Regras e armas

Manuel Rodrigues

Quase todas as se­manas somos con­fron­tados com ima­gens de vi­o­lência brutal que nos chegam dos EUA e que, numa grande parte das vezes, en­volvem o uso de armas por cri­anças e ado­les­centes, no­me­a­da­mente em con­texto es­colar.

A si­tu­ação é tal que, só nos pri­meiros quatro meses deste ano, de acordo com in­for­ma­ções que re­cen­te­mente vi­eram a pú­blico, já vai em mais de 200 o nú­mero de in­ci­dentes com ti­ro­teios em massa nos EUA, o que levou, in­clu­si­va­mente, di­versos es­tados (Nova Ze­lândia, Aus­trália, Ca­nadá, Reino Unido, França, Ve­ne­zuela e Uru­guai) a emitir alertas para os seus ci­da­dãos que vi­ajam para aquele país. Por aquilo que se co­nhece a partir das pes­quisas re­a­li­zadas, nos úl­timos três anos, re­gis­taram-se, em média, na­quele país, 600 casos anuais de ti­ro­teios em massa. O que também não ad­mira, já que os EUA são o único país no mundo onde o nú­mero de armas é su­pe­rior à po­pu­lação (330 mi­lhões de ha­bi­tantes).

Esta é, aliás, a maior causa de morte na in­fância, neste país, ul­tra­pas­sando as do­enças, a des­nu­trição in­fantil, os aci­dentes do­més­ticos, os aci­dentes au­to­mo­bi­lís­ticos. Um em cada cinco ame­ri­canos adultos tem um membro da fa­mília que foi morto por uma arma de fogo.

Pe­rante tal ce­nário, per­cebe-se me­lhor porque querem os EUA – o ver­da­deiro cam­peão dos «di­reitos hu­manos» em todo o uni­verso, como in­sistem em fazer saber, a bem ou a mal – impor aos ou­tros países a sua con­cepção de «ordem mun­dial ba­seada em re­gras». Re­gras para matar, ob­vi­a­mente, num mundo com armas, muitas armas. Tantas e tais armas que ga­rantam que as mul­ti­na­ci­o­nais (no­me­a­da­mente do ar­ma­mento) possam con­ti­nuar a ar­re­cadar os lu­cros fa­bu­losos que fazem da in­dús­tria mi­litar um dos sec­tores que mais lu­cros obtém. E para que a ex­plo­ração possa li­vre­mente pros­se­guir o seu ca­minho. Sempre em nome dos «di­reitos hu­manos». Com re­gras, é claro. Com muitas re­gras e mais armas.

 



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