Museu Mineiro de São Pedro da Cova

Memórias da exploração

Daniel Vieira

Decorrem durante todo o ano as comemorações dos 50 anos da Casa da Malta e dos 25 anos do Museu Mineiro de São Pedro da Cova, hoje o mesmo espaço, lugar que guarda memórias da exploração do carvão e do Homem em São Pedro da Cova.

Durante cerca de 17 décadas funcionou em São Pedro da Cova, concelho de Gondomar, um dos mais importantes complexos industriais mineiros do País. Pela qualidade do carvão (antracite), pelo número de operários que ali trabalharam, pela quantidade de carvão extraído, as minas de São Pedro da Cova tornaram-se uma referência para quem estuda, em diferentes perspectivas académicas, as explorações mineiras em Portugal.

Estas minas de carvão absorveram não apenas a força de trabalho disponível em S. Pedro da Cova e nas freguesias vizinhas, mas também a de outros operários vindos de diferentes regiões do País, alguns já com experiência de trabalho nas galerias de outras explorações.

Antes e durante a Segunda Guerra Mundial, época em que a exploração atingiu o seu auge, chegaram a trabalhar cerca de 1800 pessoas nestas minas de carvão. É com o objectivo de fixação dos operários no trabalho das minas, classificado muitas vezes como a «ultima das profissões», que a empresa concessionária da exploração do carvão toma várias medidas no campo da habitação. Os bairros operários que florescem por toda a freguesia são disso exemplo, mas os critérios de ocupação definidos pela empresa clarificam bem os seus propósitos. Todo aquele que passasse a habitar no bairro prometia o seu filho à empresa: ser «homem toupeira» era o destino, a contrapartida. Mas a política dos responsáveis da empresa não se fica por aqui, surgindo também as designadas Casas da Malta.

Casas da Malta

Em São Pedro da Cova da Cova existiram três. Destinadas aos mineiros provenientes de outras regiões ou lugares distantes de São Pedro da Cova, os Malteses, estes edifícios albergaram dezenas de pessoas num espaço exíguo, partilhando vários espaços comuns.

Edificada em 63/64, e apresentando uma construção moderna, com estrutura em betão, a única Casa da Malta ainda existente, hoje aberta com outros propósitos, permite perceber as condições de habitabilidade em que vivam os operários de São Pedro da Cova.

Museu Mineiro

É preciso recuar ao período revolucionário, o mais luminoso (também) na vida de São Pedro da Cova para encontrarmos os primeiros esforços organizados para a preservação das memórias da indústria mineira. É neste objectivo que se insere, em 1976, a criação do Museu Mineiro no espaço do Centro Revolucionário Mineiro, após a ocupação dos antigos escritórios das minas pela população local.

Depois de perder este espaço, só mais tarde, na segunda metade dos anos 80, durante a gestão CDU, a Junta de Freguesia adquiriu uma das Casas da Malta, que viria a ser transformada em Museu Mineiro em Setembro de 1989. Divulgar o património mineiro e geológico de São Pedro da Cova, nas suas diferentes componentes históricas, é o grande objectivo do espaço criado. Um espaço pequeno para a história de São Pedro da Cova, mas que desde que foi criado tem procurado cumprir os seus propósitos, sem qualquer apoio de outras entidades. Desde 2008 uma nova dinâmica tem vindo a ser criada, com a dinamização de um conjunto muito diversificado de iniciativas culturais e pedagógicas, tendo já registado no primeiro semestre de 2014 mais de três mil visitantes. Para além de guardar um valioso fundo documental e oral, no museu encontramos vários equipamentos originais utilizados pelos operários no fundo das galerias, uma caracterização da evolução geológica, algumas réplicas (ex: maquete da galeria do antigo complexo industrial mineiro) e muitas outras referências à vida e ao trabalho. Num outro espaço sucedem-se várias exposições temporárias, expondo agora fotografias de vários pontos da freguesia que identificam esta como uma Vila Mineira, trabalhos da Associação Artística de Gondomar.

As comemorações

Desde o início do ano têm decorrido várias iniciativas que, abordando diferentes perspectivas da Casa da Malta e do Museu Mineiro, permitem a afirmação deste espaço museológico, enquadrando-o num objectivo mais lato de preservação da identidade de São Pedro da Cova. No passado dia 27 de Setembro decorreram as comemorações oficiais, nas quais um reencontro entre a Banda de Música dos Mineiros do Pejão e a Banda Musical de São Pedro da Cova trouxeram à memoria a solidariedade entre os operários das duas minas que integram a bacia carbonífera do Douro. Uma solidariedade que se verificava em vários encontros culturais e recreativos, mas também na luta por melhores condições de vida e de trabalho.

O futuro

As comemorações oficiais decorreram no momento em que se iniciaram os trabalhos de remoção dos resíduos industriais perigosos, provenientes da extinta fábrica da Maia da Siderurgia Nacional, depositados nas antigas minas de São Pedro da Cova, em 2001/2002, um crime ambiental que mereceu imediatamente a contestação e denúncia do PCP, apesar das entidades responsáveis (Ministério Ambiente, ex DRAOT e Câmara Municipal) atestarem que os mesmos eram «inertes». Confirmada a perigosidade destes resíduos em 2010, a população e a Junta de Freguesia, com a intervenção política e institucional do Partido, desenvolveram um conjunto muito diversificado de acções de luta pela sua remoção, inclusive com a participação do Secretário-geral do Partido. Iniciada a remoção, outros objectivos estão já lançados, nomeadamente a requalificação ambiental e cultural da área afectada, contígua ao antigo complexo industrial mineiro, hoje abandonado, mas que dispõe das potencialidades históricas para que ali possa ser desenvolvido um grande projecto de preservação do património mineiro e geológico de São Pedro da Cova.

A honrosa e heróica história de luta dos mineiros de São Pedro da Cova pela dignidade na vida e no trabalho, assim o justificam.

 



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