O consenso do capital
Nos EUA, após aprovação pela Câmara dos Representantes, segue para o Senado o acordo a dois anos para um possível orçamento federal. Como já se adivinhava, o consenso orçamental entre democratas e republicanos castiga severamente os trabalhadores ao mesmo tempo que consagra o belicismo de Obama e os privilégios da alta burguesia.
Se por um lado este acordo previne um novo encerramento do governo e exclui a possibilidade de cortes automáticos na despesa, assume-se como uma prenda de natal para os multi-bilionários que levaram a economia norte-americana à beira do colapso. O consenso entre os dois partidos da grande burguesia não atinge os vazios legais que permitem aos grandes grupos económicos pura e simplesmente não pagar quaisquer impostos. Mas se os especuladores responsáveis pelos hedge funds e fundos de ações privados têm razões para celebrar, o mesmo não se pode dizer das camadas mais pobres da classe trabalhadora: o acordo em causa prevê que um milhão e trezentos mil trabalhadores desempregados sejam excluídos do direito ao subsídio de desemprego e que 57 000 crianças percam o acesso ao programa social Headstart.
Embora a extrema-direita do Partido Republicano se continue a bater contra o acordo, com os fascistas do Tea Party e os ultra-liberais da Heritage Foundation e da Americans for Prosperity a prometerem guerra sem quartel a qualquer compromisso com os democratas, o grande capital não tem razões para protestar. Num consenso em que os democratas e republicanos elogiam a capacidade de fazer cedências, apenas os trabalhadores são sacrificados. Já o complexo militar industrial vê o seu já fabuloso orçamento uma vez mais engordado. Com Obama, o investimento público na máquina de guerra imperialista já ascendia a mais de 900 mil milhões de dólares por ano (de longe o maior do mundo). Agora, pode ascender a mais de 950 mil milhões, sendo que apenas o Pentágono pode receber 20 mil milhões adicionais.
Austeridade
e luta de classes
O objectivo de reduzir o défice federal em 23 mil milhões de dólares, inscrito a jeito de florão no consenso orçamental, pretende-se alcançar à custa de cortes acima dos 2% em programas sociais vitais como o Mediare (sistema não-universal de saúde pública) e graças à subida de impostos para os pensionistas da função pública, onde Obama pretende conseguir uma poupança de seis mil milhões de dólares. O acordo orçamental inscreve-se na esteira de um velho projecto de destruição das pensões públicas e eliminação de direitos sociais conquistados ao longo de mais de um século de luta. Ao contrário do que a histeria republicana poderia indicar, Obama tem servido com eficácia e prontidão a causa da destruição das funções sociais do Estado, que desde a sua eleição foram recortadas em mais de 4% para os valores mais baixos desde os anos cinquenta, ao mesmo tempo que o orçamento militar ascende a quantias inéditas nos EUA e no mundo.
Simultaneamente, e apesar do jogo de luzes à superfície, crescem as verdadeiras contradições entre classes e entre diferentes sectores da própria alta burguesia, contradições que incrementadas pela crise sistémica do capitalismo e confrontadas com a dinâmica bipartidária dos EUA, tem levado a um importante recrudescimento dos matizes fascistas dentro do Partido Republicano e de fracturas progressistas no coração do Partido Democrata. Com efeito, o número de congressistas democratas não alinhados atinge hoje a sua maior expressão desde a década de sessenta.