Sucessivos equívocos e mais uns
Não se resolve um problema insistindo na opção que o criou
Lusa
Dizia-se no último Argumentos sobre Defesa Nacional publicado nas paginas do Avante! que as «Forças Armadas têm vivido, nos últimos dois meses, um ambiente muito toldado por sucessivos casos, incidentes, infantis justificações e valorizações que soam a falso, porque inconsistentes ao nível das medidas de resposta aos problemas concretos. A imagem vendida para consumo dos portugueses está longe daquele que é o ambiente vivido na Instituição. Dirão alguns , para fazer prevalecer a sua opinião, que “as coisas funcionam”. Mas “as coisas funcionarem” não é sinónimo de ausência de mal-estar, de sentimentos de agastamento e desconsideração. Outros procuram “tapar o sol com a peneira”, salientando a consideração expressa aos militares portugueses nas missões externas, na vacinação, nos incêndios, etc., não percebendo, ou fingindo não perceber, que esses justos encómios só tornam mais exposta a contradição vivida pelos militares e que só uma ínfima parte troca dignidade por louvores e medalhas, até porque só uma ainda mais ínfima parte a isso acede».
Nem de propósito, rebentam mais três casos – República Centro Afrinana (RCA), OTA e processo envolvendo o director da PJM – e também um conjunto de considerações sobre as Forças Armadas, oriundas do Presidente da República, no seguimento do caso da RCA.
Fica bem dizer, até porque é correcto, que este caso, de uma rede criminosa, a exemplo de outros, terá responsáveis concretos e não se pode tomar a parte pelo todo. Igualmente exigir-se-á, até porque tal é absolutamente necessário, que se identifiquem todos os responsáveis, se apure as metodologias e se puna de forma clara. Mas exige-se mais dos responsáveis militares e dos responsáveis políticos. Desde logo uma análise às razões pelas quais, embora em matérias de natureza distinta, os Comandos estão sempre no centro do problema.
Exige-se igualmente uma reflexão sobre quais os padrões, que grelha, estão a ser usados no recrutamento e selecção; que necessidades se colocam à formação, para além dos aspectos físicos e de combate, porque ser militar é mais do que isso. Aquilo que se está a colocar é que tudo deve ficar claro, fugindo à tendência de justificações fáceis. Como se sabe, na espuma das noticias instalou-se muito ruído, algum dele desafinado, e azáfama de alguns em surfar a onda. Parece que do caso Tancos não houve lições aprendidas, sendo que há especialistas que acham que as lições não se lhes aplicam.
Simultaneamente, o PR expressou-se sobre as Forças Armadas e a sociedade, considerando que, entre outros aspectos, «permanecem insuficiências infraestruturais e são prementes problemas de efetivos, de estatuto, de regime de saúde e de integração social, além dos atinentes aos antigos combatentes e aos deficientes das Forças Armadas». Estas palavras, a exemplo de outras anteriores, padecem de um problema, a saber: na prática, a teoria é outra.
O caso mais recente envolvendo o Almirante Mendes Calado aí está para o exemplificar, incluindo a aceitação por parte deste de um acordo de cavalheiros para não cumprir o seu mandato até ao fim, tendo em vista a ida para o cargo de um Oficial-general concreto, tudo à margem de outros oficiais-generais possíveis de também poderem ascender ao cargo.
É certo que ocupa o lugar quem o Governo e o PR entenderem e não é isso que se questiona. O que se questiona é a lisura, o atropelo da metodologia que a assegura, de modo a garantir a dignidade de todos os envolvidos. Parafraseando Albert Einstein, «nenhum problema pode ser resolvido pelas mesmas opções políticas e métodos que o criaram». E é isto que tem determinado o curso dos acontecimentos e tem conduzido «as coisas» ao estado em que se encontram.