O interesse
Há ideias que, de tantas vezes repetidas, passam a ser assumidas como verdades. É o caso da que garante que os jovens não se interessam pela política e estão cada vez mais alheados da democracia. A avaliação do fenómeno suscita a sucessão de estudos académicos, debates televisivos, conferências universitárias, grupos de trabalho governamentais, campanhas publicitárias, parlamentos jovens…
Evitemos, no entanto, conclusões precipitadas, pois nem as «verdades» são sempre as que nos vendem nem a democracia se esgota, como pretendem alguns, no mero acto de votar. Pelo contrário, ela aprende-se – e concretiza-se – no confronto de ideias, na cooperação e intervenção por objectivos comuns. Numa palavra, na participação.
Foi o que fizeram, no sábado, em Setúbal, centenas de estudantes dos ensinos Secundário e Superior de todo o País, em dois grandes encontros da Juventude Comunista Portuguesa (JCP): trocaram opiniões e testemunhos, debateram problemas e insuficiências, construíram juntos análises e soluções.
Esta rica experiência democrática, porém, contrasta com um quotidiano marcado por inúmeros obstáculos à sua participação política e associativa – diariamente combatidos e ali denunciados. Em muitas escolas, politécnicos e faculdades, não há eleições para a Associação de Estudantes porque a direcção não deixa e há listas impedidas de se candidatar porque aquilo que defendem ou alguns dos elementos que as compõem não são do seu agrado. Reuniões Gerais de Alunos são proibidas e quem nelas participa castigado. Dirigentes associativos são ameaçados por darem voz às aspirações estudantis e arrancados cartazes que as exprimam. Não poucas vezes a polícia é chamada para impedir a afirmação da JCP junto dos jovens ou para desmobilizar os que se atrevem a protestar contra as más condições das escolas ou a falta de professores, funcionários e psicólogos.
Mas que não haja a tentação de responsabilizar apenas directores e reitores por tais ilegalidades, pois elas brotam de um quadro jurídico crescentemente antidemocrático, erguido por PS, PSD e CDS: o Estatuto do Aluno impôs às escolas básicas e secundárias um cariz cada vez mais autoritário e securitário e o Regime Jurídico das Instituições do Ensino Superior diminuiu drasticamente a representação dos estudantes nos órgãos de gestão, em detrimento de entidades «externas», nomeadamente grupos económicos: se antes a representação estudantil rondava os 30%, hoje fica-se pela metade, ou até menos.
Estarão realmente os jovens alheados da democracia e desinteressados da política? Não será antes a política de direita que está desinteressada dos jovens e do potencial transformador da sua participação? A resposta, de tão evidente, dispensa estudos.