Desculpe, disse «Reforma ou Revolução»?

Manuel Gouveia

Sabemos nós – de há muito – que não há re­forma no ca­pi­ta­lismo que re­solva o que só a re­vo­lução so­ci­a­lista pode re­solver, nem há re­vo­lução so­ci­a­lista sem uma longa luta contra a ex­plo­ração e por re­formas.

A ac­tu­a­li­dade deste tema é-nos tra­zida por quem nos tenta en­fiar em es­quemas pa­ra­li­santes da acção re­vo­lu­ci­o­nária, e nos apre­senta a idiota al­ter­na­tiva: ou lutas por re­formas, e és um re­for­mista, ou lutas pela re­vo­lução, e és um re­vo­lu­ci­o­nário. Estes ca­te­drá­ticos da re­vo­lução re­velam a sua su­prema ig­no­rância ao verem re­forma e re­vo­lução como uma di­co­tomia, in­ca­pazes de per­ceber a di­a­lé­tica con­creta do pro­cesso con­creto.

É ver­dade que lutar por re­formas – que pode ser muita coisa, um hos­pital pú­blico, a na­ci­o­na­li­zação de um sector es­tra­té­gico, o au­mento do sa­lário, a al­te­ração da or­ga­ni­zação do tempo de tra­balho, etc. – não al­tera a classe que detém o poder, não se di­rige a «re­solver» as con­tra­di­ções es­tru­tu­rais da so­ci­e­dade ca­pi­ta­lista, não eli­mina apenas mi­tiga a ex­plo­ração.

Mas é na re­sis­tência à ex­plo­ração e na luta por re­formas que a classe se une e toma cons­ci­ência de si pró­pria – e da sua força, e do seu pro­jecto – e não por frases gran­di­lo­quentes. O papel dos re­vo­lu­ci­o­ná­rios é dar sen­tido à luta con­creta, é «ser no mo­vi­mento pre­sente o fu­turo do mo­vi­mento», é não se sub­meter à re­a­li­dade mas também não se alhear dela, antes mer­gu­lhar na luta, unir, or­ga­nizar, dar pers­pec­tiva, dar con­fi­ança. E fazê-lo sem ali­mentar, antes com­ba­tendo, quais­quer ilu­sões sobre a pos­si­bi­li­dade (essa sim utó­pica!) de um sis­tema ca­pi­ta­lista re­for­mado, hu­ma­ni­zado, ci­vi­li­zado.

Tudo o que fa­zemos pre­para o dia em que os tra­ba­lha­dores to­marão o poder à bur­guesia. E esse tudo é a acção diária, con­se­quente, re­vo­lu­ci­o­nária e co­lec­tiva na so­ci­e­dade onde vi­vemos e lu­tamos, razão pela qual nos or­ga­ni­zamos em Par­tido.

No re­for­mismo do velho Berns­tein a luta por re­formas (o mo­vi­mento) é tudo e o ob­jec­tivo final é nada. Para os re­vo­lu­ci­o­ná­rios, o ob­jec­tivo final está sempre pre­sente, mas não é tudo, e prin­ci­pal­mente, não nos cega, ilu­mina-nos!




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