Lógica desumana
Num país que em que existem centenas de milhares de fogos desocupados, números recentes indicam um novo aumento da lista de espera para habitação social.
Governo nega casas ao povo
O número de candidatos a habitação social voltou a subir, na Irlanda, em cerca de 13 mil, em relação a 2011, elevando o total de requerentes para 111 145, ou seja quase o dobro dos 56 249 que registados em 2008.
A divulgação, no início do mês, destes reveladores dados forçou a ministra da Habitação Jan O’Sullivan a prometer «um impulso à habitação», com um investimento de 32 milhões de euros e a entrega de 266 fogos a famílias carenciadas.
Em resposta, o deputado do Sinn Fein, Dessie Ellis, qualificou de demagógicas as declarações da ministra, notando que não há qualquer «impulso à habitação», mas precisamente o contrário.
«O orçamento para a habitação sofreu um corte de 15 por cento em 2013», salientou Ellis, lembrando que esta rubrica já perdeu mais de mil milhões de euros desde 2008. «O Estado proporciona cada vez menos habitação, ao mesmo tempo que a necessidade social aumenta cada vez mais. As 266 casas oferecidas pela ministra são pois uma gota de água no oceano da necessidade social».
O deputado considerou ainda que «a habitação devia ser uma prioridade para o governo, é um direito elementar, mas até agora tudo o que tivemos foi retórica».
Como recordou, enquanto 14,5 por cento dos fogos permanecem desocupados, os preços do arrendamento sobem de ano para ano e começam a reaparecer bairros de lata nos centros urbanos.
A insensatez do sistema
Há um ano, o governo irlandês destinou milhões de euros para um programa de demolições de edifícios inacabados, que ficaram na posse do organismo público de gestão de activos NAMA (National Asset Management Agency).
Como noticiou o Avante!, a mesma ministra, Jan O’Sullivan, considerou então que «há casos em que a demolição é a decisão mais sensata que se pode tomar». «Se ninguém quer viver ali, então o mais prático é demolir o que existe».
Apesar das demolições – expediente para destruir o excesso de oferta no mercado e conter a queda dos preços – o Estado continua na posse de parte substancial dos perto de 300 mil fogos prontos a habitar, que não encontraram comprador ou cujos proprietários deixaram de pagar as hipotecas.
Com as leoninas restrições ao crédito, tornou-se claro que o problema da habitação não pode ser resolvido através do mercado.
Não obstante, a queda abruta dos preços (por exemplo, em Dublin, o valor das casas diminuiu 64 por cento em relação aos preços máximos alcançados em 2007), a recessão e o desemprego massivo continuam a fazer aumentar o número de as famílias incapazes de pagar as prestações.
A contradição não podia ser mais evidente: num país com 4,5 milhões de habitantes, dispondo de um imenso património imobiliário desocupado, as necessidades de habitação crescem de dia para dia.