Horário e «requalificação» na função pública

Mais um ataque insidioso

Na vés­pera do pri­meiro-mi­nistro afirmar na AR que pu­sera em banho-maria di­plomas es­sen­ciais em nome do diá­logo com o PS e para sa­tis­fazer a ope­ração de «com­pro­misso de sal­vação na­ci­onal» lan­çada pelo PR, a mai­oria PSD/​CDS-PP apro­vava no Par­la­mento dois di­plomas que cons­ti­tuem uma nova e brutal ofen­siva contra os tra­ba­lha­dores da ad­mi­nis­tração pú­blica.

Uma ofen­siva que na opi­nião do PCP é in­dis­so­ciável da linha de ataque mais vasta aos ser­viços pú­blicos a que os por­tu­gueses têm di­reito.

Em causa o au­mento do ho­rário de tra­balho no Es­tado de 35 para 40 horas se­ma­nais (pro­posta de Lei n.º 153/​XII) e o sis­tema de re­qua­li­fi­cação de fun­ci­o­ná­rios pú­blicos (pro­posta de lei 154/​XII), novas re­gras que o Exe­cu­tivo de Passos e Portas quer pôr a vi­gorar quanto antes. O de­pu­tado do PSD Du­arte Pa­checo chamou-lhes «mais um passo im­por­tante no re­forço da ad­mi­nis­tração pú­blica», vi­sando, su­prema hi­po­crisia, «au­mentar a sua efi­ci­ência e efi­cácia», com «me­nores custos».

Ora o que acon­tece é que com o pri­meiro di­ploma – um «gi­gan­tesco re­tro­cesso so­cial», se­gundo o de­pu­tado co­mu­nista Jorge Ma­chado –, o pe­ríodo normal de tra­balho diário dos fun­ci­o­ná­rios do Es­tado passa de sete para oito horas diá­rios. Com esta al­te­ração le­gis­la­tiva, que teve os votos contra de todas as ban­cadas da opo­sição, o Go­verno impõe 40 horas de tra­balho como mí­nimo – o que não acon­tece se­quer no pri­vado, lem­brou o par­la­mentar do PCP – além de al­terar para pior os bancos de horas, as adap­ta­bi­li­dades for­çadas e um vasto con­junto de me­ca­nismos de des­re­gu­lação do ho­rário de tra­balho que, in­clu­si­va­mente, pode im­plicar dez ou 12 horas de tra­balho por dia.

Para o PCP esta pro­posta de lei agora apro­vada na ge­ne­ra­li­dade im­plica «mais tra­balho sem qual­quer acrés­cimo de sa­lário», ou seja «tra­balho gra­tuito», o que é proi­bido pela nossa Cons­ti­tuição, sig­ni­fi­cando, si­mul­ta­ne­a­mente, um grave factor de per­tur­bação para não dizer de in­con­ci­li­ação entre a vida pro­fis­si­onal e a vida fa­mi­liar, si­tu­ação que a nossa lei Fun­da­mental igual­mente in­ter­dita.

Novo em­buste

Com o di­ploma que ins­titui e re­gula o sis­tema de re­qua­li­fi­cação de tra­ba­lha­dores em fun­ções pú­blicas, que teve também os votos fa­vo­rá­veis da mai­oria e os votos contra dos par­tidos da opo­sição, o Go­verno impõe um novo re­gime de mo­bi­li­dade es­pe­cial que prevê um pe­ríodo má­ximo de 12 meses. Findo este, os tra­ba­lha­dores ou ficam em lista de es­pera para uma even­tual co­lo­cação (mas sem re­ce­berem qual­quer ren­di­mento), ou optam pela ces­sação do con­trato de tra­balho, tendo neste caso di­reito à atri­buição do sub­sídio de de­sem­prego.

Quanto à re­mu­ne­ração du­rante este pro­cesso, o tra­ba­lhador re­cebe apenas o equi­va­lente a dois terços (66,7% ) nos pri­meiros seis meses e 50% nos res­tantes seis meses. De­pois, como su­bli­nhou Jorge Ma­chado, «são des­pe­didos, uma vez que a «fase da re­a­fec­tação é um em­buste», já que o Go­verno não está a ad­mitir tra­ba­lha­dores, não há con­curso e nem os tra­ba­lha­dores ac­tu­al­mente em mo­bi­li­dade foram co­lo­cados em ou­tros ser­viços

É in­tenção do Go­verno que estas al­te­ra­ções, bem como o au­mento dos des­contos para a ADSE e as res­ci­sões no Es­tado (as cha­madas res­ci­sões ami­gá­veis com as quais pre­tende des­pedir mais de 30 mil tra­ba­lha­dores, sem falar das res­ci­sões dos con­tratos a termo que podem abranger mais 70 mil tra­ba­lha­dores), ve­nham a in­te­grar a nova Lei Geral do Tra­balho em Fun­ções Pú­blicas, ac­tu­al­mente em dis­cussão com as es­tru­turas sin­di­cais da função pú­blica.

O par­la­mentar co­mu­nista chamou ainda a atenção no de­curso do de­bate para o facto de o Go­verno, com este di­ploma, re­vogar o ar­tigo 88.º, n.º 4, norma que im­pediu a de­cla­ração de in­cons­ti­tu­ci­o­na­li­dade do Re­gime de Con­trato de Tra­balho em Fun­ções Pú­blicas. Ora se a norma é re­vo­gada, então, para o PCP, mai­ores são as dú­vidas quanto à cons­ti­tu­ci­o­na­li­dade do di­ploma.



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