Alegria e reflexão

Sérgio Ribeiro

Para quem se pre­tende mar­xista, os re­sul­tados elei­to­rais são, também e so­bre­tudo, uma forma de co­nhecer (ou de aper­ceber) o «es­tado das massas», uma es­pécie de ter­mó­me­tros. O que não quer dizer que se me­nos­preze o seu efeito na po­lí­tica em sen­tido res­trito (e pobre, re­dutor) da frente de luta da de­mo­cracia re­pre­sen­ta­tiva.

Há que nos con­gra­tu­larmos com os re­sul­tados ob­tidos, en­quanto evi­dência do enorme passo em frente (como ex­pressão da luta de massas) de­pois de al­guns passos atrás a que temos sido for­çados, sempre re­sis­tindo, após 25 de Abril de 1974 e 2 de Abril de 1976.

Po­derá dizer-se que estes nú­meros tra­du­zirão, desde que atenta e cui­da­do­sa­mente ob­ser­vados – qua­li­ta­ti­va­mente –, «massas em tran­sição» ou, me­lhor seria…, em to­mada de cons­ci­ência, pro­cesso que tem os seus riscos, na cor­re­lação de forças da luta de classes, pela sua an­tí­tese como o mos­tram al­guns si­nais (até lem­brando ou «re­pe­tindo» a His­tória) de de­ses­pero, até de ra­di­ca­li­zação fas­ci­zante.

Re­leva-se a es­can­da­losa (quem é que não vê?!) es­ca­mo­te­ação, pela co­mu­ni­cação so­cial his mas­ter’s voice, do enorme su­cesso elei­toral da CDU, com em­po­la­mento per­verso das «in­de­pen­dên­cias», e tí­tulos tipo CDU ga­nhou Loures mas perdeu líder par­la­mentar!!!

Su­blinha-se ainda – até porque não vista ou pouco ou nada re­fe­rida – a enorme re­le­vância da abs­tenção, mas so­bre­tudo da abs­tenção da­queles e da­quelas que, con­ti­nu­ando re­cen­se­ados, ao emi­grarem te­riam «vo­tado» an­te­ci­pa­da­mente.

Sig­ni­fi­ca­ti­va­mente, ou idi­os­sin­cra­ti­ca­mente a partir da ge­o­grafia e do fundo cul­tural sempre em acu­mu­lação, os por­tu­gueses emi­gram! Para o Ex­tremo Ori­ente, des­co­bertos os ca­mi­nhos ma­rí­timos, para os brasis, para franças e ara­ganças nos nossos con­tem­po­râ­neos tempos, em par­ti­cular nos anos da crise de agora, con­cre­ta­mente entre 2009 e 2013.

Os dados do re­cen­se­a­mento mal o re­flectem porque esta emi­gração de agora ex­pressa a evo­lução de­mo­grá­fica mas não a mi­gra­tória. Muitos/​as por­tu­gueses/​as, e sin­to­ma­ti­ca­mente os/​as me­lhores pre­pa­rados/​as para e ex­pe­ri­men­tados/​as no tra­balho que es­cas­seia cada vez mais, inun­dado pela es­pe­cu­lação fi­nan­ceira, abalam e levam con­sigo o cartão de eleitor!

Entre 2009 e 2013, a abs­tenção subiu de 3,4 mi­lhões para 4,5 mi­lhões, quase 15%, e, destes, im­por­taria saber quantos não vo­taram por estar no es­tran­geiro a pro­curar o que esta po­lí­tica lhes rouba. E muitos são, como al­guns exem­plos que cada um co­nhece po­deria ilus­trar. E não, evi­den­te­mente, os que be­ne­fi­ciam com a ex­plo­ração e a es­pe­cu­lação mas os que a so­frem e po­ten­ci­al­mente di­riam não ao que os ex­pulsa da pá­tria, e po­de­riam acrescer os votos por uma po­lí­tica pa­trió­tica e de es­querda (e quantos es­ta­riam na ma­ni­fes­tação de 18 de Ou­tubro?!).

Mas há mais (claro!), como os votos em branco e nulos (+51% e +53% em re­lação a 2009), que se podem iden­ti­ficar como sendo os de quem, es­tando contra esta po­lí­tica, não deu ainda o passo por uma outra po­lí­tica, pela ver­da­deira al­ter­na­tiva; e também se po­de­riam juntar al­guns casos de «grupos de ci­da­dãos» – em­bora bem poucos… porque a es­ma­ga­dora mai­oria são par­tidos es­con­didos (en­ver­go­nhados?) com inde…pen­dên­cias de fora.

Os nú­meros e estas re­fle­xões que sus­ci­taram, sem quais­quer pre­ten­sões que não as de deixar breves notas a de­sen­volver, ser­virão para dar força à con­clusão do tão sig­ni­fi­ca­tivo re­sul­tado das elei­ções au­tár­quicas, passo em frente numa frente de luta. De uma luta que con­tinua. Con­tínua.




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