Lei da paridade e anti-comunismo

Fernanda Mateus (Membro da Comissão Política)
O Con­selho de Mi­nistro aprovou a 8 de Março uma pro­posta de al­te­ração da lei da pa­ri­dade nos ór­gãos de poder po­lí­tico, au­men­tando de 33% para 40% a quota mí­nima de par­ti­ci­pação de mu­lheres e sua apli­cação às listas para as as­sem­bleias de fre­guesia, im­pondo que, em caso de subs­ti­tuição, o man­dato seja con­fe­rido ao can­di­dato do mesmo sexo da res­pec­tiva lista, e agra­vando as san­ções aos par­tidos, de­sig­na­da­mente a re­jeição da mesma no caso de não ser cor­ri­gida.

Pre­tendem ocultar o con­tri­buto sem pa­ra­lelo que o PCP tem dado

Esta é uma ma­téria que será dis­cu­tida bre­ve­mente na As­sem­bleia da Re­pú­blica e já se re­gista a ten­ta­tiva de acan­tonar o PCP a uma po­sição con­ser­va­dora, di­tada por uma pos­tura anti-co­mu­nista por parte de quem a pro­move e as­sente numa abor­dagem su­per­fi­cial não só dos fun­da­mentos que mo­ti­varam o seu voto contra a lei da pa­ri­dade, como na ocul­tação das pro­postas al­ter­na­tivas que o PCP apre­sentou no âm­bito do de­bate então re­a­li­zado vi­sando a adopção de me­didas ade­quadas para su­perar o dé­fice de par­ti­ci­pação po­lí­tica das mu­lheres nos cen­tros de de­cisão po­lí­tica, mas igual­mente de re­forço da par­ti­ci­pação cí­vica e po­lí­tica das mu­lheres. 

A ver­dade é que o PCP não se li­mitou a votar contra a lei da pa­ri­dade por ela cons­ti­tuir uma in­ge­rência ina­cei­tável na vida in­terna dos par­tidos e uma li­mi­tação à in­ter­venção elei­toral de par­tidos le­gal­mente cons­ti­tuídos. Fê-lo também por ser uma lei que subs­ti­tuiu o ter­reno da res­pon­sa­bi­li­zação e em­penho vo­lun­tário dos par­tidos pela im­po­sição legal e au­to­ri­tária, cen­trando a pe­na­li­zação ex­clu­si­va­mente nos par­tidos e des­res­pon­sa­bi­li­zando ou­tros in­ter­ve­ni­entes neste pro­cesso, em es­pe­cial os go­vernos.

O PCP apre­sentou ca­mi­nhos al­ter­na­tivos, vi­sando o re­forço da par­ti­ci­pação cí­vica e po­lí­tica das mu­lheres1 como um com­pro­misso do go­verno as­sente num vasto con­junto de me­didas con­cretas. Entre elas des­taca-se a im­por­tância de in­cen­tivar os par­tidos a as­su­mirem as suas res­pon­sa­bi­li­dades, de forma vo­lun­tária, no as­se­gurar de um sig­ni­fi­ca­tivo re­forço da par­ti­ci­pação das mu­lheres nas listas elei­to­rais; de in­cen­tivo às or­ga­ni­za­ções so­ciais, cul­tu­rais e des­por­tivas para to­marem me­didas de modo a per­mitir uma mais rá­pida evo­lução do au­mento da par­ti­ci­pação das mu­lheres nas suas ac­ti­vi­dades e nos seus ór­gãos so­ciais, bem como às or­ga­ni­za­ções fe­mi­ninas para que es­ti­mu­lassem a ele­vação da cons­ci­ência das mu­lheres para a im­por­tância de afir­marem os seus di­reitos de par­ti­ci­pação em igual­dade na vida eco­nó­mica, so­cial, po­lí­tica e cul­tural do País. Entre estas me­didas ins­creveu-se a ne­ces­si­dade de pro­mover a con­ci­li­ação entre a vida pro­fis­si­onal, fa­mi­liar e pes­soal e o re­forço da pre­sença de mu­lheres em altos cargos go­ver­na­tivos, in­cluindo na Ad­mi­nis­tração Pú­blica, pre­en­chidos por no­me­ação, através da de­fi­nição clara de ob­jec­tivos quan­ti­ta­tivos que visem a cres­cente evo­lução da par­ti­ci­pação fe­mi­nina.

Con­tri­buto ímpar

Os que acusam o PCP de ser «con­ser­vador» e de ter «um pro­blema com as mu­lheres» pre­tendem ocultar o con­tri­buto sem pa­ra­lelo que o PCP tem dado para o apro­fun­da­mento da le­gis­lação que con­sagra os di­reitos das mu­lheres e na exi­gência de que estes di­reitos sejam exer­cidos todos os dias, e a pri­o­ri­dade que as­sume na luta por uma po­lí­tica al­ter­na­tiva que tenha como pri­o­ri­dades pre­venir e com­bater as dis­cri­mi­na­ções que atingem de forma es­pe­cí­fica as mu­lheres; eli­minar todas as formas de ex­plo­ração e vi­o­lência contra as mu­lheres e pro­mover o exer­cício pleno dos di­reitos das mu­lheres, na fa­mília, na vida po­lí­tica e so­cial.

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1 Pro­jecto de Re­so­lução n.º 148/​VIII, de 17 de Julho de 2001


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