

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Em an­te­rior cró­nica abor­dámos al­guns dos as­pectos que ligam o ataque aos di­reitos e con­quistas so­ciais dos tra­ba­lha­dores e dos povos, o ataque aos di­reitos e li­ber­dades po­lí­ticas e de­mo­crá­ticas e à so­be­rania e o papel do Par­la­mento Eu­ropeu (PE) neste e num novo quadro po­lí­tico ainda em de­fi­nição na UE. Como então re­fe­rimos, o PE – pela acção da sua mai­oria – é não apenas cúm­plice do rumo da UE, como pro­cura de­sem­pe­nhar um papel po­lí­tico mis­ti­fi­cador (con­jun­ta­mente com ou­tras or­ga­ni­za­ções, no­me­a­da­mente a Co­missão Eu­ro­peia e o Con­selho Eu­ropeu) que é ne­ces­sário con­ti­nuar a ana­lisar e a de­nun­ciar. Na se­mana pas­sada, em re­so­lução apro­vada na sessão ple­nária do PE, essa mesma mai­oria de­fendeu que os par­tidos po­lí­ticos eu­ro­peus – ori­en­tados para a de­fesa do rumo da UE e a ela su­bor­di­nados no plano fi­nan­ceiro e de or­ga­ni­zação – no­meiem os res­pec­tivos can­di­datos à pre­si­dência da Co­missão Eu­ro­peia (CE), dando-lhes maior vi­si­bi­li­dade e pro­ta­go­nismo e pro­cu­rando trans­formar o de­bate e a eleição de de­pu­tados de cada país ao PE numa cam­panha fo­cada na pre­si­dência da Co­missão Eu­ro­peia. Pro­curam desta forma des­viar a atenção da si­tu­ação na­ci­onal e do sig­ni­fi­cado da eleição de de­pu­tados na­ci­o­nais ao PE, que a ela deve estar li­gada, da ne­ces­sária iden­ti­fi­cação dos res­pon­sá­veis po­lí­ticos – no plano na­ci­onal e da UE – pela dra­má­tica si­tu­ação que vive o nosso povo, do brutal de­sem­prego e da de­gra­dação das con­di­ções de tra­balho e de vida. Querem es­conder a ne­ces­si­dade de cons­truir uma po­lí­tica al­ter­na­tiva que forje rup­turas so­be­ranas e de­mo­crá­ticas, afu­ni­lando o de­bate em «novos» pro­ta­go­nistas (par­tidos po­lí­ticos eu­ro­peus), que de­fendem o apro­fun­da­mento do rumo ne­o­li­beral, fe­de­ra­lista e mi­li­ta­rista da União Eu­ro­peia ou pro­postas de apa­rente ra­di­ca­li­dade, que mantêm in­to­cá­veis os fun­da­mentos e o ca­rácter de classe da UE. Pela via de ma­no­bras de di­versão como esta, querem não só manter como apro­fundar uma po­lí­tica de de­sastre e con­ti­nuar a sa­quear os re­cursos na­ci­o­nais e a so­be­rania do nosso povo, para im­porem a po­lí­tica dos mo­no­pó­lios da UE e das grandes po­tên­cias. Querem mar­gi­na­lizar ou im­pedir as forças po­lí­ticas que, como o PCP, não se re­signam nem cedem na de­fesa in­tran­si­gente dos tra­ba­lha­dores por­tu­gueses e do in­te­resse de Por­tugal, de pro­ta­go­ni­zarem a al­ter­na­tiva po­lí­tica que cres­cen­te­mente os tra­ba­lha­doras e as ca­madas an­ti­mo­no­po­listas rei­vin­dicam.

A mai­oria do PE não se ficou apenas pela pro­posta da apre­sen­tação do can­di­dato à CE por parte dos par­tidos po­lí­ticos eu­ro­peus. De­sen­vol­veram igual­mente uma ina­cei­tável in­ge­rência nos sis­temas na­ci­o­nais de elei­ções, pro­pondo o es­ta­be­le­ci­mento de «li­mi­ares mí­nimos» para a eleição de de­pu­tados ao PE, em nome de uma su­posta «es­ta­bi­li­dade dos pro­ce­di­mentos le­gis­la­tivos», de «mai­o­rias só­lidas» e da «sal­va­guarda e fun­ci­o­na­li­dade do Par­la­mento».

Trata-se, por agora, de uma po­sição de in­ge­rência da mai­oria do PE sobre as le­gis­la­ções elei­to­rais na­ci­o­nais, numa ten­ta­tiva de mis­ti­ficar o sig­ni­fi­cado das elei­ções para o PE e de pro­curar dar per­ver­sa­mente maior «le­gi­ti­mi­dade» à CE e ao PE. Uma tal al­te­ração, se for con­cre­ti­zada sig­ni­fi­cará, para países como Por­tugal, o fim do sis­tema pro­por­ci­onal ge­nuíno que temos na eleição dos de­pu­tados por­tu­gueses ao PE, com pos­sí­veis con­sequên­cias an­ti­de­mo­crá­ticas na dis­tri­buição de man­datos na­ci­o­nais – con­sequên­cias ex­ten­sí­veis a ou­tros países e a par­tidos com os quais o PCP mantém um quadro de co­o­pe­ração ao nível do PE através do Grupo GUE/​NGL.

O re­forço da «le­gi­ti­mi­dade», com «mai­o­rias só­lidas» no Par­la­mento Eu­ropeu, que esta re­so­lução de­fende, ca­minha lado a lado com o roubo da so­be­rania de de­cisão das ins­ti­tui­ções na­ci­o­nais, no­me­a­da­mente dos par­la­mentos na­ci­o­nais, sobre as ques­tões cen­trais do de­sen­vol­vi­mento do país. E visa afastar do PE as forças po­lí­ticas que, como o PCP, in­tervêm na de­núncia das po­lí­ticas de ataque aos di­reitos e aos in­te­resses dos tra­ba­lha­dores e dos povos e dos seus in­tér­pretes. Forças po­lí­ticas que afirmam cla­ra­mente, através de pro­postas, a luta pela de­fesa da paz e da so­be­rania, a luta por uma outra Eu­ropa de paz, so­li­da­ri­e­dade e jus­tiça so­cial.

Estas pro­postas de­mons­tram a gra­vi­dade da crise na e da UE e a ne­ces­si­dade dos mo­no­pó­lios sub­ju­garem o poder po­lí­tico ao sabor dos seus in­te­resses e as­pi­ra­ções de do­mínio he­ge­mó­nico, para fa­zerem frente à luta cres­cente dos povos e às forças po­lí­ticas que os de­fendem.


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