Para que não se esqueça

Manuel Rodrigues

No pas­sado dia 8, fez 80 anos que as forças nazi-fas­cistas deram início ao cruel cerco de Le­ni­ne­grado. Se­gundo o plano de Hi­tler, a ci­dade de­veria ser er­ra­di­cada da face da terra e os que a de­fen­diam, eli­mi­nados. Fa­lhada a ten­ta­tiva de romper a de­fesa das tropas so­vié­ticas, as forças hi­tle­ri­anas de­ci­diram tomar a ci­dade pelo es­go­ta­mento.

O cerco pro­longou-se por 900 dias, entre 8 de Se­tembro de 1941 a 27 de Ja­neiro de 1944. Na ci­dade si­tiada, fi­caram 2 mi­lhões e 887 mil civis, in­cluindo cerca de 400 mil cri­anças.

As re­servas de ali­mentos e de com­bus­tível eram muito poucas. No Ou­tono de 1941, co­meçou a haver fome. Os dias mais som­brios ocorrem no início do In­verno de 1941-1942, o pri­meiro sob o cerco. O sis­tema de aque­ci­mento não fun­ci­o­nava, não havia água quente. Fal­tava com­bus­tível e os trans­portes pa­ravam.

A única forma de li­gação com a Le­ni­ne­grado si­tiada era através do Lago La­doga. A 22 de No­vembro, as forças so­vié­ticas con­se­guiram fazer cir­cular vi­a­turas au­to­mó­veis sobre o lago, numa es­trada de gelo que fi­caria co­nhe­cida como «Es­trada da Vida», de­ci­siva, aliás, para a eva­cu­ação de po­pu­lação e a en­trega de ví­veres.

Apesar do cerco, o povo de Le­ni­ne­grado con­ti­nuava a tra­ba­lhar: fun­ci­o­navam as ins­ti­tui­ções, ti­po­gra­fias, po­li­clí­nicas, te­a­tros, os ci­en­tistas pros­se­guiam o seu tra­balho. Os ado­les­centes subs­ti­tuíam nas fá­bricas os pais que ti­nham ido para a frente.

Apesar das duras con­di­ções de vida na ci­dade si­tiada, desde o início da guerra até ao fim do cerco, o povo de Le­ni­ne­grado pro­duziu e re­parou 2000 tan­ques, 1500 aviões, mi­lhares de ca­nhões ter­res­tres e na­vais, 12 mil mor­teiros, 225 mil me­tra­lha­doras, cerca de 10 mi­lhões de pro­jéc­teis e minas, acabou es­ta­leiros e cons­truiu 407 na­vios. Du­rante o cerco, fi­caram ino­pe­ra­ci­o­nais 840 edi­fí­cios de em­presas in­dus­triais. Foram da­ni­fi­cados cerca de 5 mi­lhões de m2 de su­per­fície ha­bi­ta­ci­onal, 500 es­colas, 170 ins­ti­tui­ções de saúde.

Em 18 de Ja­neiro de 1943, o cerco foi rom­pido e de­fi­ni­ti­va­mente le­van­tado em 27 de Ja­neiro de 1944. Du­rante o cerco, mor­reram mais de 641 mil pes­soas de fome e cerca de 17 mil de­vido aos bom­bar­de­a­mentos e ata­ques de ar­ti­lharia. Cerca de 34 mil foram fe­ridas.

Mas a re­sis­tência do povo seria de­ci­siva para a vi­tória.

A gesta he­roica do povo so­vié­tico em Le­ni­ne­grado fi­cará na his­tória como um dos mais me­mo­rá­veis exem­plos de ab­ne­gada luta pela li­ber­dade e de hu­ma­nismo.

Porque será que a co­mu­ni­cação so­cial do­mi­nante, sempre pronta a avivar efe­mé­rides e me­mó­rias, re­meteu para o si­lêncio este acon­te­ci­mento tão mar­cante para a der­rota das hordas nazi-fas­cistas que se pre­pa­ravam para do­minar o mundo?...




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